Em dois dias, três crimes cometidos por PM’s vêm à tona; práticas mostram que torturas não desapareceram com a ditadura militar
No dia 1° de agosto, milhões de brasileiros assistiram, pela televisão, o emocionante depoimento de Daniel Eustáquio de Oliveira que, com o rosto do filho gravado na própria carne, contou uma história que mistura dor e persistência, além de servir como exemplo do completo absurdo que impera nas forças de segurança deste país.
A dor de Daniel e seus parentes começou há cerca de um mês, no dia 1° de julho, quando seu filho Cesar Dias de Oliveira foi morto, juntamente com seu melhor amigo, Riçado Tavares, num episódio que a polícia registrou como “resistência seguida de morte”. A persistência foi demonstrada pelo incansável trabalho de investigação feito pelo pai do garoto, que coletou provas e testemunhas que certificam que os garotos foram brutalmente executados pelos polícias, que também forjaram a cena do crime que cometeram.
A história veio à tona no mesmo momento em que dois outros casos, lamentavelmente, demonstram o quão comum são os crime cometidos por policiais. No Rio, no dia 31, um cineasta amador revelou ao mundo outra covardia: um policial dando um tiro no pé de um garoto, negro, de 17 anos, que já havia se rendido e estava desarmado. No dia anterior, em São Paulo, um sargento e quatro soldados foram presos por simular troca de tiros e executar dois outros jovens, também com 20 anos.
Estas histórias, que poderiam dar a equivocada impressão de que, finalmente, a justiça está sendo feita neste país (como, inclusive, parte da mídia está insinuando), na verdade são exceções à regra que garante a impunidade aos criminosos fardados. São exemplos raros de uma realidade muito diferente: cada vez mais jovens da periferia, particularmente negros, têm sido vítimas da violência policial. E quase nunca os responsáveis são sequer investigados.
O fato de que os casos aqui relatados tenham sido revelados é, inclusive, uma decorrência do absurdo aumento deste tipo de crime. Algo que tem acontecido em uma escala tão assustadora que, no dia 26 de julho, o procurador da República Matheus Baraldi foi obrigado a afirmar que a Polícia Militar do Estado de São Paulo “não está sob controle, eles foram ensinados a praticar violência em patamares excessivos.”
Excessos típicos de “forças de segurança” (polícias militar e civil, mas também as guardas municipais) que, na prática, têm transformado jovens pobres da periferia (e, eventualmente, também os de classe média, como foi o caso de um publicitário em São Paulo) em “caça”. Por isso mesmo, a população merece conhecer histórias que, ao contrário do que se vê todos os dias, mostram que, nem sempre os “caçadores” se dão bem. Que vez ou outra, aqueles que são tratados como “caça” também podem comemorar, vendo seus algozes enjaulados.
Um “herói” solitário contra um Estado criminoso
Durante um mês, Daniel Oliveira transformou-se em investigador particular, obcecado por “limpar a memória” e fazer justiça pelo assassinato dos dois garotos, ambos com 20 anos, empregados e sem nenhuma passagem pela polícia.
Ao relatar sua história e mostrar para o país o braço com a tatuagem do rosto do filho, sobre a frase “meu herói”, Daniel transformou-se imediatamente um verdadeiro símbolo para milhares de outros pais, mães, irmãos, filhos e amigos de tantos outros jovens que tiveram suas vidas interrompidas da mesma forma dos garotos que foram chacinados no Rio Pequeno, na Zona Oeste de São Paulo.
Por exemplo, mulheres como as “Mães de Maio”, que lutam por justiça para os 493 mortos em ações policias, em 2006, durante uma represália a ações do Primeiro Comando da Capital (PCC), certamente viram na história de Daniel não só a comprovação dos crimes policiais que elas tanto têm denunciado, como também, certamente, tiveram revigoradas as esperanças de que um dia a justiça seja feita.
Lamentavelmente, contudo, a história do pai de César é também um exemplo de que, se depender da elite dominante que está no poder ou do comando da polícia dirigida por Geraldo Alckmin, a justiça nunca virá. Afinal, foi apenas através de uma persistente investigação conduzida pelo próprio Daniel que foi possível reunir as provas que a polícia se recusou a recolher.
Uma recusa descarada, já que Daniel apurou que, desde o começou foi o comando da PM que orientou a equipe de assassinos – o sargento Marcelo Oliveira de Jesus e os soldados Denis da Costa Martinez, Raphael de Arruda Bom, Gringer Ferreira Prota e Rafael Salviano, todos do 14° Batalhão (Osasco) – a montar a farsa.
Segundo uma das testemunhas que presenciou a execução e foi descoberta por Daniel, logo depois dos disparos, o comandante da equipe disse: “Vocês fizeram uma cagada e têm de consertar”. O que começou a ser feito imediatamente: ao ouvir o comando, um policial começou a atirar para o alto e a dizer, pelo rádio, que estava em um tiroteio com dois homens em fuga em uma moto.
Esta e outras quatro testemunhas ainda deram detalhes sobre a execução. Os policias desceram atirando de um carro particular; depois receberam “reforço” de outros policias que também chegaram em um carro sem identificação, e, 30 minutos depois, com a chegada de uma viatura, combinaram “arrendodar” o boletim de ocorrência.
Para montar a farsa, os policiais retardaram o comunicado da ocorrência em sete horas (os jovens foram executados às 2:30h, a ocorrência só foi feita às 9:23h). Ainda segundo as testemunhas, no local em que a motocicleta em que os jovens estavam foi emboscada, cada um deles levou um único tiro. Contudo, César deu entrada no hospital, já morto, cravejado com cinco balas e Ricardo, que morreu na manhã seguinte, tinha levado três tiros.
Como se tudo isto não bastasse, os policiais sequer deveriam estar na região do Rio Pequeno, onde mataram os rapazes, já que pertencem ao batalhão de uma cidade vizinha, Osasco.
Como nos tempos da ditadura: tortura e “desaparecidos”
Na segunda-feira, 30 de julho, a imprensa abriu espaço para o cabo carioca Maurício Fabiano Braga Pessoa que, sorridente, narrou para as câmeras como havia perseguido e prendido um suspeito de cometer sequestro relâmpago, na Barra da Tijuca, depois de imobilizá-lo com um tiro, quando ele reagiu à prisão.
No dia seguinte, a farsa veio à tona nas imagens gravadas em um vídeo amador, que mostrava o cabo disparando contra o pé do garoto já rendido, enquanto outro policial o “ameaçava”, disparando quatro tiros contra a parede. Diante de evidências tão contundentes do que só pode ser chamado de tortura física e psicológica, o comando do batalhão e a Secretaria de Segurança de Sérgio Cabral vieram a público com a ladainha de sempre: o que foi visto não condiz com a corporação e que fatos desta natureza devem ser punidos com os rigores da lei.
No mesmo dia em que o cabo se vangloriava de sua “missão bem cumprida” outros cinco membros da Polícia Militar, desta vez da cidade de Guarulhos, em São Paulo, também tiveram seus crimes revelados por “câmeras indiscretas”. Em mais um caso escabroso, as imagens gravadas por uma câmera de vigilância mostraram o carro dos policiais estacionados no mesmo local, dia e hora nos quais Caique Lima, de 18 anos, e Matias do Nascimento, de 19, foram vistos pela última vez, no dia 12 de julho.
Os jovens ainda são tidos como “desaparecidos”, mas, desde o primeiro momento, duas testemunhas afirmavam ter visto os dois sendo abordados por policiais do 31° Batalhão e jogados dentro de um camburão.
Contudo, somente de uma série de manifestações e protestos por parte de familiares, amigos e moradores da cidade (um deles brutalmente reprimidos, depois que uma queima de pneus paralisou o trânsito da cidade), o comando da polícia decidiu levar a investigação adiante, recolher as imagens e, consequentemente, se ver obrigado a deter os criminosos. Ainda assim, a PM teve a pachorra de emitir uma nota declarando que “há indícios da participação dos policiais no desaparecimento, porém eles não são conclusivos”.
Se a PM tem “dúvidas”, os parentes das vítimas só têm uma dolorosa certeza: “Vivos eles não estão mais, então a única coisa que a gente quer é que apareçam os corpos dos meninos”, declarou Adriana Félix, tia de Matias.
A reivindicação dos corpos de jovens “desaparecidos”, laudos fraudulentos e torturas das mais diversas, lamentavelmente, são bastante conhecidos por parte dos brasileiros. Fazem parte da história da ditadura. Da mesma ditadura que moldou os métodos e a própria estrutura da Polícia Militar, o que, inquestionavelmente, está por trás da violência criminosa desta instituição.
Chega de “mortes seguidas de fraudes”
Apenas para citar um dado exemplar desta violência, vale lembrar que entre 2005 e 2011, nada menos do que 3.921 pessoas foram mortas por PMs no Estado de São Paulo. Exatos 3.074 foram mortos em episódios registrados como “resistência seguida de morte”, uma forma absurda de denominar as execuções sistemáticas realizadas pelo pelotão.
Parte significativa destes assassinatos foi feita pela “tropa de elite” da PM paulista, as famigeradas Rondas Ostensivas Tobias Aguiar, a ROTA (diga-se de passagem, o maior orgulho do nefasto Paulo Maluf, atual “companheiro” do PT e seu candidato em São Paulo Fernando Haddad) que, somente no ano passado, fuzilou 91 pessoas, 82 duas delas em situações de “resistência”.
São números como este que fizeram com que, em um recente artigo publicado na Folha de S. Paulo, o professor de Sociologia da USP Ruy Braga e Ana Luiza Figueiredo (diretora da Federação Nacional do Judiciário Federal e Ministério Público da União e candidata à prefeitura de S. Paulo, pelo PSTU) tenham defendido que, para por um fim a esta situação, uma primeira e necessária medida é desmantelamento da polícia como um aparato militar: “a desmilitarização da polícia é uma exigência democrática sem a qual, 25 anos depois, a sociedade brasileira ainda não terá superado a ditadura”.
Este seria o primeiro passo necessário para que histórias escabrosas como as acima não se repitam. Algo que jamais poderá acontecer com “reformas” ou maquiagens no atual aparato militar. É necessário o fim das polícias atuais e sua substituição por uma nova polícia.
Uma polícia que tenha a honestidade e determinação do Seu Daniel, ou seja, cuja lógica não seja a repressão, mas sim a defesa da verdadeira justiça e da vida da maioria da população. Uma polícia na qual haja democracia, para que os soldados possam se organizar sindicalmente, eleger seus superiores e destituí-los sempre que se desviam de suas funções.
Uma polícia que também seja controlada pela comunidade, através da eleição dos delegados, promotores e juízes. Somente com medidas como estas, além da garantia de salários dignos, condições de trabalho (as únicas armas que podem estancar a corrupção generalizada que corre pelas fileiras da corporação) é que, um dia, poderemos ter policiais que não tratem pobres, negros e jovens como inimigos e presas a serem abatidas como animais pelas ruas da periferia.
Paralelo a isso, o exemplo do Seu Daniel também nos deixa uma lição. A população também tem condições de gerenciar sua própria segurança. É uma demonstração de que é possível incorporar as comunidades no combate à violência, através de grupos comunitários encarregados de controlar e trabalhar com policiais nos bairros, formados pela classe trabalhadora e voluntários para combater a violência e a criminalidade.
Retirado do Site do PSTU
Reprodução | ||
Daniel Eustáquio investigou a morte do próprio filho |
A dor de Daniel e seus parentes começou há cerca de um mês, no dia 1° de julho, quando seu filho Cesar Dias de Oliveira foi morto, juntamente com seu melhor amigo, Riçado Tavares, num episódio que a polícia registrou como “resistência seguida de morte”. A persistência foi demonstrada pelo incansável trabalho de investigação feito pelo pai do garoto, que coletou provas e testemunhas que certificam que os garotos foram brutalmente executados pelos polícias, que também forjaram a cena do crime que cometeram.
A história veio à tona no mesmo momento em que dois outros casos, lamentavelmente, demonstram o quão comum são os crime cometidos por policiais. No Rio, no dia 31, um cineasta amador revelou ao mundo outra covardia: um policial dando um tiro no pé de um garoto, negro, de 17 anos, que já havia se rendido e estava desarmado. No dia anterior, em São Paulo, um sargento e quatro soldados foram presos por simular troca de tiros e executar dois outros jovens, também com 20 anos.
Estas histórias, que poderiam dar a equivocada impressão de que, finalmente, a justiça está sendo feita neste país (como, inclusive, parte da mídia está insinuando), na verdade são exceções à regra que garante a impunidade aos criminosos fardados. São exemplos raros de uma realidade muito diferente: cada vez mais jovens da periferia, particularmente negros, têm sido vítimas da violência policial. E quase nunca os responsáveis são sequer investigados.
O fato de que os casos aqui relatados tenham sido revelados é, inclusive, uma decorrência do absurdo aumento deste tipo de crime. Algo que tem acontecido em uma escala tão assustadora que, no dia 26 de julho, o procurador da República Matheus Baraldi foi obrigado a afirmar que a Polícia Militar do Estado de São Paulo “não está sob controle, eles foram ensinados a praticar violência em patamares excessivos.”
Excessos típicos de “forças de segurança” (polícias militar e civil, mas também as guardas municipais) que, na prática, têm transformado jovens pobres da periferia (e, eventualmente, também os de classe média, como foi o caso de um publicitário em São Paulo) em “caça”. Por isso mesmo, a população merece conhecer histórias que, ao contrário do que se vê todos os dias, mostram que, nem sempre os “caçadores” se dão bem. Que vez ou outra, aqueles que são tratados como “caça” também podem comemorar, vendo seus algozes enjaulados.
Um “herói” solitário contra um Estado criminoso
Durante um mês, Daniel Oliveira transformou-se em investigador particular, obcecado por “limpar a memória” e fazer justiça pelo assassinato dos dois garotos, ambos com 20 anos, empregados e sem nenhuma passagem pela polícia.
Ao relatar sua história e mostrar para o país o braço com a tatuagem do rosto do filho, sobre a frase “meu herói”, Daniel transformou-se imediatamente um verdadeiro símbolo para milhares de outros pais, mães, irmãos, filhos e amigos de tantos outros jovens que tiveram suas vidas interrompidas da mesma forma dos garotos que foram chacinados no Rio Pequeno, na Zona Oeste de São Paulo.
Por exemplo, mulheres como as “Mães de Maio”, que lutam por justiça para os 493 mortos em ações policias, em 2006, durante uma represália a ações do Primeiro Comando da Capital (PCC), certamente viram na história de Daniel não só a comprovação dos crimes policiais que elas tanto têm denunciado, como também, certamente, tiveram revigoradas as esperanças de que um dia a justiça seja feita.
Lamentavelmente, contudo, a história do pai de César é também um exemplo de que, se depender da elite dominante que está no poder ou do comando da polícia dirigida por Geraldo Alckmin, a justiça nunca virá. Afinal, foi apenas através de uma persistente investigação conduzida pelo próprio Daniel que foi possível reunir as provas que a polícia se recusou a recolher.
Uma recusa descarada, já que Daniel apurou que, desde o começou foi o comando da PM que orientou a equipe de assassinos – o sargento Marcelo Oliveira de Jesus e os soldados Denis da Costa Martinez, Raphael de Arruda Bom, Gringer Ferreira Prota e Rafael Salviano, todos do 14° Batalhão (Osasco) – a montar a farsa.
Segundo uma das testemunhas que presenciou a execução e foi descoberta por Daniel, logo depois dos disparos, o comandante da equipe disse: “Vocês fizeram uma cagada e têm de consertar”. O que começou a ser feito imediatamente: ao ouvir o comando, um policial começou a atirar para o alto e a dizer, pelo rádio, que estava em um tiroteio com dois homens em fuga em uma moto.
Esta e outras quatro testemunhas ainda deram detalhes sobre a execução. Os policias desceram atirando de um carro particular; depois receberam “reforço” de outros policias que também chegaram em um carro sem identificação, e, 30 minutos depois, com a chegada de uma viatura, combinaram “arrendodar” o boletim de ocorrência.
Para montar a farsa, os policiais retardaram o comunicado da ocorrência em sete horas (os jovens foram executados às 2:30h, a ocorrência só foi feita às 9:23h). Ainda segundo as testemunhas, no local em que a motocicleta em que os jovens estavam foi emboscada, cada um deles levou um único tiro. Contudo, César deu entrada no hospital, já morto, cravejado com cinco balas e Ricardo, que morreu na manhã seguinte, tinha levado três tiros.
Como se tudo isto não bastasse, os policiais sequer deveriam estar na região do Rio Pequeno, onde mataram os rapazes, já que pertencem ao batalhão de uma cidade vizinha, Osasco.
Como nos tempos da ditadura: tortura e “desaparecidos”
Na segunda-feira, 30 de julho, a imprensa abriu espaço para o cabo carioca Maurício Fabiano Braga Pessoa que, sorridente, narrou para as câmeras como havia perseguido e prendido um suspeito de cometer sequestro relâmpago, na Barra da Tijuca, depois de imobilizá-lo com um tiro, quando ele reagiu à prisão.
No dia seguinte, a farsa veio à tona nas imagens gravadas em um vídeo amador, que mostrava o cabo disparando contra o pé do garoto já rendido, enquanto outro policial o “ameaçava”, disparando quatro tiros contra a parede. Diante de evidências tão contundentes do que só pode ser chamado de tortura física e psicológica, o comando do batalhão e a Secretaria de Segurança de Sérgio Cabral vieram a público com a ladainha de sempre: o que foi visto não condiz com a corporação e que fatos desta natureza devem ser punidos com os rigores da lei.
No mesmo dia em que o cabo se vangloriava de sua “missão bem cumprida” outros cinco membros da Polícia Militar, desta vez da cidade de Guarulhos, em São Paulo, também tiveram seus crimes revelados por “câmeras indiscretas”. Em mais um caso escabroso, as imagens gravadas por uma câmera de vigilância mostraram o carro dos policiais estacionados no mesmo local, dia e hora nos quais Caique Lima, de 18 anos, e Matias do Nascimento, de 19, foram vistos pela última vez, no dia 12 de julho.
Os jovens ainda são tidos como “desaparecidos”, mas, desde o primeiro momento, duas testemunhas afirmavam ter visto os dois sendo abordados por policiais do 31° Batalhão e jogados dentro de um camburão.
Contudo, somente de uma série de manifestações e protestos por parte de familiares, amigos e moradores da cidade (um deles brutalmente reprimidos, depois que uma queima de pneus paralisou o trânsito da cidade), o comando da polícia decidiu levar a investigação adiante, recolher as imagens e, consequentemente, se ver obrigado a deter os criminosos. Ainda assim, a PM teve a pachorra de emitir uma nota declarando que “há indícios da participação dos policiais no desaparecimento, porém eles não são conclusivos”.
Se a PM tem “dúvidas”, os parentes das vítimas só têm uma dolorosa certeza: “Vivos eles não estão mais, então a única coisa que a gente quer é que apareçam os corpos dos meninos”, declarou Adriana Félix, tia de Matias.
A reivindicação dos corpos de jovens “desaparecidos”, laudos fraudulentos e torturas das mais diversas, lamentavelmente, são bastante conhecidos por parte dos brasileiros. Fazem parte da história da ditadura. Da mesma ditadura que moldou os métodos e a própria estrutura da Polícia Militar, o que, inquestionavelmente, está por trás da violência criminosa desta instituição.
Chega de “mortes seguidas de fraudes”
Apenas para citar um dado exemplar desta violência, vale lembrar que entre 2005 e 2011, nada menos do que 3.921 pessoas foram mortas por PMs no Estado de São Paulo. Exatos 3.074 foram mortos em episódios registrados como “resistência seguida de morte”, uma forma absurda de denominar as execuções sistemáticas realizadas pelo pelotão.
Parte significativa destes assassinatos foi feita pela “tropa de elite” da PM paulista, as famigeradas Rondas Ostensivas Tobias Aguiar, a ROTA (diga-se de passagem, o maior orgulho do nefasto Paulo Maluf, atual “companheiro” do PT e seu candidato em São Paulo Fernando Haddad) que, somente no ano passado, fuzilou 91 pessoas, 82 duas delas em situações de “resistência”.
São números como este que fizeram com que, em um recente artigo publicado na Folha de S. Paulo, o professor de Sociologia da USP Ruy Braga e Ana Luiza Figueiredo (diretora da Federação Nacional do Judiciário Federal e Ministério Público da União e candidata à prefeitura de S. Paulo, pelo PSTU) tenham defendido que, para por um fim a esta situação, uma primeira e necessária medida é desmantelamento da polícia como um aparato militar: “a desmilitarização da polícia é uma exigência democrática sem a qual, 25 anos depois, a sociedade brasileira ainda não terá superado a ditadura”.
Este seria o primeiro passo necessário para que histórias escabrosas como as acima não se repitam. Algo que jamais poderá acontecer com “reformas” ou maquiagens no atual aparato militar. É necessário o fim das polícias atuais e sua substituição por uma nova polícia.
Uma polícia que tenha a honestidade e determinação do Seu Daniel, ou seja, cuja lógica não seja a repressão, mas sim a defesa da verdadeira justiça e da vida da maioria da população. Uma polícia na qual haja democracia, para que os soldados possam se organizar sindicalmente, eleger seus superiores e destituí-los sempre que se desviam de suas funções.
Uma polícia que também seja controlada pela comunidade, através da eleição dos delegados, promotores e juízes. Somente com medidas como estas, além da garantia de salários dignos, condições de trabalho (as únicas armas que podem estancar a corrupção generalizada que corre pelas fileiras da corporação) é que, um dia, poderemos ter policiais que não tratem pobres, negros e jovens como inimigos e presas a serem abatidas como animais pelas ruas da periferia.
Paralelo a isso, o exemplo do Seu Daniel também nos deixa uma lição. A população também tem condições de gerenciar sua própria segurança. É uma demonstração de que é possível incorporar as comunidades no combate à violência, através de grupos comunitários encarregados de controlar e trabalhar com policiais nos bairros, formados pela classe trabalhadora e voluntários para combater a violência e a criminalidade.
Retirado do Site do PSTU
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