sábado, 20 de agosto de 2011

Debate lança em Natal Campanha pelos 10% do PIB para Educação


Na tarde desta quinta-feira, dia 18, foi lançada em Natal a Campanha pelos 10% do PIB Já para a Educação Pública. O evento deu início à Jornada Nacional de Lutas no Rio Grande do Norte e foi marcado por um debate que lotou o auditório do NEPSA, no Setor 1 da UFRN. A mesa de abertura da atividade contou com a presença do ANDES (Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior), da ANEL (Assembleia Nacional dos Estudantes Livre) e da CSP-Conlutas (Central Sindical e Popular). Representante das lutas pela educação pública, a professora Amanda Gurgel abriu o lançamento da campanha, defendendo a aplicação imediata dos 10% do PIB (Produto Interno Bruto) no ensino público e rejeitando o novo PNE (Plano Nacional da Educação) proposto pelo governo Dilma, já que o projeto não atenderia as necessidades da educação.

Amanda Gurgel responsabilizou os baixos investimentos dos governos pela precariedade da educação. “É interessante para o governo federal economizar com as áreas sociais para atender ao pagamento dos juros da dívida pública aos bancos, que no ano passado levaram 49% do orçamento do país, enquanto a educação recebeu apenas 2,89% em investimentos.”, disse a professora.

O novo Plano Nacional da Educação (PNE) do governo Dilma também foi alvo das críticas da professora Amanda Gurgel. “A maioria das estratégias desse novo PNE está voltada para a privatização da educação, para a transferência de recursos públicos ao setor privado. Além disso, o PNE prevê um investimento de 7% apenas para 2020 e a educação não pode esperar o tempo de uma geração inteira.”, destacou.

Amanda finalizou apontando uma solução para iniciar as mudanças necessárias na educação pública. “O caos da educação, os baixos salários, a precariedade das escolas, nada disso será resolvido com boa vontade dos profissionais. A única solução é aumentar significativamente os investimentos. Por isso, para iniciar mudanças imediatas, é preciso investir 10% do PIB já na educação pública.”, concluiu a professora.

O professor Almir Menezes, do ANDES, rebateu o argumento do governo federal de que não há recursos suficientes para investir 10% do PIB na educação. “O objetivo do governo é investir 7% em 2020. O ministro da educação diz que não há recursos. Mas o orçamento da União deste ano prevê R$ 950 bilhões para pagamento dos juros e amortizações da dívida pública. Então como não tem recursos?”, disse Almir.

A estudante de Engenharia Química da UFRN e militante da ANEL, Emy Magalhães, defendeu a expansão com qualidade do ensino superior e criticou as ações do governo no setor. “A ANEL é, sim, a favor da expansão das universidades. Mas essa expansão precisa ser com qualidade, com mais investimentos. Como é possível ter expansão com qualidade se a presidente Dilma iniciou o ano cortando R$ 3 bilhões da educação? É por isso que a ANEL está na campanha pelos 10% do PIB já para o ensino público.”, defendeu Emy.

A professora universitária Regina Ávila reforçou a necessidade de o movimento ser abraçado por todos para que a luta possa avançar. “Essa luta é uma luta que merece não só o nosso apoio, mas também merece que a gente agarre essa bandeira com as duas mãos. Precisamos assumir a responsabilidade de levarmos à frente essa luta em defesa da educação pública.”, convocou a professora.

Ao final do lançamento, foi formado um comitê em defesa dos 10% do PIB para a Educação Pública. O comitê terá a tarefa de preparar as atividades do movimento para este semestre, entre elas o plebiscito sobre o investimento de 10% do Produto Interno Bruto na educação.


Jornada Nacional de Lutas

Entre os dias 17 e 26 de agosto, ocorre a Jornada Nacional de Lutas do movimento sindical, popular e estudantil. A atividade está sendo convocada por diversas entidades, entre elas a CSP-Conlutas e a ANEL. Várias categorias de trabalhadores já estão organizando suas campanhas salariais, o movimento sem terra segue lutando pelo assentamento de famílias e contra a violência e o fechamento das escolas no campo, além da realização de ocupações de trabalhadores sem-teto que fortalecem a luta por moradia. Durante a jornada de luta, ocorrerão protestos em muitos estados do Brasil, entre eles o Rio Grande do Norte, no dia 19, na Av. Rio Branco, em Natal. No dia 24, uma grande Marcha será realizada em Brasília para defender os 10% do PIB para Educação.


Retirado do blog do PSTU/RN

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Todo a apoio à greve dos operários das obras do Maracanã

Arrancar agora todas as reivindicações, nem um passo atrás!


Saibam que a luta de vocês é motivo de orgulho para todos os operários da construção civil de nosso país e que todos nós acreditamos que a força dessa mobilização, a resistência e a persistência de vocês será capaz de arrancar melhores condições de salário, de saúde e de segurança.

Assim como vocês, que ontem viram um de nossos companheiros ser vítima de um grave acidente de trabalho, nós estamos indignados com a forma como as empreiteiras vem tratando os trabalhadores nas milhares de obras espalhadas pelo nosso país. Para essas construtoras, o que interessa é acelerar a entrega das obras para garantir seus lucros e atender as pressões dos governantes. Se, para conseguir isso, pelo descaso, centenas de operários perderem a vida, eles não estão nem aí. Eles querem seus lucros.

Queremos transmitir nosso irrestrito apoio à greve que vocês agora realizam, pois entendemos que somente assim é que nós conseguiremos arrancar todas as reivindicações, derrotar a ganância das empreiteiras e, nesse caso, a inércia e conivência do governo federal e estadual.

O governo fala de crescimento econômico, que o país melhorou, que somos a 8ª economia do mundo, que teremos Copa do Mundo, Olimpíadas, que estamos preparados para enfrentar crises, enfim, que o país cresceu e a vida melhorou. Mas está está cada vez evidente, porém, que esse crescimento está sendo garantido às custas de uma brutal exploração, de baixos salários e até da própria vida de quem trabalha. Dessa forma, não podemos mais permitir que esta situação continue.

A greve dos operários da obra do Maracanã é, para nós da CSP-Conlutas, mais uma atitude heroica de resistência dos trabalhadores da construção como foram as greves que ocorreram em Jirau-RO e se espalharam por todo país, levantando cerca de 100 mil companheiros no primeiro semestre. Trata-se de uma luta contra as empreiteiras e o governo e, às vezes, até contra alguns sindicatos que, lamentavelmente, em vez de garantir o apoio à greve prefere ficar ao lado dos patrões.

Colocamos nossa central e toda nossa militância à disposição dos companheiros da obras do Maracanã para que assim, juntos, possamos derrotar os que nos exploram e arrancar as nossas conquistas.

Toda nossa solidariedade ao companheiro acidentado e a sua família;

Nenhum passo à traz, até a vitória.

“Se o Brasil cresceu, trabalhador que o que é seu!”


Retirado do Site do PSTU

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Cyro Garcia lança livro sobre a trajetória do PT, leia o prefácio de Valério Arcary

Valerio Arcary, professor do IFSP (Instituto Federal de São Paulo), é autor de As Esquinas Perigosas da História, situações revolucionárias em perspectiva marxista

Este livro nos relata uma história política que foi, ao mesmo tempo, emocionante e terrível. E que, para remeter ao vocabulário cunhado pelos clássicos gregos, uniu epopéia, tragédia e até, mais recentemente, um pouco de comédia. O PT foi o maior partido da história da classe trabalhadora brasileira no século XX. Nos anos oitenta, Lula e a direção do PT foram capazes de construir e empolgar um partido que, em dez anos, evoluiu de uma organização de uns poucos milhares, para centenas de milhares, e que saiu dos 10% dos votos em 1982 para governador em São Paulo, para a disputa do segundo turno das eleições presidenciais de 1989, contando apenas com contribuições voluntárias e militância abnegada. O PT de 2011 é, evidentemente, outro partido, embora a direção seja quase toda a mesma. Em três décadas, o PT elegeu muitos milhares de vereadores, algumas centenas de deputados estaduais e federais, chegou ao governo de mais de mil prefeituras, muitos Estados e está pela terceira vez à frente da presidência. O PT é, sem dúvida, a mais profissional máquina eleitoral do Brasil.



Neste processo o PT enfrentou várias crises. Nos anos oitenta, quando a situação política evoluía à esquerda pela mobilização mais ativa dos trabalhadores e da juventude, o PT teve rupturas pela direita: uma ala moderada rompeu com o partido, porque o PT não apoiou a Aliança Democrática que elegeu a chapa Tancredo/Sarney. Nos anos noventa, quando a situação política evoluía à direita, e as pressões burguesas pela estabilidade do regime eram mais intensas, a direção do PT, decidiu expulsar a Causa Operária e a Convergência Socialista, duas correntes trotskistas, que constituíram, respectivamente, o PCO e o PSTU. Em 2003, depois da eleição de Lula, a direção do PT não hesitou em expulsar Heloísa Helena e os deputados que vieram a formar o PSOL.

Foi, porém, em 2005, que o PT atravessou a crise mais séria de sua história. Uma parcela do núcleo duro de sua direção foi decapitada, politicamente, pela crise aberta pelas denúncias do mensalão. Apesar de indisfarçável satisfação das frações majoritárias da classe dominante com o governo Lula desde o primeiro mandato, a oportunidade aberta pela crise do mensalão precipitou uma ofensiva política burguesa, com eco nas ruas, nas fábricas e nas universidades, que fez Lula tremer no Palácio do Planalto. O mensalão obrigou o PT a sacrificar Zé Dirceu e dezenas de líderes, e deixou o partido desmoralizado entre os setores mais críticos do ativismo operário e popular, em boa parte da vanguarda estudantil mais lutadora, e nos meios da intelectualidade de esquerda mais honesta. O PT preservou, contudo, uma influência majoritária no proletariado. Entre 2003 e 2010, Lula fez um governo que recebeu aplausos quase unânimes do que há de mais reacionário no Brasil e no mundo: de Maluf a Delfim Neto, de Michel Temer a Henrique Meirelles, de Bush a Sarkozy, de Merkel a Putin, não faltaram entre os maiores banqueiros, empreiteiros e latifundiários vozes dispostas a admitir em público o deslumbramento das classes dominantes de todos os continentes com Lula e o PT. Não fosse isso o bastante e, não obstante o impressionante desmascaramento do financiamento eleitoral através de relações obscenas com o empresariado – uma rotina de corrupção que o PT sempre denunciou - Lula surpreendeu pela resiliência de sua autoridade na classe operária.

Apesar desta trajetória incrível, não há porque não lembrar que a formação em 1979/80 de um PT sem patrões, que evoluiu para a influência de massas, rapidamente, nas grandes cidades do Estado de São Paulo, liderado por um líder grevista metalúrgico, sem relações internacionais sólidas foi um fenômeno político admirável e até extraordinário, porém, imprevisto. Nos final dos anos setenta, a maior parte da burguesia brasileira e os líderes políticos da ditadura ainda temiam, seriamente, o espaço político que o PCB por um lado, e Brizola e Arraes por outro, poderiam ocupar quando viesse a anistia. Era a etapa histórica da guerra fria. Foi um tempo de anticomunismo mais primitivo.

O PT e Lula são hoje muito sobreestimados, mas seria injusto não lembrar que foram subestimados quando apareceram na vida política nacional em 1979/80. Tão desdenhado foi o PT até 1982 que uma parcela da imprensa e da mídia da época não se preocuparam muito com a impressionante liderança de Lula entre os operários do ABC e, por isso, lhe permitiram uma visibilidade política que nunca foi cedida, por exemplo, a Prestes.

No entanto, depois da fundação da CUT em 1983 a política da burguesia e da mídia em relação ao PT mudou. O processo de transição democrática que a ditadura perseguia estava sendo ameaçado pelas aparições de Lula e pelo papel do PT inspirando o proletariado de todo o país a lançar-se à luta sindical e política. Ser petista era ser um igualitarista radical. Quando o peso de uma vanguarda militante de centenas de milhares de ativistas começou a ser sentido, sobretudo, durante a campanha pelas Diretas, o PT passou a ser considerado, seriamente, como um inimigo, e Lula como um perigo. Depois da eleição de Erundina para a Prefeitura de São Paulo, em 1988, foi criado o segundo turno nas eleições majoritárias para blindar o perigo de novas vitórias petistas. A militância petista fazia a diferença nas greves, nas ocupações e, também, nas eleições.

Este livro fazia falta por duas razões. Primeiro, porque ainda está por ser narrada uma história da metamorfose do PT que vá além da louvação. Não é polêmico que o PT de 2010 é irreconhecível, se comparado com o de 1980/1989. Não faltam publicações que elogiam a transformação de Lula e do PT. Não faltaram autores para enaltecer o que tem sido explicado como amadurecimento do PT, ou para exaltar o que foi interpretado como a grandeza da maturidade de Lula. A segunda razão é que a versão liberal desta transformação – consolidação de uma máquina burocrático-profissional de milhares de militantes, adaptação aos limites do regime democrático-liberal - afirma, grosso modo, a tese de que a direção do PT mudou porque compreendeu que precisava moderar as suas posições políticas para poder se construir como um partido, eleitoralmente, forte, capaz de disputar eleições para os executivos, e não somente ser uma representação parlamentar dos movimentos sociais, sobretudo, do movimento sindical. Em outras palavras, esta tese argumenta que a direção do PT realizou um espantoso giro à direita para se aproximar dos trabalhadores e ganhar votos. Como toda meia verdade, essa é também uma meia mentira: o contorcionismo político da direção do PT, evidentemente, não foi feito para se aproximar do povo, mas para se aproximar da burguesia.

O que ainda estava por ser escrito era uma história crítica do PT que contextualizasse no tempo e no processo social da luta de classes como aconteceram essas mudanças político-ideológicas. Este livro começa a preencher esta ausência. As premissas teóricas dessa história não precisam ser reinventadas. As idéias do PT mudaram porque os homens e mulheres à frente do PT mudaram. Ensina uma boa escola historiográfica que para explicar o passado e, em especial, para elaborar uma história das idéias políticas dos partidos nas sociedades contemporâneas, é bom admitir que as cabeças acompanham o chão que os pés pisam. E a direção do PT deixou de pisar as portas de fábrica, e passou a pisar os tapetes dos parlamentos e dos palácios. Deixou de correr os riscos que são inerentes às lutas operárias e populares, e escolheu o conforto das concertações sentados à volta de mesas cercados de autoridades que representam a riqueza e o poder. Como se diz nas ruas, pegaram o gosto pela coisa. Este livro nos relembra que o PT não nasceu assim.

Outra questão é definir qual foi a natureza das mudanças. Não parece ser muito polêmico que o PT nunca foi um partido revolucionário, embora muitos militantes honestos que combatiam pela revolução brasileira tenham militado, com abnegação e despojamento, em suas fileiras . O PT surgiu como um partido operário com um projeto de representação independente da classe trabalhadora, mas com um projeto político de reformas para a regulação do capitalismo brasileiro. O PT nasceu das lutas que aceleraram a crise final da ditadura militar. O PT nasceu do impulso social da mobilização operária, uma força social de choque tão poderosa entre 1978 e 1981, que uma parcela majoritária da classe média urbana, sobretudo entre a juventude, se deslocou à esquerda e ultrapassou os limites do que era a oposição democrática liderada por Ulysses Guimarães e o MDB. O PT surgiu como uma frente política que unificou, em torno da liderança de Lula e de um grupo de sindicalistas que emergiram de uma dissidência da burocracia sindical – uma pequena parcela da casta de líderes profissionais que vegetavam em aparelhos sindicais, relativamente ricos, mas esvaziados - os ativistas da esquerda católica, os sindicalistas combativos que organizavam as oposições sindicais, a intelectualidade reformista de inclinações social-democratas, e os militantes da esquerda marxista de variadas tradições (autonomistas, castristas, estalinistas que estavam fora do PCB e do PCdB, trotskistas) que estavam estruturando variadas organizações.

Em dez anos, entre 1979 e 1989, em função da decisão política de ser oposição à abertura lenta, gradual e controlada da ditadura militar - a estratégia de transição para democracia perseguida pelos governos Geisel e Figueiredo, sob a inspiração do general Golbery – o Partido dos Trabalhadores logrou ser o pólo de atração do que havia de melhor e mais destacado na geração de lutadores sociais que estiveram à frente dos maiores movimentos de massas da década, diminuindo a autoridade do MDB de Montoro e Tancredo quando eleitos governadores em São Paulo e Minas Gerais, e deslocando a influência que poderia ter sido atraída pela liderança de Brizola, eleito governador no Rio de Janeiro, ou até do PCB de Prestes.

Este livro nos diz como o PT se fez grande nos anos oitenta. Estes foram os anos em que a direção do PT e Lula ganharam, merecidamente, o seu prestígio político. Defenderam as greves, apoiaram o nascimento do MST, ajudaram o movimento estudantil, acolheram o movimento de mulheres, ampararam o movimento popular urbano de luta por moradia, auxiliaram o movimento negro e, não menos importante, enfrentaram a ditadura, lançaram a campanha pelas Diretas, e denunciaram o acordo que culminou no Colégio Eleitoral permitindo, finalmente, a posse de Sarney. Mas, depois de 1988, quando assume a Prefeitura de São Paulo, o PT começou a mudar. Não foram muitos os que viram o ovo da serpente. O livro de Cyro Garcia merece ser lido, também, porque o autor foi um dos pioneiros na luta política para defender o PT contra as pressões, socialmente, hostis que se abatiam sobre a direção do partido.

Compreender estas pressões nos remete à história da luta da classe trabalhadora para entender o destino do PT. Foi ao longo desses trinta anos que se desenvolveu a experiência de milhares de greves das mais variadas categorias que revitalizaram os sindicatos. Aconteceu, também, o aprendizado superior das greves gerais dos anos oitenta. Houve os comícios imponentes de Lula em 1989, com centenas de milhares de pessoas nas ruas. A luta dos aposentados depois do plano Zélia/Collor comoveu o país. Sem esquecer a greve histórica dos petroleiros de 1995, a marcha do MST de 1997 sobre Brasília, um ano depois do massacre de Eldorado de Carajás, e tantas outras lutas populares. Mas, nesses combates parciais a classe trabalhadora brasileira sempre foi mais radical em suas ações do que em suas reivindicações. Moveu montanhas, para reivindicar muito pouco. O horizonte de sua resistência defensiva era a defesa do salário devorado pela inflação, um pouco de terra para assentar famílias ou construir uma casa, a defesa das aposentadorias ou, quando muito, mais verbas para educação e saúde.

Somente por duas vezes, nesse intervalo histórico de três décadas de crescente confiança na direção de Lula, do PT e da CUT, as massas populares conseguiram irromper na cena política com a força grandiosa de sua mobilização política nas ruas, ameaçando o governo de plantão. De resto, a massa do povo, incluindo os setores da classe trabalhadora mais organizados, aceitaram os limites da democracia liberal que estabelece que a mudança deve ser esperada, disciplinadamente, de dois em dois anos. Seu programa, mesmo quando agiam com métodos revolucionários – derrubar governos nas ruas é uma ação revolucionária, mesmo quando as mobilizações são pacíficas - era reformista.

A mobilização por objetivos políticos foi, portanto, incomum, inusitada, o Brasil não é a Bolívia. Para derrubar governos odiados, então, foi excepcional. As massas populares e a juventude descobriram nas Diretas e no Fora Collor que sua ação era poderosa, mas, ficou claro, também, com a posse de Sarney e de Itamar, que era mais fácil se juntarem contra Figueiredo e contra Collor, do que se unirem a favor de um projeto comum. O socialismo, uma referência vaga para milhões, não era mais que uma aspiração de maior justiça, sem que o ódio ao capitalismo tivesse ainda amadurecido, e mesmo na sua forma difusa, não era um programa que unificasse os trabalhadores e os setores médios plebeus. Foram às ruas expressando o gigantismo de sua força, imensas maiorias de pobres, remediados e deserdados em um país enorme, urbanizado em pouquíssimas décadas, e muito jovem. Instintivamente, procuraram as bandeiras igualitaristas, mas na forma de justiça social, não igualdade social, portanto, ainda nos limites da colaboração de classes.

Espreguiçaram-se, e a classe dominante tremeu, improvisando rapidamente um recuo organizado. Só depois das mobilizações de massas em 1984 e 1992, e não antes – o que faz toda a diferença, e ajuda a compreender a ausência de resistência a Lula em 2002 - a burguesia aceitou que a hora do fim do regime militar tinha chegado em 1984, ou que Collor era um aventureiro a ser descartado. As classes dominantes aprendem com a experiência histórica. Diante da crise do governo FHC, e vendo as rupturas provocadas pelas revoluções políticas nos países vizinhos da América do Sul, especialmente, na Argentina, aceitou que um governo Lula seria uma solução preventiva.

Em resumo, as massas fizeram muito em 1984 e 1992, mas para conquistar muito pouco: a estabilidade do regime democrático, ou seja, o princípio da alternância que foi, afinal, decisivo para a eleição do PT em 2002. Fizeram muito, mas não o fizeram de forma independente. Em 1984, o PT e Lula cumpriram um papel progressivo na co-direção da luta final contra a ditadura, mas tinham influência minoritária. Ainda assim, seus limites sociais (a tendência à submissão aos humores dos setores burgueses aliados) e políticos (um deslumbramento com as pressões democráticas da institucionalidade) já se manifestaram: vacilaram na hora decisiva – na convocação da greve geral no dia 25 de abril – quando a emenda foi a voto no Congresso, capitulando a um ultimato de Tancredo Neves.

Em 1992, quando já possuíam influência majoritária, o lugar de Lula e do PT foi regressivo, ou seja, reacionário: coube a eles o papel de bombeiros assegurando a posse de Itamar que era, fora de Minas, um ilustre desconhecido, embora estivesse, quase acidentalmente, na vice-presidência. A CUT, o PT e Lula se legitimaram nesse processo, mas a classe trabalhadora não estava nem social, nem politicamente à frente da maioria popular explorada. Não dirigia, foi acaudilhada. Nem as Diretas, nem o Fora Collor, foram construídas com uma plataforma que destacasse as reivindicações de classe. O programa que levou milhões à luta não era senão democrático. Não surpreende que os grandes combates se deram nos limites de alianças com dissidências burguesas, como o MDB de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves em 1984, e Orestes Quércia e Brizola em 1992.

A burguesia brasileira, admitamos, demonstrou uma impressionante capacidade de adaptação e concertação. Suas frações mais lúcidas aceitaram sem pestanejar um acordo com o MDB de Tancredo Neves, descartando Maluf, e sacrificaram Collor, engolindo Itamar. Nas duas oportunidades, antes que milhões estivessem dispostos a ir às ruas, uma recessão terrível tinha se abatido sobre a nação. As duas recessões foram precipitadas por ondas de choque externo: a moratória mexicana de 1982 e a recessão mundial do início da década dos noventa. A classe trabalhadora e a juventude não toleraram o desemprego em larga escala, e o saqueio de seu padrão de vida, já por si, historicamente, muito baixo. Não esperaram o calendário eleitoral. Obtiveram vitórias parciais. As eleições diretas não vieram em 1985, mas Figueiredo não fez seu sucessor e o ciclo militar acabou. Não conquistaram eleições gerais em 1992, mas Collor caiu. Vitória parciais, quando era possível ir muito além, deixaram um sabor amargo para a vanguarda operária e socialista.

Mas este livro argumenta com razão que as posições políticas não são o único parâmetro para compreender o PT. Permanecem vivas as controvérsias de fatores para a apreciação histórica dos partidos políticos. Partidos podem ser julgados pela história de suas linhas políticas, as campanhas públicas em que se engajam, e de suas lutas políticas internas; pelo confronto entre suas posições quando estão na oposição, e quando estão no poder; pelo programa para a transformação da sociedade, ou até pelos valores e idéias que inspiram sua identidade; pela composição social de seus membros - militantes ou simpatizantes - ou dos seus eleitores, ou da sua direção; pelo regime interno do seu funcionamento; pelas formas de seu financiamento; ou pelas suas relações internacionais. Os partidos são sujeitos políticos coletivos, portanto, são uma representação das diferentes classes e frações de classe na luta pelo poder. Podem ou não ser úteis à luta pelo poder e por este critério devem ser, também, avaliados.

Todos estes critérios são válidos, e a construção de uma síntese exige uma apreciação da sua dinâmica de evolução. Porque, como tudo que existe, os partidos se transformam e, não poucas vezes, estas mudanças são de tal forma qualitativas, ou estarrecedoras, que eles se tornam irreconhecíveis, quando comparados ao que foram originalmente. Só não se pode é julgar um partido por aquilo que ele pensa sobre si próprio. Para aqueles que usam o marxismo como método de análise das relações sociais e políticas, todos estes elementos são significativos, mas uma caracterização de classe é, finalmente, inescapável, para um juízo dos partidos políticos. Não é um mérito menor deste livro enfrentar com coragem este desafio.

Existem, grosso modo, dois caminhos teóricos para o marxismo tentar explicar como o PT se transformou em um apêndice do lulismo, ou seja, em um partido que consegue, por exemplo, atrair um volume maior de doações dos capitalistas, nas eleições presidenciais de 2010, para a candidata que Lula escolheu e impôs ao partido, Dilma Rousseff, do que a candidatura Serra. Estes dois caminhos não se excluem, ao contrário, se completam.

Para se decifrar o PT, reconhecendo-o como uma singularidade histórica, ou seja, como um problema instigante, porque original, pode-se recorrer aos instrumentos de uma análise político-sociológica: essa análise, mais atenta às mudanças estruturais da natureza social do partido, vai recortar no objeto de estudo, por exemplo, as posições políticas do partido e a evolução de suas bases sociais de apoio, entre eles o apoio eleitoral, e de financiamento, para concluir o que mudou no caráter de classe do partido.

Considerado este ângulo político-sociológico, este livro nos dirá que o PT nasceu como um partido operário com influência minoritária de massas até 1987, e majoritária na classe trabalhadora a partir de 1989; com uma corrente majoritária na direção, desde a fundação, liderada por um bloco político que uniu uma fração da burocracia sindical com aspirações de classe pequeno-burguesas, com um coletivo de líderes de origem na intelectualidade militante que veio da geração de 68, ou acadêmica; um núcleo dirigente que aceitava o papel de caudilho de Lula, simultaneamente, como porta-voz público e como Bonaparte interno de suas variadas agrupações; um programa democrático-radical de reformas, ou seja, de regulação social do capitalismo, que se convencionou denominar de democrático-popular; relações internacionais híbridas que uniam o apoio de uma parcela da hierarquia católica, via Holanda e Alemanha (com relações institucionais minoritárias no Vaticano), o apoio de uma parcela da social-democracia internacional (via PS francês e SPD alemão), o apoio de uma parcela do aparelho estalinista internacional (via Cuba e, posteriormente, da Alemanha Oriental); e, finalmente, mas não menos importante, com uma ala esquerda muito fragmentada em diversas organizações, porém, com a peculiaridade da presença de alguns milhares de trotskistas. Este critério irá valorizar a relação da CUT com os Fundos de pensão a partir dos anos noventa, em plena era das privatizações.

Mas uma interpretação político-sociológica seria estéril sem um enfoque histórico. É o que este livro nos apresenta também. Era presumível que a maioria do povo trabalhador e das novas classes médias urbanas depositassem esperanças, depois das eleições da Constituinte de 1986, e da consolidação de um calendário eleitoral estável, com direito à alternância, no dinamismo de um país que sempre mudou pouco e muito lentamente, mas mudava. A obra da urbanização gerou o maior parque industrial entre os países periféricos, e construiu no entorno de dez mega-cidades, grandes regiões metropolitanas com mais de um milhão de pessoas.

Uma maioria do povo reconciliou-se com o resultado do Colégio eleitoral de 1985. Uma avalanche votou no PMDB do plano Cruzado em 1986. Para Sarney foi um fogo de palha: ardeu, intensamente, pelo sucesso temporário do congelamento dos preços. Súbito, apagou, porque a inflação voltou e mais inflamada. Sarney chegou ao poder com enorme apoio no Congresso Nacional, mas refém do PMDB, e tendo que administrar um país em situação pré-revolucionária. Depois foi a hora do PT, em São Paulo, com Erundina. A parcela mais radicalizada do povo votou PT para dizer basta a Sarney, um voto de protesto contra a superinflação, exasperado em função da invasão da CSN pelo Exército em 1988. O país se dividiu em 1989, mas, de novo, uma maioria arriscou em Collor. Confiaram em Fernando Henrique Cardoso em 1994, pelo plano Real, e ainda em 1998, como um crédito pela estabilização da moeda.

Não obstante a pressão de inércia reacionária de um país culturalmente muito atrasado, onde o medo de represálias sempre foi muito efetivo para neutralizar a ação coletiva do povo, e politicamente pouco organizado, a maioria da classe trabalhadora organizada nos sindicatos foi evoluindo à esquerda, aceleradamente, nos anos oitenta, e chegou a protagonizar duas greves gerais, em 1987 e 1989 que, ainda quando parciais, conseguiram dimensão nacional. Das ilusões no PMDB girou para a oposição ao governo Sarney, e levou Lula ao segundo turno em 1989. Já as classes médias urbanas evoluíram à esquerda nos anos finais da ditadura, mas depois se dividiram: uma maioria deslocou-se para o apoio a Collor em 1989, e depois sustentou com euforia o apoio ao plano Real. Depois da desvalorização da moeda em 1999, os setores médios se afastaram, lentamente, do governo FHC e do PSDB, que sangravam com sucessivos escândalos de corrupção, enquanto o PT girava à direita, despudoradamente, e se aproximaram de Lula. Acabaram por se encontrar somente em 2002.

A maioria do povo desorganizado permaneceu como base eleitoral dos partidos burgueses, herdeiros da Arena e do PMDB, ao longo dos vinte anos que separaram 1982, quando voltaram a ocorrer eleições para governadores, e 2002 quando Lula foi eleito. Em resumo: primeiro, nos anos oitenta, os setores organizados do proletariado e a juventude estudantil, mas, depois, com o passar dos anos, na virada do século, as classes médias e as maiorias populares apostaram, também, na mudança de suas vidas pela representação política que o PT e Lula ofereciam, porém, sempre por dentro das regras do regime democrático. Uma promessa de reformas com poucos riscos de confronto com os poderosos interesses do capital.

O contraste entre a experiência dos seus pais, entre as décadas de 1950 e 1980, e das últimas três décadas parece, hoje, devastador. Cada geração retira conclusões refletindo, comparativamente, sobre um repertório de lições herdadas. A terrível, porém, inescapável lição de que a vida não vai melhorar sem luta, se abate sobre os ombros de milhões de sacrificados pelo desemprego em suas famílias; pelas seqüelas do retorno de epidemias antes erradicadas, como a pneumonia e a dengue; pelos salários congelados; pelo colapso da escola pública; pelo aumento da delinqüência; pelo esgotamento da migração para os EUA, Europa e Japão; e, finalmente, pela desmoralização das organizações e descrédito dos líderes em que confiaram.

A reeleição de Lula em 2006 foi alicerçada nos ventos favoráveis da situação econômica mundial entre 2003-2007, sobretudo, a preservação da inflação baixa e a diminuição do desemprego que permitiram o acesso ao crédito, e a extensão de políticas públicas como o Bolsa-Família. A etapa de aprendizado sindical-parlamentar – cunhada na tradição marxista como a estratégia alemã, por analogia com a história da socialdemocracia mais poderosa do mundo – só se esgota no calor de uma situação revolucionária que ainda não se abriu. A colaboração de classes é um projeto que renasce uma e outra vez, enquanto os trabalhadores não ganharem suficiente confiança em si mesmos e suas lutas. As massas podem abandonar seus chefes de ontem, sem renunciar às quimeras de seus sonhos. Podem, também, se reconciliar com líderes que as decepcionaram. Os trabalhadores precisam encontrar um ponto de apoio político-sindical, como foi o processo que levou o PCB a se tornar em partido com influência de massas depois de 1945, ou sindical-político, como foi o processo entre 1978-1984 que originou o PT e levou a que ele substituísse a direção anterior, o PCB de Prestes, mas, em suma, uma nova direção, para sepultar suas expectativas.

Ao longo destes trinta anos, o PT se manteve como o partido de maior influência no movimento operário e sindical, contudo, com uma perda de apoio entre os setores mais combativos, em especial, na juventude e entre o sindicalismo do funcionalismo público. Entre os anos oitenta e noventa o PT ampliou a sua audiência nas classes médias urbanas e, sobretudo, deixou de ser uma preocupação para a burguesia brasileira que já o sustentou, materialmente, nas eleições presidenciais de 1994. Entre 1994 e 2002, via Fundos de Pensão e através das participações na gestão de Fundos públicos, a burocracia sindical da CUT, ainda o principal aparelho de apoio social da direção do PT, entrou no mundo dos negócios. Depois da eleição de 2002, o PT passou a ter relações orgânicas com o grande capital brasileiro, e passou a aceitar, depois de 2005, com a crise do mensalão, o novo papel cesarista de Lula como líder incondicional.

Outro caminho para construir uma história do PT seria uma análise histórico-política do partido: essa análise, mais atenta às transformações programáticas e à localização político-social, vai recortar uma periodização da relação do partido com o Estado, o regime político e os governos, para concluir o que mudou na posição que o partido ocupa na sociedade. Considerado este ângulo histórico social, a história do PT pode ser dividida em cinco fases qualitativamente distintas:

(a) entre 1980 e 1985, o PT foi um partido de oposição ao regime militar e ao governo Figueiredo, e principal impulsionador de todas as lutas sociais contra a ditadura e, assim, conquistou a liderança nos movimentos sociais, deslocando o papel que antes de 1964 pertencia ao PCB;
(b) depois da eleição de Sarney no Colégio Eleitoral e, depois da eleição da Constituinte em 1986, mas, sobretudo depois das eleições municipais de 1988, o PT deixou de ser um partido de oposição ao regime, agora um regime democrático-eleitoral, mas continuou sendo um partido de oposição intransigente ao governo, ainda que pressionado à colaboração institucional nos limites da ordem legal;

(c) depois da eleição de Collor em 1989 e, acentuadamente, depois das eleições para os governos estaduais de 1990, o PT deixou de ser um partido de oposição sistemática ao governo Collor. Por isso, a direção do PT se recusou a tomar a iniciativa para começar uma campanha pelo Fora Collor em 1991, quando do 1º Congresso, mas depois que a campanha ganhou sustentação de massas nas ruas em agosto de 1992, apesar do PT, a apoiou;

(d) depois da eleição de FHC em 1994, até 2002, o PT manteve a posição de oposição parlamentar, porém, recusando-se a mobilizar a sua base social de apoio para tentar impedir o governo FHC de governar, mesmo quando em 1999, se abriu a possibilidade de fazer contra FHC um movimento semelhante ao que foi feito contra Collor. Foi nesse processo que se consolidou a liderança de José Dirceu;

(e) finalmente, depois da vitória de Lula, ou mais precisamente depois da Carta aos brasileiros em julho de 2002, ao se transformar em partido de governo, o PT passou a ser o principal suporte da contenção social para garantir a governabilidade de Lula. Foi o governo Lula que freiou, conteve e depois anulou a dinâmica histórica que evoluía na transição de uma situação pré-revolucionária para revolucionária como na Argentina, Venezuela, Bolívia e Equador. O PT foi o partido dirigente do governo Lula que conseguiu, entre 2003 e 2010 - sobretudo depois de 2006 – a estabilização política do regime democrático eleitoral: nenhum dos governos eleitos depois de 1989, nem Collor, nem Itamar, nem Fernando Henrique Cardoso tinha logrado de forma tão duradoura uma aceitação política tão grande, e uma neutralização tão bem sucedida do protesto operário e popular.

Periodizações são discutíveis, mas em um livro de história são inescapáveis. Escrever uma contribuição séria à história do PT não é uma tarefa simples por muitas razões. A primeira e, evidentemente, a mais importante é que o PT permanece sendo o partido mais influente do país. Não obstante essa popularidade, a perspectiva histórica obedece a critérios e tempos diferentes da velocidade vertiginosa da política. A política tem o tempo rápido das flutuações dos humores das classes sociais. Esses humores mudam.

Mudam em função de muitos fatores, em algumas circunstâncias mais rapidamente e, em outras, mais lentamente, porém, mudam. Sarney foi muito popular durante alguns meses de congelamento dos preços em 1986. Collor foi muito popular quando conseguiu controlar a inflação nos meses do primeiro semestre de 1990. Um livro de história equilibrado não deve se curvar diante dos impressionismos das circunstâncias. Deve ir além e procurar desvendar os novelos do fio de Ariadne que permitem sair do labirinto das pressões do presente.

Este é um livro crítico e polêmico de interpretação do PT. Ele apresenta uma hipótese de explicação para a evolução das posições políticas e programáticas da direção do PT que repousa em uma análise das pressões de classe a que o Partido esteve submetido. A dinâmica de adaptação do PT ao regime democrático eleitoral será apresentada simultaneamente ao processo de burocratização de uma geração de ativistas que ascendeu socialmente através da política e se integrou às classes médias acomodadas.

Este livro nos apresenta a história de um partido que, paradoxalmente, nasceu de uma combinação rara de virtu e fortuna, oportunidade e coragem. Aproveitou as possibilidades abertas pela formação de uma nova geração de trabalhadores em processo de industrialização acelerada. Conseguiu atrair amplas parcelas das classes médias desgastadas por duas décadas de ditadura. Da oposição à ditadura militar, evoluiu para oposição ao governo Sarney, mas passou a defender o regime democrático, o que o levou a hesitar na hora da luta para derrubar Collor e, finalmente, colocou-se ao lado da institucionalidade apoiando a posse de Itamar. O giro à direita da direção do PT foi tão rápido que sacrificou dez anos: renunciou à defesa de eleições gerais em 1992, pensando que poderia vencer as eleições em 1994. Só chegou a Brasília com as eleições de 2002.

Toda história política séria é a história de uma luta pelo poder. O imponente na luta da classe trabalhadora pelo poder é que ela vive uma tripla condição de exploração econômica, opressão cultural e dominação política. Por isso é tão dramaticamente difícil. Nas sociedades contemporâneas dos paises centrais, após mais de meio século de estabilidade de calendários eleitorais previsíveis, a luta política tem a aparência de uma rotineira luta entre partidos. E essa luta se resume a uma coreografia aborrecida, e até penosa, de disputa de espaços entre aparelhos eleitorais cada vez mais iguais uns aos outros. Aparelhos que não merecem muita confiança porque, quando chegam ao poder, fazem o contrário do que tinham se comprometido.

Resumo da ópera: o engano no lugar da coerência, a dissimulação no da integridade, o disfarce no da transparência, a máscara no da honradez, enfim, o ardil, a fraude, a falcatrua, no lugar da retidão, da inteireza, da honestidade. A alternância de governos não parece entusiasmar mais ninguém. Nem os defensores do regime democrático que se esforçam em teorizar a sua necessidade, apesar da miséria da corrupção endêmica.

Se todas as lutas operárias e populares do mundo contemporâneo merecem ser preservadas do esquecimento pelo que guardam de admirável, a luta pelo poder, que é quando a classe trabalhadora se eleva acima do patamar das resistências para abraçar a transformação da sociedade, tem algo de grandioso. Se a história do PT teve um início emocionante nos anos setenta, e uma trajetória corajosa nos oitenta, perdeu o impulso nos anos noventa. E o PT que assumiu o governo com Lula em 2002 não merece ser poupado de um julgamento histórico severo. Um ciclo histórico se completou, e a oportunidade do PT ser uma ferramenta para mudar o Brasil a favor da classe trabalhadora e da maioria do povo se perdeu. Outras já estão sendo construídas.

Por último, não posso deixar de dizer ao leitor da minha estima por Cyro Garcia. Meu afeto não deixou de crescer ao longo destes últimos trinta anos. Filho da classe trabalhadora, Cyro foi bancário durante décadas. Foi sempre um ativista incansável. Nos anos oitenta era impensável uma grande manifestação nas ruas da Avenida Rio Branco no Rio de Janeiro sem que Cyro Garcia estivesse em cima do carro de som comandando a agitação. Cyro foi presidente de um dos maiores sindicatos do país e não se deixou corromper pelas pressões do aparelho sindical. Foi deputado federal e não cedeu às pressões parlamentares. Cyro voltou para a Universidade para estudar e concluiu um doutorado na UFF, e hoje é professor universitário de história. Carioca da gema, boa praça como se dizia, antigamente, Cyro é conhecido pelo seu indestrutível bom humor. Este primeiro livro de Cyro Garcia testemunha que o trabalho intelectual pode se unir à militância política com resultados estupendos. Porque a trajetória pessoal de Cyro é indivisível da história da CUT e do PT do Rio de Janeiro. Por último, Cyro é um dos mais honestos militantes revolucionários que conheci.

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    O lançamento do livro ocorre no dia 19 de agosto, sexta-feira, no Campus do Largo de São Francisco - UFRJ (IFCS/IH) - Salão Nobre - 2º Andar Largo de São Francisco de Paula, Nº 1, Centro Rio de Janeiro, Brasil


  • Retirado do Site do PSTU

    Ministro da Agricultura é o quarto ministro a cair no governo Dilma

    Crise no governo desmascara 'faxina' de Dilma


    Agência Brasil
    Ex-ministro Wagner Rossi
    Após inúmeras denúncias de corrupção o ministro da Agricultura, Wagner Rossi (PMDB), entregou no início da noite desse dia 17 a sua carta de demissão à presidente. Torna-se assim o quarto ministro a cair em apenas 8 meses de governo Dilma. A queda de Rossi foi o desfecho de poucos dias de uma sucessão avassaladora de irregularidades no ministério. Suspeita-se que o ministro tenha jogado a toalha temeroso que alguma denúncia mais grave esteja sendo preparada.

    As revelações passam por irregularidades na Companhia Nacinal de Abastecimento (Conab), cobrança de propinas, contratos fraudados com o ministério e o recebimento de privilégios de empresas ligadas ao agronegócio.


    Avalanche de denúncias

    As denúncias são numerosas e envolvem até desvio de alimentos. Segundo a revista Veja, o Conab doou 100 toneladas de feijão à prefeitura de João Pessoa (PB) em 2007. O então prefeito, Ricardo Coutinho (PSB), porém, estocou o alimento para distribuí-lo durante as eleições de 2008. Hoje ele é o governador do estado.

    Outra denúncia é a da atuação do lobista Júlio Fróes. A audácia não deixa de impressionar. O representante do agronegócio teria uma sala, equipada com computador e telefone, no ministério para negociar propina em contratos firmados pela pasta. O servidor que comandava as licitações e que denunciou a atuação do lobista, Israel Batista, havia sido afastado do ministério.

    A gota d’água foi a revelação de que o ministro e seu filho, o deputado estadual Baleia Rossi (PMDB), presidente do PMDB paulista, utilizavam um jatinho de uma empresa, a Ourofino Agronegócios, de Ribeirão Preto. O avião ficava todo o tempo à disposição dos políticos. Em depoimento ao Senado, Rossi confessou a “carona” no jatinho, o que não é permitido aos ministros. A empresa mantinha negócios com o ministério. Ganhou uma licença para fabricar vacinas contra a febre aftosa e fornecia o produto ao governo, negócio que a fez dobrar o patrimônio em poucos meses.

    Wagner Rossi, desde abril de 2010 no comando da Agricultura, é um notório representante do agronegócio. Ele e seu filho sempre tiveram suas campanhas eleitorais bancadas por fazendeiros e empresas ligadas ao setor.


    O mito da ‘faxina’ de Dilma

    A série de demissões que o governo Dilma sofreu após as revelações de esquemas de corrupção na Casa Civil, no ministério dos Transportes e, mais recentemente, Turismo, levantou a bola para que setores da mídia e do próprio governo alardeassem uma suposta “faxina” comandada por Dilma no governo. As demissões, nessa versão, mostrariam pulso firme da presidente no trato com a corrupção.

    A realidade, no entanto, é bem outra. Tirando o caso do ex-ministro da Defesa Nelson Jobim, demitido após atacar membros do governo, Dilma prestou apoio e solidariedade até o último momento aos acusados. No caso de Wagner Rossi, Dilma divulgou nota lamentando a decisão e, segundo fontes divulgadas pela imprensa, teria chegado a chorar ao tomar conhecimento da saída do ministro.

    Longe de fazer qualquer “faxina”, o governo Dilma sustenta alianças com setores fisiológicos e notoriamente corruptos. Foi assim com o PR nos Transportes e agora com o PMDB na Agricultura. Se o Partido da República, porém, jogava um peso secundário na base aliada, apesar de dirigir uma pasta com bilhões, o PMDB é visto como fundamental e prioritário por Dilma para garantir a tal “governabilidade”. Wagner Rossi, um dos principais quadros do partido, era ministro na cota do vice-presidente Michel Temer. Seu filho, Baleia Rossi, também envolvido em denúncias, preside o PMDB em São Paulo e estava sendo preparado para cumprir uma função de renovação da imagem desgastada da sigla.

    O governo não só não combate a corrupção, como sustenta setores corruptos e, imerso na lógica das relações espúrias entre setor público e privado, acaba por protagonizar escândalos recorrentes. A queda dos quatro ministros de Dilma , longe de ser um expurgo do governo, é o agravamento de uma crise provocado pela revelação de casos de corrupção e da relação cada vez mais problemática entre o Planalto e a imensa base aliada, faminta por cada vez mais cargos e benesses.


    Farsa da ‘Frente contra corrupção’ e o PSOL

    Nesse dia 15 o senador Pedro Simon (PMDB-RS) lançou no Congresso uma frente parlamentar “suprapartidária” para apoiar a suposta faxina de Dilma. Uma jogada de marketing para apoiar a imagem de “combate à corrupção” de Dilma e para demonstrar que o Senado estava ao seu lado nessa cruzada. Aproveita ainda a boa popularidade que Dilma mantém nas pesquisas.

    Que o Senado, palco de uma série de casos de corrupção a começar pelo seu presidente, tente navegar de forma oportunista nessa história não é de se espantar. O que estranha é a atuação do senador do PSOL, Randolfe Rodrigues, do Amapá. O senador não só integrou a frente como declarou publicamente apoio à Dilma. “Eu apoio a presidente Dilma para tirar de seu governo o pior tipo de ladrão, que não é o ladrão de galinha, mas o ladrão do dinheiro público, que rouba os sonhos da nação”, discursou o senador.


    Retirado do Site do PSTU

    quarta-feira, 17 de agosto de 2011

    Enquanto garante isenções à indústria, Dilma veta reajuste a aposentados

    Aposentados que ganham mais de um mínimo não vão ter aumento em 2012. Mas patrões vão ter isenção da alíquota do INSS


    Agência Brasil
    Presidente Dilma Roussef, durante evento no Planalto
    Dois pesos e duas medidas. É assim que o governo Dilma trata os trabalhadores e a grande maioria da população e os empresários e banqueiros. Ao mesmo tempo em que anuncia um conjunto de benefícios à indústria, através do programa Brasil Maior, que inclui isenções, subsídios e financiamentos do BNDES, Dilma vetou nesse dia 15 de agosto a emenda da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) que previa aumento aos aposentados.

    A emenda, que havia sido negociada pela própria bancada governista e a oposição, garantiria recursos para um reajuste real aos cerca de 9 milhões de aposentados que recebem benefícios acima de um salário mínimo. O texto da emenda apenas dizia que “serão assegurados os recursos orçamentários necessários ao atendimento da política de ganhos reais aplicável às aposentadorias e pensões” . O aumento seria definido junto com as centrais sindicais e as organizações dos aposentados.

    O veto sinaliza de forma clara a intenção do governo Dilma de não recompor as aposentadorias, na mesma linha do governo Lula, “achatando” os benefícios ao valor do piso. Com o veto, somente as aposentadorias equivalentes a um salário mínimo irão ter aumento real, seguindo o reajuste do salário mínimo, que deve ficar em 2012 entre 13% e 14% se governo não mudar de ideia. Os aposentados que recebem acima do mínimo, devem ter apenas a reposição da inflação, ou 6%.

    O presidente da Confederação Brasileira dos Aposentados, a Cobap, Warley Martins, reagiu com indignação ao veto. “Dilma é traidora dos aposentados. Em todas as oportunidades de melhoria para nosso segmento, ela nos prejudica” , afirmou o dirigente dos aposentados em nota divulgada pelo site da entidade.


    Ataques

    Vai ser o segundo ano consecutivo que a aposentadoria e os aposentados enfrentam um duro ataque do governo. Em 2010, Lula se despediu da presidência concedendo um reajuste defasado aos aposentados, de 7%, quando o salário mínimo era reajustado a 9%. Além disso, o então presidente vetou o fim do fator previdenciário, aprovado no Congresso após uma ampla mobilização das entidades dos aposentados.

    O fator, estabelecido pelo governo FHC, é uma conta que envolve a idade do assegurado, o tempo de contribuição e a expectativa de vida calculada pelo IBGE. Na prática, obriga os trabalhadores a se aposentarem cada vez mais tarde.

    Agora, além de vetar aumento real a todos os aposentados, num momento em que a economia cresce, as empresas lucram e o governo tem recordes de arrecadação, Dilma ainda ameaça impor regras ainda mais restritivas à aposentadoria. O governo estuda trocar o fator previdenciário por uma alternativa ainda pior.

    Segundo relata a Cobap, o governo elaborou três propostas de substituição do fator. Um deles é aumentar em sete anos o tempo de contribuição, que passaria de 35 para 42 anos aos homens e de 30 para 37 às mulheres. Outra alternativa é o estabelecimento da idade mínima, de 65 anos para os homens e 60 para as mulheres. A terceira hipótese estudada pelo governo é o fator 85/95, que estabelece aposentadoria integral para aqueles cuja soma da idade com o tempo de contribuição totalizar 85 para as mulheres e 95 para os homens. São alternativas piores que o atual fator.


    Preparando para a crise

    O veto ao aumento das aposentadorias faz parte da série de medidas que o governo Dilma vem tomando desde o início de seu mandato, orientadas para sinalizar ao mercado que o país está empenhado em controlar gastos para enfrentar uma eventual crise econômica internacional. Faz parte dessa política o corte de R$ 50 bilhões do orçamento e o cancelamento dos concursos públicos.

    Por outro lado, as isenções oferecidas aos empresários e industriais chegam a R$ 25 bilhões em dois anos, parte delas atingem justamente a alíquota patronal do INSS nas folhas de pagamento.

    Antes mesmo que atinja o país, os trabalhadores e a população já pagam o preço dessa crise.


    Releia a ‘Cronologia da Destruição da Previdência’




    Retirado do Site do PSTU

    terça-feira, 16 de agosto de 2011

    Papo de redação: Juary Chagas



    "Na faculdade de direito eu procurei aliar a necessidade acadêmica de ter que produzir um trabalho para concluir o curso com um projeto político, com as ideias que eu defendo na minha militância. A forma de casar essas duas coisas foi construir um trabalho que pudesse localizar a discussão do direito, localizar o debate sobre a justiça dentro de uma perspectiva marxista" afirmou Juary.


    Existe como esse direito institucional funcionar dentro de um projeto político marxista?

    "Toda a construção do livro é orientada para procurar esclarecer essas questões. O tema central do trabalho é que a gente procura desenvolver o direito não como uma coisa que foi pensada em um determinado tempo para tentar dar a sociedade uma harmonia social da qual ela faz parte. O direito não surge porque a sociedade é harmônica e em determinadas circunstâncias essa harmonia é abalada. Aí se pensou a necessidade de instituir um instrumento regulador, punitivo, para tentar restabelecer essa harmonia social. É justamente nisso que a perspectiva marxista trabalha para desmistificar essa historia. O direito surge a partir do momento em que o ser humano se envolve em determinadas relações de produção da sua própria sobrevivência".

    Segundo Juary, "O homem que produzia apenas para a sua sobrevivência, num determinado momento, passa a produzir para além das suas próprias necessidades. Surgiu então a primeira necessidade histórica do homem transformar esses bens num determinado valor de uso, mas também num valor de troca. As primeiras relações jurídicas surgem a partir do surgimento da mercadoria, quando o homem passa a trocar essa mercadoria com outros sujeitos sociais. Então, esse vínculo contratual que faz uma mediação entre a troca de mercadorias é o embrião da forma jurídica. Quando surge esse excedente de produção, esses bens produzidos para além da capacidade de consumir, surgem também a possibilidade histórica de um determinado segmento social se apropriar desse excedente e também dos meios de produção, que em determinado tempo fizeram com que as mercadorias fossem transformadas em coisas com valor de troca".

    Para o autor, "Quando o direito surge de forma mais acabada ele se vincula a essas relações de produção e se joga para proteger essas relações. Por isso que, quando analisamos o direito do ponto de vista marxista, a gente percebe que ele surge como um instrumento para garantir a livre negociação de mercadorias e a ampliação desse circuito mercantil. Não por acaso, o direito surge também para assegurar os interesses da classe dominante. No escravismo as leis, a justiça, se voltavam para garantir uma normatização, uma legalização das relações sociais existentes. O direito existe como esse sistema de relações e o Estado está ali para aplicar o direito".


    Hoje existe uma grande discussão no meio do movimento popular, como a criminalização e o julgamento da ilegalidade da greve, que é um direito garantido pela Constituição Federal. Como você analisa isso?

    "A primeira coisa que a gente precisa compreender é que o direito é um instrumento que, surgindo da forma da mercadoria para garantir a sua livre circulação e sendo assegurado pelo poder do Estado, evidentemente que ele tem uma natureza de classe. E a natureza de classe do direito é a natureza da classe dominante. Então, o direito é um instrumento de manutenção dos interesses da classe dominante. No livro a gente traça toda essa perspectiva e faz uma análise nesse sentido. Aí a gente precisa estabelecer uma mediação para explicar como essas relações ocorrem no mundo real. O direito é um instrumento com natureza de classe, mas está sujeito a correlação de forças que existe nessa luta de classes. Então, quando alguma medida judicial vem no interesse da classe trabalhadora isso não significa simplesmente que foi a burguesia ou o Estado que concedeu, mas que houve uma luta entre as classes sociais que fez com que o direito consagrasse essa lei ou vantagem material. A diferença do capitalismo para as outras formas de organização econômica e social é que a burguesia entrega os anéis para não perder os dedos".

    Juary lembra que houve muitas lutas da classe trabalhadora para garantir o direito de greve na Constituição de 1988. "No final da década de 1970 e início da década de 1980 uma fortíssima mobilização social desencadeou o processo de redemocratização que culminou com a consagração da Constituição de 1988. Então, essa não foi uma concessão do direito. Essa foi uma conquista da luta da classe que foi consagrada pela imposição da luta".

    Ele afirma que nos momentos onde não há mobilização, aonde não há força política e social para encurralar o direito e o Estado, esses irão se colocar ao lado da classe dominante porque tem a ver com a sua natureza.


    Criminalização dos movimentos sociais...

    "Hoje estamos vendo um grande processo de criminalização dos movimentos sociais, inclusive com a justiça se posicionando de forma muito dura, arbitrária, truculenta, reacionária frente os movimentos e as greves. Um dos elementos a partir dos quais a gente pode explicar isso tem a ver com a incapacidade dos movimentos sociais, entendendo isso num sentido amplo, a organizar a classe trabalhadora para lutar. Isso se deve a todo um processo de domesticação dos sindicatos, das centrais sindicais, dos movimentos, principalmente os que estão ligados ao governo a partir da ascensão do PT à presidência da República. As principais entidades representativas dos trabalhadores que antigamente tiveram uma historia de lutas passaram a defender as políticas do governo. Evidentemente esse não é o único elemento, mas é um ponto importante para se analisar".


    Você deve ter aproveitado o espaço da sala de aula durante o curso de direito para debater esse conteúdo que se transformou no livro. Como ocorria isso e qual era a reação da turma na sala de aula?

    "Na verdade a construção do livro, mesmo quando ainda estava constituído como trabalho acadêmico, em nenhum momento foi resultado de algum processo mais avançado que existia na faculdade. O meio acadêmico no direito, e pode-se dizer em geral, é um meio extremamente conservador. Quando decidi fazer esse trabalho não tive nenhum apoio dentro da faculdade. Muito pelo contrário, eu tive fortes dificuldades de encontrar até mesmo professores que se dispusessem a orientar o trabalho. Eu tive a sorte de encontrar lá na faculdade o professor Zeu Palmeira que se dispôs a orientar o trabalho. Quando passamos para o processo de montagem da banca foi outra dificuldade. A teoria marxista que é trabalhada no direito não é somente marginalizada, ela é uma teoria combatida e muitas vezes até ridicularizada. O curso de direto hoje, não somente na UFRN, mas nas universidades em geral, é dominado por forças conservadoras. Esse é um debate que vai muito além da visão acadêmica. É um debate que passa também por um enfrentamento de visão de mundo, de interpretação da realidade e de interesses de classe. O direito é um curso bastante elitizado, onde a classe trabalhadora tem dificuldade de entrar pela sua concorrência. Pelo seu próprio conteúdo teórico, pela forma de interpretação da realidade que a maioria dos docentes assume dentro da academia, esse debate marxista é absolutamente marginalizado e combatido".


    Você coloca as dificuldades enfrentadas diante de uma academia reacionária. Como vê então o exercício da defesa do direito de classe?

    "Embora tenha um caráter intelectual, acadêmico, eu não tenho dúvidas de que trabalhos como esse tem o mérito de colocar uma discussão que tem a ver com um projeto de sociedade".


    Como transportar essa discussão, que já é difícil de ocorrer na academia, para a sociedade e o meio popular?

    "Muito embora esse tipo de trabalho tenha um viés acadêmico e intelectual pode e deve expressar questões que tocam o dia-a-dia da classe trabalhadora. Esse trabalho, antes de qualquer coisa, é um trabalho militante em defesa da luta da classe trabalhadora, em defesa da revolução socialista. O objetivo final é que esse trabalho possa influenciar de alguma maneira os movimentos sociais, os partidos políticos, a esquerda em geral, a classe trabalhadora como um todo para entender o direito, qual a sua natureza, de onde surge, como funciona. Acho que esse é o resumo do sentido prático desse trabalho".


    Como ampliar esse debate que o livro propõe e quais os espaços que tem sido ocupado para fazer valer esse debate?

    "Um trabalho como esse, que procura explicar justamente o que a classe dominante mais procura esconder, que é a luta de classes, evidentemente não vai ter nenhum espaço privilegiado dentro dos meios de comunicação que são controlados pela classe dominante. Então a gente procura trabalhar com os companheiros que estão do nosso lado nessa luta, que são as entidades combativas do movimento estudantil, os movimentos sociais, os sindicatos, os partidos políticos de esquerda, os coletivos de comunicação como o coletivo foque, que se coloca claramente como uma imprensa a serviço da classe trabalhadora. Esses são os nossos parceiros privilegiados. Esse é um trabalho tem lado, uma perspectiva marxista, que é advogar a luta por uma sociedade socialista".


    A gente sabe das dificuldades que é publicar em nosso país, imagine publicar um livro com esse conteúdo político marxista. Fale um pouco da editora que abriu espaço para essa publicação.

    "Publicar um livro é uma coisa muito dispendiosa financeiramente, não por acaso as publicações da burguesia dominam todas as livrarias e as bibliotecas, porque ela quem tem o papel, ela quem tem as máquinas de imprensa, ela quem tem o capital. Então, não é por acaso que é tão difícil se publicar, e mais ainda se publicar com uma perspectiva marxista de esquerda revolucionária. Nesse sentido iniciativas como a da editora Sundermann são fundamentais. Uma livraria e editora que se coloca com uma linha editorial claramente de esquerda, claramente em defesa da classe trabalhadora, claramente reivindicando o marxismo. E que se utiliza desses instrumentos para divulgar as ideias. Evidentemente que não é uma coisa fácil. É preciso a contribuição de pessoas que acreditam nesse projeto. mas vale a pena, por que a mesma medida das dificuldades é o tamanho dos nossos desafios de travar contra a burguesia uma luta no domínio econômico, político e também teórico".


    Um recado final para os leitores do Coletivo Foque.

    "Acredite nas suas próprias forças. A justiça que está aí não está ao lado da classe trabalhadora. Eventualmente ela pode se colocar ao lado da classe trabalhadora, mas quando isso acontece é por que os trabalhadores pressionam e lutam. A chave de tudo isso é que confiem nas suas próprias forças, se organizem e lutem, por que é só a luta que vai mudar a vida e, inclusive, obrigar o direito a consagrar realmente as conquistas".


    Retirado do Site do Coletivo Foque