sábado, 24 de dezembro de 2011

Nota do PSTU sobre a 14ª Conferência Nacional de Saúde

De 30 de novembro a 4 de dezembro, ocorreu em Brasília a 14ª Conferência Nacional de Saúde, com a participação de 2.937 delegados e 491 convidados. O evento foi marcado pela rejeição completa a todas as formas de privatização, bem como apontou para a necessidade de aumento no financiamento da saúde, sinalizando que a União garanta, no mínimo, 10% da Receita Corrente Bruta. Hoje o investimento da União em saúde não chega a 4% do PIB. Enquanto isso, compromete 25% do PIB com o pagamento da dívida pública.

Apesar de o relatório final apontar para uma saúde pública 100% estatal e contra toda forma de privatização da saúde, o governo federal apresentou, de última hora, a “Carta da 14ª Conferência Nacional de Saúde a Sociedade Brasileira”, que sabota o sentimento e as propostas dos trabalhadores e usuários do SUS participantes da conferência.

Além disso, a referida carta não explicita bandeiras fundamentais do movimento classista de saúde, como o fim da Desvinculação das Receitas da União (DRU). Com isso, em 2012, o governo federal desviará R$ 62 bilhões do orçamento da Seguridade Social para o pagamento da dívida pública e garantirá o superávit primário. O governo diz ser contra a privatização de maneira ambígua ao não rechaçar as formas de gestão privatizantes apresentadas ao longo dos governos FHC, Lula e Dilma, tais como, as Organizações Sociais, as Fundações Estatais de Direito Privado, as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs), as Parcerias Público-Privadas e a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH), que, aprovada recentemente por Dilma, privatiza os hospitais universitários.

O governo cita a necessidade de fazer avançar a política nacional de saúde do trabalhador, mas não enfatiza a necessidade de mudanças em processos de trabalho e condições adoecedoras, mesmo diante do aumento dos acidentes de trabalho, como, por exemplo, na construção civil, em que esse consistiu nos motivos principais de greves neste ano, como dos trabalhadores da reforma do Estádio do Maracanã, dos trabalhadores das obras do PAC, de Jirau. Evita, assim, indisposições com os empresários.

Nestes mais de 20 anos do SUS, os espaços do controle social, garantidos pela Constituição Federal de 1988, demostraram, na prática, que os conselhos e conferências de saúde são espaços formais, extremamente limitados para a disputa política e ideológica por uma saúde pública, estatal e de qualidade. Nao sao instrumentos de democratização do SUS.

O controle social institucional, conselhos e conferências de saúde, ao longo dessas mais de duas décadas, tornaram-se um instrumento de conciliação e consenso entre classes, os quais, na imensa maioria, se adequam e não conseguem organizar a luta pela garantia de uma saúde pública, estatal e de qualidade, muito menos resistir ao avanço dos governos na entrega dos serviços de saúde ao setor privado.

Os conselhos de saúde apresentam um caráter mais reacionário, em geral, dirigidos pelos gestores do Estado e, em situação mais absurda, pela inciativa privada. Eventualmente, os conselhos podem ser dirigidos por um trabalhador da saúde ou usuário do SUS que tenta disputar com os governos neoliberais os rumos da saúde, mas, ao final, terminam se deparando com os limites políticos destes espaços.

As conferências de saúde que ocorrem a cada 4 anos em nível municipal, estadual e nacional, são espaços mais privilegiados, pois concentram grande número de ativistas, trabalhadores e usuários, que acreditam que esses espaços são capazes de impulsionar movimentos que levem a mudanças conjunturais e mesmo estruturais no SUS. O balanço que o movimento sanitário pode fazer é que, ao longo dos anos, as conferências de saúde produziram relatórios que são excelentes cartas de intenções, mas que são ignoradas pelos governos que terminam por implementar as políticas de interesse dos empresários do setor saúde e não o que propõem os trabalhadores e usuários participantes das conferências.

O PSTU se coloca ao lado da defesa intransigente dos direitos democráticos conquistados pela classe trabalhadora, o que inclui o direito à saúde dos brasileiros. Somos veementemente contrários à “Carta da 14ª Conferência Nacional de Saúde a Sociedade Brasileira” pela forma e método de sua construção e, também, pelo seu conteúdo, que expressa a ausência de propostas de um sistema público de saúde que se combine com as bandeiras socialistas.

Embora tenhamos diferenças políticas no que diz respeito à caracterização do referido espaço, consideramos positivos os esforços empreendidos por companheiros da Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde para disputar a consciência de ativistas, trabalhadores e usuários, presentes na conferência, na luta contra as novas modalidades de gestão pública, que, aliadas ao subfinanciamento, constitui uma politica neoliberal implementada pelos governos para a destruição do sistema público de saúde.

Na atual conjuntura, avaliamos que, principalmente, os fóruns de saúde contra a privatização do SUS são espaços de unidade de ação do movimento e, no último período, vêm tentando ser um contraponto à “contrarreforma” do setor da saúde imposta pelo capital. Desse modo, assinamos a “Nota Política da Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde”, que denuncia os desmandos do governo, representado pelo ministro da Saúde Alexandre Padilha e por figuras do então movimento de reforma sanitária, que hoje estão ao lado dos empresários da saúde implantando os modelos privatistas no SUS. O governo do PT, dito democrático e popular, ao perder uma disputa política, utiliza métodos arbitrários e antidemocráticos para implementar um grave ataque à classe trabalhadora brasileira, inviabilizando a constituição do SUS 100% estatal, gratuito e de qualidade.


Retirado do Site do PSTU

Revolução e contrarrevolução no Egito

Qual o caráter da revolução que derrubou a ditadura Mubarak? Quais as perspectivas colocadas para a juventude e os trabalhadores egípcios?


Manifestantes egípcios enfrentam forças de segurança
A revolução no Egito demonstrou uma força gigantesca ao derrubar Mubarak. Agora abre mais um capítulo ao questionar de frente o governo militar de turno. Está em xeque o destino do país mais populoso do Oriente Médio e a estabilidade de toda a região, o que inclui Israel.

Revolução e contrarrevolução se enfrentam nas ruas do Cairo em lances acompanhados em todo o mundo. A revolução egípcia marcou o início de 2011 e foi um de seus símbolos mais importantes. Um momento excepcional de um ano excepcional, que nunca será esquecido, pela junção afinal da crise econômica com o ascenso de massas. A revolução egípcia tem uma base material nas conseqüências sociais da crise econômica centrada na Europa. E alimenta os sonhos e o ideário de uma nova geração de lutadores em todo o mundo. Não por acaso a ocupação da praça Tahrir se transformou em um exemplo reproduzido nas praças de todo o mundo, como os "indignados" de Madrid, "Ocupy Wall Street". Os seus resultados terão um enorme valor para os rumos da economia e política de todo o planeta.


Uma revolução em curso

Como todas as grandes revoluções, a egípcia coloca grandes temas em debate para os revolucionários de todo o mundo. O primeiro é se é realmente uma revolução. Alguns setores da esquerda ainda insistem em classificar o que se passa como uma "rebelião". Trotsky no prólogo de seu livro “História da Revolução Russa” dizia:

“O traço característico mais indiscutível das revoluções é a intervenção direta das massas nos acontecimentos históricos. Em tempos normais o Estado, seja monárquico ou democrático, está por cima da nação; a história corre nas mãos dos especialistas deste ofício (…). Mas nos momentos decisivos, quando a ordem estabelecida se faz insuportável para as massas, estas rompem as barreiras que as separam da política, derrubam a seus representantes tradicionais e, com sua intervenção, criam um ponto de partida para o novo regime (...). A história das revoluções é para nós, por cima de tudo, a história da irrupção violenta das massas no governo de seus próprios destinos”

No Egito as massas “irromperam violentamente” para “intervir nos acontecimentos históricos”. Mais ainda, se fortaleceram nessa primeira batalha, cujo símbolo maior é a Praça Tahrir. E depois da derrubada de Mubarak , recorrem sistematicamente na reocupação da Praça para lutar por suas reivindicações. Enquanto essa força não for anulada, a estabilidade burguesa não retornará ao Egito.


O primeiro passo: uma revolução democrática vitoriosa

Trata-se de uma revolução em curso. Mas o que aconteceu na queda de Mubarak? Caiu o governo ou também o regime? E porque isso caracteriza uma revolução? A polêmica agora é sobre o caráter da própria revolução, ou de como se liga a tarefa democrática com a estratégia socialista.

Nahuel Moreno explicava porque a derrubada das ditaduras militares de Argentina, Bolívia e Peru haviam sido revoluções: “Alguns sustentam que só há revolução quando o movimento de massas destrói as Forças Armadas de um Estado ou regime, como ocorreu na Nicarágua. Outros definem que há revolução quando muda o caráter do Estado, ou seja, quando o poder passa às mãos de outra classe, como aconteceu na Rússia de 1917. Finalmente, outros ainda asseguram que a revolução se produz quando se expropria a classe dominante, como se deu, por exemplo, em Cuba, mais de um ano depois do triunfo castrista (...).

Reformas e revoluções se produzem em tudo o que existe, pelo menos em tudo o que é vivo. ‘Reforma’ , como o nome indica, significa melhorar, adaptar alguma coisa, para que continue existindo. Já ‘revolução’ é o fim do velho, e o surgimento de algo completamente novo, diferente (...).

Porém entre essas revoluções, ocorrem progressos, melhoramentos, ou seja, reformas. Como toda definição marxista ou cientifica, revolução e reforma são termos relativos ao segmento da realidade que estamos estudando (...). Para usá-las corretamente, não devemos esquecer seu caráter relativo. Revolução em relação a quê? Reforma em relação a quê? (...).

Se nos referimos à estrutura da sociedade, às classes sociais, a única revolução possível é a expropriação da velha classe dominante pela classe revolucionária (...). Se nos referimos ao Estado, a única revolução possível é que uma classe destrua o Estado da outra; que a expulse e o tome nas mãos, construindo um Estado distinto (...). Sustentamos que a mesma lei se aplica em relação aos regimes políticos.”


Segundo Moreno, as revoluções se dão quando ocorrem duas condições. A primeira é o surgimento de crises revolucionárias, ou seja, quando as instituições do regime ficam completamente paralisadas. Quando o processo é de reformas não existe isso, portanto, ocorrem mudanças graduais, planejadas. A segunda condição é que o regime anterior desaparece, e o que aparece posteriormente é “absolutamente distinto”.

No Egito, durante 18 dias, as massas ocuparam a Praça Tahrir, transformando-a não só no centro das lutas contra Mubarak, mas também em um poder alternativo ao do governo. Ali se centralizava a luta, se enviavam colunas de manifestantes para outros lugares, se organizava a defesa contra os ataques da polícia, cuidavam dos feridos. Um duplo poder se impôs.



O governo não controlava mais o país. Os toques de recolher foram ignorados pelo povo. Para tentar reprimir as manifestações, a ditadura recorreu a policiais disfarçados de civis que não impediram a continuidade das manifestações. Para conseguir quebrar a rebelião seria necessário um banho de sangue, como o ocorrido na China de 1989. Mas para isso se precisava de um exército unificado, sob as ordens de Mubarak. E isso não existia. As Forças Armadas estavam paralisadas pela crise.

A classe operária, que até então participava das lutas dissolvida na população, entrou em marcha como classe com uma onda de greves impressionante, juntando suas reivindicações econômicas com a luta pela queda da ditadura. Começando pelos operários do Canal de Suez, abarcando operários têxteis, metalúrgicos, petroleiros, se ampliando para outras grandes cidades, e depois as pequenas.

O governo estava encurralado. Tentou uma última manobra, com um acordo com a oposição burguesa, com uma transição (uma reforma) mantendo Mubarak até setembro. Ele próprio fez esse anúncio pela televisão. A reação das massas foi de fúria. Quinze milhões de pessoas ocuparam as praças de todo o país. A classe operária caminhava em direção a uma greve geral.

Existiu uma crise revolucionária no Egito nesses dias, com as greves operárias, a mobilização unificada ao redor da Praça Tahrir, as Forças Armadas paralisadas.

O imperialismo agiu então para buscar uma alternativa por fora de Mubarak, que tinha sido sustentado até então. Entregou a cabeça do ditador para preservar o controle da situação, através de um governo militar que se colocava como uma “transição para eleições em seis meses”. As massas festejaram a vitória.

O regime, logo após a queda de Mubarak, era muito diferente da ditadura de antes. A diferença fundamental foi uma brusca mudança na relação de forças, com as massas se sentindo vitoriosas e querendo seguir em busca de suas reivindicações. O regime não se define somente pelas instituições no poder, mas pela relação entre elas, por onde passa realmente o poder.

Antes Mubarak governava como expressão de uma ditadura militar. Assassinou milhares de pessoas e impediu por trinta anos qualquer oposição. Agora, a mesma instituição- o exército- para governar tinha de se apoiar na negociação permanente com a oposição, em particular com a Irmandade Muçulmana. E assumia um claro mandato de transição, com o compromisso de realizar eleições constituintes e presidenciais em seis meses.

O elemento de continuidade, no entanto, tem uma grande importância. A instituição principal continua sendo o exército, com altas figuras do governo anterior, centralizadas pelo Marechal Hussein Tantawi. As Forças Armadas, exatamente por sua paralisia na crise revolucionária, preservou sua autoridade perante as massas, angariadas nas guerras contra Israel. Com a queda de Mubarak, se manteve como o centro da contrarrevolução, a base de apoio para o imperialismo e a burguesia egípcia para derrotar as massas rebeladas.

Mas o conteúdo do regime é distinto da ditadura de antes. O governo militar não podia dispor da força própria da ditadura Mubarak. Tem de negociar com a oposição burguesa uma saída política.

Qual foi o resultado então da primeira parte da revolução egípcia. Caiu o regime (a ditadura militar) junto com Mubarak? Ou caiu o governo Mubarak e se manteve o regime? O que existe hoje: uma transição em direção a um regime bonapartista com formas democráticas? Ou para uma democracia burguesa com características bonapartistas?

Aplicando os critérios definidos por Moreno, houve uma revolução democrática vitoriosa. Houve uma crise revolucionária e o regime posterior é qualitativamente distinto do anterior.

Mas uma resposta categórica a essa pergunta, na verdade, só será possível quando a transição se completar, depois das eleições presidenciais. A força da revolução egípcia; o ineditismo do conjunto da revolução no Oriente Médio e norte da África, as condições especiais da região pela presença de Israel; colocam muitos elementos novos na realidade que exigem paciência nas caracterizações. As duas hipóteses estão colocadas. A própria realidade nos revelará a resposta.




Reação democrática no Oriente Médio e Norte da África?

Essa é uma região na qual o imperialismo não aplicava a política da reação democrática, ou seja, a utilização da democracia burguesa para a contenção do ascenso das massas. Existe uma polarização violenta entre revolução e contrarrevolução na região que levou o imperialismo até agora a não utilizar como tática privilegiada a reação democrática, como faz na América Latina. Na região das maiores reservas de petróleo do mundo, sacudida historicamente por guerras e revoluções, é fundamental manter regimes estáveis. Por isso, a colonização imperialista apoiou sempre monarquias e ditaduras repressoras.

Quando teve de se enfrentar com o nacionalismo burguês, os governos imperialistas reagiram com uma contra-ofensiva militar. A expressão mais acabada dessa política foi a criação do Estado de Israel, um enclave militar a serviço da contrarrevolução em toda a região.

A democracia burguesa, no entanto, já deu mostras de sua serventia para o capital para derrotar ascensos revolucionários. A realidade posterior à Segunda Guerra Mundial demonstrou ampla utilização da democracia burguesa, que serviu para períodos de estabilidade como para derrotar ascensos revolucionários. Foi assim na revolução portuguesa em 1975 e na revolução nicaragüense em 1979. Com a crise das ditaduras latino-americanas na década de 80, foi a alternativa construída pelo capital para reestabilizar a região. A democracia burguesa na América Latina, com todas as crises, já subsiste há 27 anos no Brasil, 30 na Argentina, 21 no Chile. Os planos neoliberais foram aplicados na América Latina pelos regimes democráticos e não por ditaduras (com exceção do "pioneiro" Pinochet). E foi também a democracia burguesa que absorveu os governos frente populistas como Lula, Evo Morales, etc.

Estamos iniciando um novo período político que tem como base a crise econômica internacional mais grave desde a depressão de 29. Está começando uma nova série de combinações de crises e ascensos. Vamos ter pela frente situações e crises revolucionárias em vários países, e sua resolução seja pela vitória ou derrota da revolução pode apresentar novas relações entre democracia e bonapartismo. O imperialismo tanto pode utilizar o bonapartismo para enfrentar o ascenso na Europa, como ser obrigado a utilizar a democracia burguesa para tentar derrotar a revolução no Oriente Médio e manter seu controle econômico e político da região.

A força e ineditismo da revolução no Norte da África e Oriente Médio já obrigou ao recurso da democracia na Tunísia , em que o Ennahda- um partido islâmico burguês- ganhou as eleições constituintes em outubro passado. Já existem eleições anunciadas na Líbia. Esse recurso já está sendo usado no Egito, com eleições parlamentares já em curso e presidenciais anunciadas para julho de 2012.


A revolução democrática é só um passo da revolução permanente

Na concepção da revolução permanente, o processo revolucionário pode começar por tarefas democráticas (como no Egito) ou mínimas, mas deve ser entendido como parte de uma revolução socialista que vai ter de derrubar o Estado, libertar o país do imperialismo, e expropriar a propriedade capitalista.

Nessa época imperialista, a burguesia não assume a direção de mobilizações revolucionárias para a conquista de reivindicações tradicionais das revoluções democráticas burguesas do passado, como a libertação do imperialismo, a reforma agrária. E nem mesmo a constituição de repúblicas democrático burguesas.

A derrota de Mubarak foi um passo democrático, que desatou uma revolução que se enfrenta objetivamente contra a dominação imperialista. Por isso é uma revolução socialista, ainda inconsciente.

A vitória foi produto de uma mobilização popular gigantesca. Uma classe operária e uma juventude fortalecida pela vitória, com aspirações de melhoras urgentes nas condições de vida. A grande burguesia egípcia foi parte ativa da ditadura de Mubarak e retaguarda nas mobilizações que o derrotaram. Mas depois da vitória, se apresenta como uma das ganhadoras. Seu objetivo fundamental é reestabilizar econômica e politicamente o país para retornar ao saqueio do país.



No caso egípcio, a vitória democrática abre um curso posterior de fortes enfrentamentos. A crise econômica do país não apresenta saídas de curto prazo. A importância do país na dominação geopolítica do imperialismo não permite uma independência política sem grandes enfrentamentos com Israel. Não existe possibilidade de uma evolução linear. Cada um dos atores da primeira parte democrática da revolução tinha aspirações distintas dos passos a seguir. A "primavera árabe" teria necessariamente uma duração curta.

A crise econômica internacional influi diretamente sobre a situação egípcia e é por ela influenciada. As exportações para a Europa, parte fundamental da economia do país, caíram dramaticamente de 33% a 15% entre 2008 e 2009. As remessas dos emigrantes egípcios caíram 17% em relação a 2008. O turismo (que ocupa 11% do PIB nacional) caiu rapidamente, deixando sem emprego uma parte da juventude. Os dividendos do canal de Suez, outra parte importante da economia do país caíram 7,2% em 2009. O país depende da importação de alimentos e o aumento dos preços internacionais (18,1% em 2011) foi a gota d'água de radicalização das massas. (Dados extraídos de "Egypt’s Unfinished revolution", Sameh Naguib, ISR)

Além disso, a própria situação revolucionária é um fator importante na desarticulação da economia, seja pelas greves, seja pela instabilidade política.

O proletariado, por outro lado, já vinha em ascenso antes da revolução. A greve de ocupação dos operários de Mahalla em 2006 foi seguida por um ascenso que atingiu o setor público e privado da economia, conseguindo vitórias parciais e enfrentando as leis da ditadura. Durante a revolução, a entrada em cena do proletariado como classe foi decisiva para a queda de Mubarak.
Fortalecidos pela vitória, os operários ampliaram fortemente o número de greves e organizaram novos sindicatos se livrando da burocracia ligada a ditadura. Querem melhores salários, assim como afastar as direções das empresas públicas ligadas à ditadura.

A maior parte da juventude empregada e desempregada, um fator importantíssimo da revolução, não tem perspectivas na realidade econômica atual do país. Querem empregos e melhores condições de vida.

A burguesia egípcia não tem como fazer concessões econômicas para os trabalhadores e a juventude, nem reverter a crise econômica de imediato. Quer um regime que reestabilize politicamente o país, garanta uma aparência democrática com eleições regulares. Mas necessita impor o pagamento dos custos da crise em mais e mais medidas de austeridade contra os trabalhadores.

Por outro lado, a subordinação da junta militar ao imperialismo norte-americano impõe a manutenção dos acordos com Israel, um forte elemento irritativo para o povo egípcio.

Desde a derrubada de Mubarak em fevereiro, a situação objetiva só piorou no país. O Egito é um vulcão já em erupção. Trata-se de uma situação social, política e militar mais grave e polarizada que as ocorridas durante as revoluções democráticas na América Latina, que foram sucedidas pela estabilização da democracia burguesa.

A revolução egípcia só pode ser entendida como parte de uma revolução permanente. Nas condições do país e da região, isso significa que ou avança com um conteúdo anticapitalista e antiimperialista ou retrocede em termos democráticos. Da mesma forma no contexto internacional: ou a revolução no Oriente Médio avança sobre Israel ou inevitavelmente vai retroceder, seja por uma invasão militar israelense ou pela reação (ou contrarrevolução) interna.


A especificidade das Forças Armadas no Egito

Em geral, a cúpula das forças armadas é parte das classes dominantes nos estados burgueses. No caso egípcio, essa realidade ganha contornos mais definidos. As forças armadas controlam uma parte considerável da economia, entre 20 e 30%, incluindo companhias de comércio, turismo, agricultura, etc. Além disso, têm uma subordinação política e material fortíssima com o imperialismo norte-americano. Recebem o segundo maior auxílio militar do mundo (1,3 bilhões de dólares, só inferior ao de Israel), e têm seus oficiais treinados diretamente nos EUA.

Essa realidade material, somada às circunstâncias políticas da queda de Mubarak (ainda com autoridade perante as massas), levam a que esse centro da contrarrevolução queira manter seus privilégios. A ditadura militar em sua configuração anterior foi derrotada, mas sobrou uma instituição com fortes laços com a burguesia e autoridade perante as massas. Nenhum setor privilegiado quer entregar suas vantagens.

No início, o novo governo militar teve de se render à nova relação de forças determinada pela revolução. O primeiro ministro Essam Sharaf teve de ir até a Plaza Tahrir buscar legitimidade, sendo carregado nos braços da multidão.

O governo militar não se apoiava só na autoridade política das FFAA e sim em seu próprio caráter de transição, com eleições anunciadas para seis meses para um parlamento constituinte e de um novo governo. O novo governo se apoiava em uma negociação permanente com a oposição, em particular com a Irmandade Muçulmana.

Essa organização tem um papel particularmente importante agora e no futuro do Egito. Trata-se da organização política de maior força do país, a expressão da oposição burguesa com a forma muçulmana. Suas mesquitas mantêm relações não só religiosas como assistencialistas com a população ocupando um espaço deixado aberto pelo Estado. Durante a ditadura, negociava permanentemente com Mubarak, apesar de ilegalizada e reprimida quando interessava ao regime.

Em todo o período da revolução manteve sempre uma distância das mobilizações, só entrando oficialmente em cena quando a realidade já estava definida. Como ocorre muitas vezes em revoluções democráticas, no entanto, a Irmandade Muçulmana entra no período pós-Mubarak com grande autoridade política e como um elemento político essencial para a dominação burguesa.

Logo depois da queda de Mubarak , o novo governo militar se enfrentou com as greves e novas mobilizações . Buscou criminalizá-las e reprimi-las, mas não conseguiu evitá-las. Ao contrário, o número de greves nesses meses foi maior do que em todo o ascenso anterior desde 2006. O governo acertou com a Irmandade Muçulmana um calendário eleitoral confuso que aponta várias eleições parlamentares (que começaram em 28 de novembro e seguem em 2012) e a presidencial para 2012 ou 2013, sem data definida.

O passo seguinte do governo foi tentar um pequeno golpe, moldando o novo regime que está sendo construído com uma configuração claramente bonapartista, semelhante ao antigo regime. O Conselho Supremo das Forças Armadas (SCAF na sigla em inglês), como é chamado o governo militar, divulgou uma carta de princípios da nova Constituição na qual apresentou sua intenção de tornar-se “avalista da Constituição” após as eleições. A carta propõe que os membros do SCAF continuem atuando como “árbitros”, usando um poder de veto sobre qualquer artigo da futura Constituição com o qual não concordem e gozando de liberdade irrestrita para definir o orçamento das Forças Armadas de maneira sigilosa.

Ou seja, a “proteção constitucional” oferecida pela Junta Militar consiste em negar soberania política a um futuro parlamento. Estava, portanto, anunciado que o regime a ser construído seria o velho bonapartismo militar agora com uma democracia que seria um apêndice do poder militar. Esse anúncio foi feito alguns dias antes do início das primeiras eleições, com o objetivo explícito de evitar uma reação das massas pela expectativa eleitoral.

No entanto, esse anúncio do governo se chocava com a relação de forças definida pela revolução. As organizações da juventude que estiveram na vanguarda da revolução, assim como os novos sindicatos se lançaram de novo à Praça Tahrir. Desde 18 de novembro, um novo momento da revolução egípcia está em marcha, agora com a exigência da saída imediata dos militares e a passagem para um governo civil.

Desde então enfrentamentos violentos se dão ao redor da praça. Antes das eleições, multidões ocuparam o local e se chocaram com os militares. A repressão não conseguiu evacuar a Praça, apesar de mais mortos e feridos. O governo encabeçado por Essam Sharaf, renunciou e a Junta Militar nomeou Kamal Ganzuri, ex-ministro de Mubarak, como novo chefe de gabinete, causando uma irritação ainda maior.

O governo militar, ao tentar recompor o novo regime com uma feição semelhante à antiga ditadura, se chocou com a relação de forças atual e perdeu o apoio de massas. A exigência do fim imediato do governo militar hoje é uma reivindicação do povo egípcio. No curso de dez meses, a revolução passa a se chocar diretamente contra o centro da contrarrevolução, agora sem os véus que o encobriam.

Mas os militares não têm apenas a repressão como arma. As eleições estavam se iniciando.




A reação democrática em curso

No dia 28 de novembro começaram as eleições no país. O governo militar, a burguesia, o imperialismo apostam na reação democrática para conter a revolução. Nessa primeira rodada se elegem parlamentares em um terço dos distritos do país. Vão ocorrer cinco eleições semelhantes antes das presidenciais, agora marcadas para julho de 2012.

Uma parte importante do ativismo concentrado na Praça Tahrir entendeu o perigo, ao ver a simultaneidade das eleições e das condicionantes constitucionais definidas pela junta militar. A resposta correta da mobilização na Praça Tahrir se combinou com outra errada, de boicote ás eleições.

As massas egípcias votaram em peso. Era a primeira eleição relativamente livre em suas vidas, e entendiam o voto como expressão de sua vitória na revolução. Mais de 60% de comparecimento eleitoral com dez mil candidatos. A maior parte das organizações que chamaram ao boicote teve de recuar e participar da votação.

A Irmandade Muçulmana foi a grande vitoriosa no primeiro turno das eleições, conseguindo quase 40% dos votos. Os salafistas (muçulmanos fundamentalistas) conseguiram 25%, compondo uma maioria islâmica importante. Aqui se reproduz o fenômeno já visto nas eleições tunisianas, com vitória da oposição burguesa islâmica.

Esse é um novo poder em formação, ao redor das eleições, do parlamento e das eleições presidenciais de julho próximo. Um poder burguês de grande importância, um novo centro para a contrarrevolução. Considerando o rápido desgaste dos militares, não se pode desconsiderar a importância dessa nova arma da burguesia e do imperialismo.

O governo militar tinha em fevereiro duas bases de apoio essenciais. Uma base política pelo apoio das massas, além da burguesia e do imperialismo. E a base essencial das armas. Perdeu o apoio das massas, mantendo o apoio das classes dominantes e o peso das armas. A força da revolução egípcia já derrotou a ditadura de Mubarak em fevereiro. Mas as classes dominantes no Egito ainda têm a alternativa da reação democrática, do novo poder que está sendo construído.A repressão militar não tinha conseguido evacuar a Praça Tahrir. As eleições conseguiram, mostrando o peso da reação democrática.

Agora, novamente os conflitos recomeçaram. No momento em que este artigo estava sendo escrito, mobilizações voltaram a se enfrentar com o exército na Praça, já com dez novos mortos e centenas de feridos. A imagem do espancamento de uma mulher por soldados foi transmitida para todo o mundo e indignou ainda mais o povo egípcio.


Quais são as perspectivas?

Revolução e contrarrevolução se enfrentam novamente no Egito, em condições distintas de fevereiro. A revolução avança com a força de sua classe operária concentrada e uma juventude radicalizada fortalecidas pela queda de Mubarak. Recua pela contra-ofensiva da cúpula militar, dos aparatos de segurança ainda preservados, da burguesia egípcia com todo apoio dos governos imperialistas.

A revolução mostra sua força nas mobilizações e sua fraqueza pela ausência de uma direção revolucionária. O governo tenta com a repressão reconquistar o controle de antes da derrubada de Mubarak, mas já prepara o parlamento para frear a revolução pela reação democrática.

Qual será a resultante desse novo choque? O movimento de massas vai novamente derrotar as Forças Armadas, agora em sua nova cara governamental? A crise das FFAA, contida durante a queda de Mubarak, vai se reabrir pelo choque com as massas?

A combinação entre repressão aberta e reação democrática vai resultar em um novo regime democrático burguês com fortes elementos bonapartistas? A Irmandade Muçulmana (ou outra formação burguesa) vai superar as desconfianças do imperialismo e comandar um novo governo, conciliando e mantendo os privilégios dos militares?

Ou um regime bonapartista vai se consolidar no Egito, ainda que com formas democráticas e eleições? Os militares vão seguir mandando no país, tendo o novo governo e parlamento eleitos como apêndices? Isso demonstraria a tese de que o regime não caiu com Mubarak, apenas se reciclou de forma vitoriosa.


Um programa para a revolução egípcia

A palavra de ordem central para os dias de hoje no Egito é "Abaixo o governo militar!". Essa é a consigna que move milhões de pessoas e pode fazer avançar a revolução egípcia. Ela deve ir acompanhada da liberdade para os presos políticos, destruição dos aparatos repressivos e punição dos torturadores. Devemos fazer um chamado sistemático para os soldados para que rompam a disciplina militar e se somem as mobilizações contra o governo militar. O eixo democrático se completa com a defesa de uma Assembléia Constituinte. Defendemos uma greve geral para por abaixo o governo das FFAA.

Outro eixo programático deve estar centrado nas reivindicações econômicas, a partir de aumentos salariais imediato; plano de obras públicas para abranger os desempregados; fim do controle militar sobre as empresas, que devem ficar sob controle operário; sindicatos livres ; expropriação das empresas de Mubarak e seus cúplices e estatização das multinacionais

O outro eixo programático de grande importância é anti-imperialista e contra Israel, centrado na ruptura dos acordos com Israel e abertura da faixa de Gaza. Todo apoio à luta do povo sírio contra a ditadura de Assad.

É preciso enfrentar a reação democrática, buscando desenvolver a mobilização concreta dos trabalhadores e sua desconfiança em relação ao parlamento burguês.

Nenhuma confiança nas direções -como a Irmandade Muçulmana- que buscam um pacto com os militares, e se afastam das mobilizações. É necessário fazer exigências a Irmandade para se some ás mobilizações do povo egípcio.

É preciso organizar um grande encontro, operário e popular para preparar um plano de lutas dos trabalhadores para derrubar o governo que culmine em uma greve geral. Junto com isso deve se apresentar um plano econômico dos trabalhadores que parta de suas reivindicações imediatas e aponte para a expropriação das grandes empresas e um governo dos trabalhadores.


Retirado do Site do PSTU

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

A arte (futebolística) refundada

Parece não haver mais dúvidas, o Barcelona de Pep Guardiola refundou o futebol. Momentos assim marcam uma guinada no esporte e na arte da potencialidade humana. O futebol brucutu, veloz e sem criatividade que parece ter surgido em meio à reação neoliberal no futebol é ultrapassada pela posse de bola, a genialidade e agilidade de toques magestrais, rápidos e precisos. Como diz meu boleiro paterno: “Transformaram o futebol em jogo de basquet, a sensação é de que não se pode retirar a posse de bola até que arremessem!”. Ou melhor, chutem, driblem ou encubram os arqueiros.

Messi, Iniesta e Xavi levam adiante um projeto futebolístico que obriga o pensamento e os pés a agirem em perfeita harmonia. O respeito aos adversários, a educação com os atletas, a marcação cerrada e firme ainda em campo adversário, ensina a todos que bonito mesmo é jogar com raça e objetividade do inicio ao final do jogo.

Fiquei na esperança santista, embora seja sãopaulino. Neymar empolga pelo desconcerto e Ganso pela elegância. A união de ambos não possibilitou o confronto parelho com a equipe espanhola, infelizmente.

Em um momento novo e empolgante, com as primaveras que corajosamente enfrentam a reação das burguesias e do imperialismo, o Barça de Messi parece dizer que é possível sonhar com dias melhores, com arte e beleza na vida humana.

Aí Sócrates... Se pudéssemos juntar esse futebol com a democracia...
Viva o futebol!


Retirado do Site do PSTU

Onde está a revolução e onde está a contrarrevolução na Líbia?

Polêmica com o castro-chavismo e seus repetidores “trotskistas”


Só governo operário e popular poderá garantir liberdades democráticas
O processo revolucionário na Líbia dividiu águas, desde seu início, na esquerda mundial. O fato de produzir-se um levante popular – que rapidamente pegou em armas e originou uma guerra civil – contra um líder político, Muammar Kadafi, que a maioria da esquerda caracterizava de “anti-imperialista”, colocou a discussão sobre se o que acontecia na Líbia era ou não um processo distinto ao que se dava no restante da região: concretamente se estamos diante de uma revolução ou de uma contrarrevolução. Esta polêmica ganhou mais força ainda diante da enorme contradição que representou a intervenção militar imperialista da OTAN, que atuou contra Kadafi, por dentro do mesmo campo militar que os rebeldes armados.

A corrente casto-chavista, que tem um peso importante dentro da esquerda internacional, desde o princípio e até agora, se colocou incondicionalmente ao lado do ditador Kadafi e contra as massas insurretas. Para este setor, o caso líbio era completamente oposto ao da Tunísia ou Egito. O levante popular armado na Líbia não passava de uma macabra “conspiração imperialista” que pretendia derrotar um incontestável “lutador anti-imperialista”, cujo único pecado havia sido sempre defender a soberania e as riquezas de seu país frente às garras das multinacionais. A comprovação mais cabal desta conspiração, à qual todo revolucionário deveria se opor e denunciar, foi a entrada em cena da OTAN. Para finalizar, a queda de Trípoli e a posterior morte de Kadafi, para Hugo Chávez e para os Castro, não podiam senão significar uma enorme vitória do imperialismo, de seus agentes diretos do Conselho Nacional de Transição (CNT), enfim, da contrarrevolução e de seus mercenários pagos, os “rebeldes” (assim, entre aspas), que assassinaram sem piedade nem 'respeito à vida' aquele que estes expoentes do “socialismo do século XX” agora clamam como “um grande lutador, um revolucionário e um mártir”.

Mas a discussão não acaba por aí. A polêmica é tão profunda que se instalou inclusive nas fileiras do trotskismo. Nesse sentido, destacamos o debate aberto com o PTS argentino que, sem reivindicar abertamente o regime de Kadafi, acaba, por outro caminho e com seu costumeiro sistema de frases “ortodoxas”, na mesma posição do castro-chavismo. Eles afirmam que na Líbia quem triunfou foi o imperialismo – que desde que interveio mudou o caráter do processo de progressivo a regressivo apenas com sua aparição – e que as massas armadas organizadas em milícias, ao derrotar Kadafi, não estavam fazendo nenhuma revolução, mas atuando como “tropas terrestres da OTAN” ou “soldados do imperialismo” totalmente centralizadas pelo CNT e instaurando “um governo ainda mais pró-imperialista que o de Kadafi”. Apenas lhes faltou sustentar, pois falta-lhes a coerência que os castro-chavistas têm, que na guerra civil devíamos ter ficado militarmente com Kadafi, uma espécie de mal menor, que estava sendo atacado por nada menos que a “infantaria da OTAN”.

Nós da LIT, pelo contrário, sustentamos desde o começo que na Líbia o que se passava era uma revolução popular e antiimperialista, pois enfrentava a ditadura sanguinária de Kadafi, um dos principais agentes do imperialismo na região. Coerentemente com esta caracterização de onde estava a revolução e onde estava a contrarrevolução, nos colocamos ao lado das massas líbias e saudamos como uma tremenda conquista democrática a destruição do regime Kadafista e o justiciamento do ditador pelas mãos das milícias populares. Com a mesma força, também desde o primeiro momento, denunciamos a intervenção imperialista da OTAN como contrarrevolucionária. Levantando a palavra de ordem “Não à OTAN, Fora Kadafi”, explicamos que a contradição, expressa no fato de a intervenção imperialista ter se dado durante a guerra civil no mesmo campo militar das massas armadas e contra seu agente, Kadafi, se devia à dificuldade política que tem atualmente o imperialismo para invadir de forma direta com suas tropas e ao fato de que se viu obrigado a intervir por dentro de um levante popular armado para disputá-lo e derrotá-lo, tarefa primordial que Kadafi demonstrou ser incapaz de cumprir, convertendo-se assim em um elemento descartável.

Nove meses depois de aberto o processo revolucionário e quase dois após a morte de Kadafi, acreditamos que essa situação não se fechou. A Líbia continua sendo um dos pontos mais altos das revoluções no Norte da África e Oriente Médio, continua sendo um dos pontos culminantes da luta de classes em nível mundial. E o debate, assim como o cenário político, continua. A polêmica segue em um patamar superior, pois, justamente por se tratar de um processo aberto, os fatos começam a confirmar ou negar as diferentes análises, caracterizações e suas respectivas posições políticas. Nada mais evidente, sendo fiéis ao método marxista, que partir dos fatos da realidade para prosseguir navegando nas turbulentas e divididas águas desta fundamental discussão.




Um país devastado

A Líbia do tirano, apesar de ser um país extremamente rico em recursos energéticos, estava imersa na miséria e no atraso. Vejamos algumas cifras. A Líbia possui as maiores reservas de petróleo da África (44 milhões de barris), à frente da Nigéria (37.200 milhões de barris) e da Argélia (12.200 milhões). Em 2009, foi um dos 20 maiores produtores do mundo, sendo o quarto produtor de petróleo da África, depois de Nigéria, Angola e Argélia. Por sua produção de petróleo, a Líbia está na nona posição entre os 12 membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). A isso devemos acrescentar que o petróleo líbio é particularmente apreciado, pois contém pouco enxofre e é fácil de refinar. Oitenta por cento de todo esse ouro negro ia para Europa, principalmente para Itália e França. São conhecidas as grandes companhias presentes em solo líbio: a italiana Eni, a francesa Total e as gigantes anglo-saxônicas British Petroleum, Shell e ExxonMobil. A Líbia ainda conta com reservas de gás natural estimadas em 1.500 milhões de m³.

Diante de nós temos pintado o típico quadro de um país semicolonial. A economia da Líbia é muito dependente do mercado mundial, haja vista que a quase totalidade de suas exportações é de petróleo, enquanto que importa cerca de 90% de seus alimentos e de seus equipamentos industriais. O pequeno país navega em riquezas, enquanto um terço do povo líbio vive abaixo da linha da pobreza e existe cerca de 30% de desemprego. Encontraremos a explicação disto no saque sistemático que faziam – e que agora pretendem continuar fazendo – as empresas petroleiras imperialistas, das quais Kadafi se converteu em dócil agente, em especial a partir do início deste século.

Este modelo de extração foi afetado com o início dos levantes populares. Devido à guerra civil, as exportações de petróleo estão praticamente suspensas. Antes do estouro da crise, se produzia 1,8 milhões de barris de petróleo diários, dos quais se exportava 1,3 milhões. Suas reservas se estimavam em 44 milhões de barris. Toda essa produção caiu a 400 mil barris diários, provocando uma queda de 60% do PIB líbio. Isso é uma catástrofe se levamos em conta que o petróleo representava mais de 95% das exportações e 74% do orçamento estatal. É compreensível o desespero do imperialismo norteamericano e europeu para acabar com o processo revolucionário e retomar a produção anterior à guerra civil. Sobre isso, os analistas burgueses mais otimistas estimam – obviamente tendo em vista a hipótese de que acabe o processo revolucionário – que só em 2013 se poderá recuperar o nível de antes de fevereiro deste ano.

O cenário econômico é péssimo. A situação econômica é caótica e acentua todas as contradições sociais, sobretudo se à estagnação gerada pela situação de guerra civil acrescentamos os efeitos da crise econômica mundial no que diz respeito ao desemprego e ao aumento do custo dos alimentos; elementos que, de fato, estiveram entre as causas que detonaram a explosão popular iniciada em Bengazi. Nenhuma das aspirações socio-econômicas das massas foram resolvidas e esta é a base material que continua impulsionando a luta da classe trabalhadora e do povo líbio, uma luta que, para derrotar Kadafi, custou 50 mil vidas humanas desde fevereiro e que, em que pesem as contradições, conta com importantes condições para se aprofundar.


O CNT se reestrutura em meio a duras crises

A morte de Kadafi abriu um novo momento da revolução líbia. O desaparecimento do “inimigo comum” evidencia todas as contradições de todos os setores que enfrentaram militarmente o ex-ditador.

Tanto para o castro-chavismo quanto para o PTS-FT, o CNT, como principal agente do imperialismo, seria o indiscutível vencedor político-militar de todo o processo de sentido contrarrevolucionário. Desta conclusão podemos deduzir que eles agora deveriam estar saboreando o doce néctar de sua vitória em meio a um passeio. No entanto, a realidade está confirmando outra coisa.

A realidade está demonstrando um processo aberto e em disputa mortal, onde, de um lado, tanto o imperialismo mundial como o CNT se jogam com tudo para liquidar o processo revolucionário, cuja sua primeira condição é desarmar completamente as centenas de milícias populares.

Sua tática central, como desenvolveremos adiante, parece ser a de canalizar as aspirações democráticas e a sede de mudanças reais das massas utilizando um discurso democrático que inclui a promessa de uma saída eleitoral. Em síntese, a tarefa central do imperialismo, através do CNT, é reconstruir urgentemente as Forças Armadas e um estado burguês sobre o desmonte da revolução, colocando esse novo estado a serviço de sugar as riquezas do povo líbio. Do outro lado estão as massas populares, que mantêm sua moral altamente elevada por suas tremendas conquistas democráticas, que desconfiam do CNT e, o mais importante, que continuam armadas e organizadas em milícias.

O CNT, ao contrário do que diz o castro-chavismo e suas variantes, é consciente de que não existe uma correlação de forças totalmente favorável e dá seus passos como se estivesse atravessando um campo minado; se move como um elefante em uma loja de cristais. Pouco depois da queda de Trípoli, em fins de agosto, o CNT anunciou a conformação de um novo governo interino com ampla representação de todas as regiões. Devido às crises políticas, a lista de ministros foi postergada várias vezes e até o então primeiro ministro, Mahmud Yibril, ameaçou renunciar. Encontramos os motivos da demora nos choques de interesses entre os representantes do CNT, empresários formados no exterior ou ex-ministros de Kadafi, e as direções políticas das milícias. Cidades como Misrata, cujas milícias ofereciam uma feroz resistência contra Kadafi (que em certo momento lançou contra esta cidade mais de 18 mil soldados) e exigiam ter mais participação que outras no gabinete. O mesmo ocorria com as milícias de Zintan. Yibril, representante fiel do caráter reacionário do CNT, se opunha alegando que “a guerra e as lutas, não podem ser uma medida na representação de um país” (El País, 30/11).

Em 30 de outubro, como exemplo destas crises, em Misrata aconteceram várias reuniões de rebeldes armados para discutir sua relação com o CNT, instalado em Trípoli. Em uma reunião ampla decidiram continuar sua luta pela “libertação total” e impor seu controle sobre aqueles que pretendem se apropriar de sua revolução e de seus sacrifícios. Uma das propostas foi marchar sobre a capital contra o CNT. Foi assim que se realizou, na noite de quinta-feira, 17 de novembro, uma manifestação de milhares de combatentes armados com fuzis automáticos e acompanhados por camionetes equipadas com morteiros e metralhadoras pesadas, dizendo que eram eles os que deviam aprovar o novo governo. Imaginemos tal cena. Pouco antes dessa manifestação armada, um grupo de 30 comandantes de milícias se reuniu para organizar uma frente comum que consolide sua influência política. Até o momento, a coesão entre as diferentes milícias não é algo assegurado e não foram formuladas demandas específicas. Mas bem poderiam converter-se em um setor político que exerça forte pressão sobre o governo servil do CNT. Em uma declaração, estes líderes milicianos advertiram que “não toleraremos nem perdoaremos que nenhum oportunista crie obstáculos a nossa revolução” (Associated Press, 18/11).

Em meio a toda essa crise política, ao mesmo tempo em que negavam espaços de poder às regiões mais combativas, as autoridades do CNT declaravam suas intenções de instaurar os preceitos legais do islamismo político. Mustafá Abdel Yalil, presidente do CNT, no momento de declarar a “libertação do país”, em 23 de outubro em Bengazi, anunciou diante de dezenas de milhares de pessoas que nenhuma norma poderá contrariar a sharía, o corpo de direito islâmico, que, segundo sustentou, se converterá na principal fonte da legislação do país. Abdel Yalil foi mais longe e falou, inclusive, de instaurar um Estado islâmico onde “qualquer lei que contradiga a sharía será abolida”, onde se acabará com o direito de divórcio, pois “as leis sobre o matrimônio devem ser rechaçadas porque limitam a poligamia e limitam a lei islâmica”.

O titular do CNT, no entanto, adornou seus pronunciamentos falando de respeito aos direitos humanos e aos direitos das mulheres. Nos parece improvável que a intenção real do CNT, composto por liberais laicos, seja instaurar um estado teocrático ao estilo iraniano. Em suma, pelo que parece, poderão avançar no sentido de um islamismo moderado. O apelo ao islamismo, neste caso, tem mais a ver com tentativas de ganhar popularidade e maior aceitação política em um país onde 97% da população professa a religião islâmica.

Finalmente, em 22 de novembro, o CNT nomeou e anunciou um novo gabinete, produto de uma política que pretende aliviar as rivalidades entre as frações regionais. Com 26 votos dos 51 membros atuais do CNT, foi designado como novo primeiro ministro o empresário e professor Abdelrahim Elkib, que possui estreitos vínculos com empresas e universidades estadounidenses e era um alto executivo do setor petroleiro dos Emirados Árabes Unidos. Yibril, corroído pelo desgaste, teve que renunciar pouco antes da nomeação de Elkib, que é outro agente do imperialismo, apenas menos queimado.

A nova conformação do CNT evidencia uma mudança de tática em relação às milícias. Essa instância está demonstrando intenções de debilitar a ação daquelas milícias conflituosas através da cooptação de seus líderes no novo gabinete. O novo primeiro ministro declarou, ao revelar seu gabinete, que “toda Líbia está representada”. Elkib acrescentou, “é difícil dizer que alguma área não está representada” (Terra Notícias, 22/11)

Com efeito, a nova composição do CNT inclui, como Ministro da Defesa, Osama Al-Juwali, comandante do conselho militar da cidade de Zintan, uma das cidades mais combativas na guerra civil, situada nas montanhas de Nafusa, no oeste da Líbia. Juwali, que estava entre os mais críticos ao governo interino, ficou com o cargo depois que suas tropas capturaram, há algumas semanas, Saif al-Islam, o filho de Kadafi. O cargo de Ministro do Interior foi assumido por Fawzy Abdel Aal, um ex-líder das milícias de Misrata. O cargo de Ministro de Relações Exteriores foi ocupado por Ashour Bin Hayal, um diplomata pouco conhecido, originário de Derna, no leste do país, também uma das cidades que mais sofreu a repressão da ditadura kadafista. Hassan Ziglam, um antigo executivo da indústria do petróleo, está a frente da Fazenda. Finalmente, Abdulrahman Ben Yeza, ex-executivo da gigante petroleira italiana ENI, assumiu o Ministério do Petróleo.

A nova conformação do CNT mantém e reforça o caráter burguês-contrarrevolucionário deste organismo. A incorporação de alguns líderes das milícias mais combativas e opositoras ao governo interno é claramente parte de um plano mais amplo para dividi-las e liquidá-las. Mas isso ainda está por vir.

Desta forma, o CNT pretende avançar em seus planos de aplacar o ímpeto revolucionário existente através de eleições constituintes, controladas por eles, que estão anunciadas para meados de 2012. O Parlamento surgido dessas eleições, em teoria, deveria redigir uma Constituição e submetê-la a referendo popular. Finalmente, o último passo anunciado seria convocar, em 18 ou 20 meses, comícios presidenciais. Esse é o plano; a luta de classes dará a última palavra.




Desarmar as milícias...

Este é o ponto crucial da revolução líbia. Nesse momento, podemos afirmar que a única garantia de continuidade do processo revolucionário está na manutenção da organização de amplos setores de massas em milícias armadas. Atualmente continuam existindo centenas de milícias populares que derrotaram as forças kadafistas e que estão em posse de todo tipo de armas. Essas milícias, com toda razão, desconfiam do CNT e resistem, em maior ou menor grau, a entregar suas armas e a submeter-se ao governo provisório.

É sabido que o armamento da classe trabalhadora e dos setores populares é incompatível com o sistema capitalista. A condição básica de um Estado burguês é possuir o monopólio das armas. Por essa razão, para o imperialismo, Israel, as burguesias árabes, o CNT, enfim, para todos os inimigos das revoluções que estão acontecendo naquela região, a tarefa principal é acabar com as milícias. É uma condição básica para poder reconstruir um estado burguês na Líbia. Tal é a estratégia que determina as diferentes táticas políticas do CNT neste sentido.

Pouco depois da queda de Trípoli, o CNT se referia ao desarmamento das milícias em tom agressivo, aplicando uma tática de solução rápida. O ex-ministro do interior, Ahmad Darrat, anunciava, em fins de agosto: “Vamos colocar todas as milícias sob controle militar e recolher todas as armas em mãos da população” (Terra Notícias, 30/08). A intenção expressa era exigir de todos a entrega das armas e incorporar algumas milícias na nova polícia. Mas o tempo e os conflitos de todo tipo com as milícias acabaram por demonstrar aos líderes do CNT que estavam muito longe de ter a autoridade para centralizar o povo armado. Então, mudaram de tática, baixaram os decibéis do discurso. Buscaram novas formas para um mesmo objetivo.

Mais de acordo com a correlação de forças, o novo primeiro ministro Elkib declarou recentemente que “desarmar os ex-rebeldes líbios poderia demorar meses e, além disso, as armas não serão tomadas pela força”. Prosseguiu: “Não obrigaremos o povo a tomar decisões e ações apressadas, nem promulgaremos leis que o impeçam de manter suas armas”. Insistiu em que “não é uma questão lhes dizer: 'Ok, dê sua arma e volte para casa’, essa não é a forma que temos de fazer as coisas”. Em troca prometeu que o governo oferecerá alternativas aos ex-combatentes como educação e empregos. “Trataremos todos os assuntos, os avaliaremos e geraremos programas para darmos conta deles e fazê-los sentir-se importantes”, afirmou. Em um tom muito mais paciente e diplomático finalizou reafirmando sua confiança em que o calendário de transição do CNT chegue a bom termo: “Esperamos que antes de que se concluam os oito meses possamos fazer com que esses combatentes deponham as armas e voltem a suas atividades.” (Associated Press, 4/11).

Por este caminho, o CNT anunciou a criação de um Comitê Supremo de Segurança em Trípoli, que tem como chefe Ali Tarhouni, ex-ministro do petróleo. O governo declarou que a finalidade deste órgão seria, supostamente, garantir assuntos de segurança na capital. Na verdade é uma instância concebida para desmobilizar as milícias.

Para conformar e tentar legitimar este organismo, o CNT se valeu de traições, como a do próprio presidente do Conselho Militar de Trípoli, Abdel Hakim Belhaj, prestigiado ex-lider do Grupo de Combatente Islâmico da Líbia. Belhaj, o mesmo que foi torturado por 7 anos na prisão de Abu Salim, mediante um acordo de Kadafi com a CIA e o MI6, agora é um defensor do desarmamento das milícias e da construção de um exército centralizado pelo CNT. Foi assim que Belhaj se comprometeu publicamente em dissolver rapidamente suas milícias em Trípoli e aceitou ser parte dos 21 membros do Comitê Supremo de Segurança, a ponto de anunciar sua conformação junto com Tarhouni. Recentemente declarou que o exército daria aos “paramilitares” a opção de “incorporar-se ao Ministério de Defesa ou à polícia, ou entregar as armas e voltar à vida civil” (New York Times, 23/11).


...uma tarefa difícil

No entanto, apesar das reacomodações táticas retóricas e as traições de alguns comandantes, a realidade está demonstrando que a tarefa de desarmar as milícias populares não é, nem será, tarefa fácil. Apesar do CNT estar conseguindo cooptar alguns comandantes milicianos, a base das milícias demonstra uma desconfiança importante em relação ao governo interino.

No mesmo sentido, o New York Times informou sobre o surgimento do “Novo Exército Nacional Líbio”, conformado a partir de algumas milícias que foram incorporadas. Este “novo exército” seria um passo adiante do CNT no sentido de cumprir sua obrigação. No entanto, este passo é tão débil que o próprio general Abdul Majid Fakih, responsável pelo mesmo e ex-instrutor da academia militar kadafista, consultado ante o fato de que suas tropas fumam ou atendem celulares enquanto desfilam, afirmou “Ainda não temos bons militares, realmente bons... apenas estamos começando a construir o exército”. E o general tem razão, pois quando este “novo exército” lida com os conflitos armados que se dão entre milícias, poucas vezes sai bem sucedido. Em 15 de novembro, quando foram a Zawiyah (cidade famosa por sua resistência tenaz a Kadafi), segundo a mesma fonte, as milícias mataram 13 soldados regulares, romperam sua promessa de entregar as armas e instalaram uma barreira na principal estrada a oeste da base do exército. Os milicianos disseram que não iriam sair dali. Ali Dow Mohammed, chefe das milícias de Zawijah, disse naquele checkpoint: “O conselho de Zawijah vai decidir o que faremos com nossas armas”. Enquanto isso ocorria os soldados do flamejante exército se dedicavam a pintar os muros de sua base de branco.

Uma mostra contundente do terreno pantanoso em que se move o CNT é a atuação das milícias de Zintan, contraditoriamente, a localidade de onde vem o novo Ministro da Defesa. Mesmo com a cooptação de um alto chefe das milícias o povo segue organizado, armado e controlando estradas e pontos estratégicos em várias cidades. Em 4 de dezembro ocorreu um enfrentamento entre milícias provenientes dessa cidade e o que se descreve como novas tropas regulares em Janzour, uma localidade situada a cerca de 17km a oeste da capital. O enfrentamento deixou um oficial regular morto. Um capitão do que se pretende que seja o novo exército oficial, Hakim al Agouri, comandante do exército em Al Maya, frente a tudo isto, concluiu que “não podemos mandar às milícias que entreguem suas armas... existe gente que não vai entregar as armas” (New York Times 23/11).

Vejamos outro caso mais eloquente. O general Jalifa Hafta, nomeado chefe do Estado Maior das Novas Forças Armadas líbias, no último 18 de novembro, foi alvo de tiroteio duas vezes na localidade de Kasr Ben Ghechir por milícias de Zintan, em um atentado que deixou quatro pessoas mortas e do qual o alto chefe saiu ileso. Mas a tensão se agravou ao ponto de aproximadamente 3 mil rebeldes fortemente armados, procedentes da mesma localidade, reforçarem suas posições no aeroporto de Trípoli – que controlam desde a tomada da capital – e fecharem as vias de acesso ao mesmo ao longo de 10km. Isto produziu enfrentamentos com o suposto novo exército regular que deixou um morto (EFE, 10/12). Frente a acusação de haver atentado contra a vida do general Hafta, o portavoz dos revolucionários de Zintan, Khalid el-Zintani, disse: “O que esperam que façam os combatentes quando um comboio de militares fortemente armados trata de passar postos de controle [em direção ao aeroporto] sem aviso prévio?”. Consultado, segundo reproduz o The Tripoli Post, sobre o “Exército Nacional”, el-Zentani disse que o exército está muito mal organizado para que eles se submetam a sua autoridade: “Até agora não sabemos nada sobre o exército nacional da Líbia. Quem está no comando?, onde estão as bases militares?, qual é seu domínio (…) sobre o território?, o chamado exército nacional ainda não é nada.” (Libia Libre, 11/12)

Outro grupo de milicianos, também originário de Zintan, lançou um ataque na localidade de Echguiga, próxima à cidade de Mezda, com o objetivo declarado de expulsar possíveis ex-representantes ou simpatizantes do regime de Kadafi. O fato se choca com as declarações de Mustafa Abdel Yalil afirmando que o novo governo está disposto a perdoar todos os partidários de Kadafi: “A Líbia está disposta a aceitar cada um”, disse o presidente do CNT ao abrir uma Conferência sobre a Reconciliação Nacional, realizada em Trípoli. “Somos capazes de perdoar nossos irmãos que combatiam ao lado de Kadafi, entendê-los e mostrar tolerância”, sentenciando categoricamente que “somos capazes de perdoar e tolerar”. Este chamado à impunidade foi seguido por Elkib: “Não se pode construir um novo futuro à base da vingança. A reconciliação de todas as partes é uma condição imprescindível para criar um país democrático e constitucional.” (RT em Espanhol, 12/12). Será que as bases das milícias que lutaram contra Kadafi e seu regime estarão dispostas a perdoar seus antigos carrascos?

A realidade é que existe um povo que está armado, que aprendeu a usar essas armas, que tomou consciência de seu poder e que não vai desfazer-se delas tão facilmente. Estamos diante de um processo em curso, de um processo aberto que prevê um longo período de enfrentamentos, de idas e vindas, de avanços e retrocessos, tanto para a revolução como para a contrarrevolução. O CNT pode dar passos no sentido do desarmamento, mas veremos se conseguirá este objetivo antes que as massas percam a paciência e se voltem contra eles.

De início, é prudente duvidarmos se poderão acabar com as milícias, ainda mais em peremptórios oito meses, como está estabelecido em seu calendário eleitoral. Yalil, pressionado pela situação, teve que dizer que pretende restabelecer minimamente a polícia e os guardas fronteiriços em aproximadamente 100 dias. No entanto, o general Hafta, depois de salvar a vida, sofreu um ataque de sinceridade e admitiu que a coisa está mais difícil e que levará de três a cinco anos até que a Líbia possa contar com um exército “suficientemente forte” para ser digno de tal nome. Nem um nem outro puderam responder sobre o tamanho das forças armadas que pretendem formar (Associated Press, 12/12).

O problema do CNT é que, na verdade, este não tem a autoridade política necessária parar encarar o desmonte das milícias em um tempo relativamente curto. As massas desconfiam do CNT e, ao fazer sua experiência, apostamos em que o povo explorado da Líbia termine por concluir que esse órgão é um covil de bandidos, de empresários petroleiros e ex-representantes do regime cujo líder lincharam ante os olhos do mundo.


Com a revolução ou com a contrarrevolução?

Colocados os principais fatos, apontemos algumas reflexões sobre a polêmica com o castro-chavismo e aqueles que, sem a boina, mas com o mesmo palavreado, reproduzem suas posições em nome do trotskismo. A realidade demonstra que o povo líbio, de armas em punho, obteve uma primeira e fundamental vitória democrática ao destruir o regime ditatorial ao ponto de liquidar fisicamente Kadafi. A força das massas acabou com as Forças Armadas burguesas e, com elas, com o pilar do estado burguês líbio. O castro-chavismo e seus porta-vozes, que afirmam que tudo se trata de uma vitória do imperialismo, devem nos explicar como o imperialismo pode triunfar onde as massas estão armadas e destruíram um estado capitalista, onde a classe capitalista e proimperialista perdeu o monopólio das armas.

Em meio aos fatos, é difícil não nos determos naquela caracterização do castro-chavismo ou do PTS-FT que sustenta que as milícias do povo pobre da Líbia são mercenários pagos ou diretamente “tropas terrestres” que atuam como “infantaria da OTAN” e que estão completamente “centralizadas” pelo CNT. No calor da realidade, esta afirmação, que desdenha profundamente a ação das massas e pretende anular a tremenda conquista democrática do povo líbio para reivindicar ou, no mínimo, embelezar Kadafi, está caminhando do surpreendente ao ridículo.

Sem falar do estranho que seria supostas tropas imperialistas terem optado por linchar Kadafi em plena rua, um método típico das revoluções populares, cujo exemplo insuflou o fervor revolucionário de toda a região contra seus ditadores, sobretudo na Síria, pensamos que vale a pena refletirmos sobre:

a) Se as milícias fossem a “infantaria da OTAN” e estivessem completamente disciplinas ao CNT, por que a OTAN, seus supostos comandantes militares, nunca lhes proporcionaram armas e equipamentos avançados? A OTAN, que saibamos, possui melhores arsenais que os antiquados AK-47 com os quais até agora vemos as supostas “tropas terrestres”;

b) Por que a OTAN se retirou no fim de outubro, quando o ideal e completamente lógico teria sido que entrassem com tudo em um país dominado e controlado por suas “tropas terrestres”? Como explicam que até o CNT anda suplicando à ONU “para administrar o país”, que se descongelem os mais de 150 bilhões de ativos que tem o país no exterior (dos quais só liberou 18), negados com o argumento de que o governo não está “suficientemente unido e coeso para confiar-lhe o dinheiro”? Por acaso não confiam nos comandantes de suas próprias “tropas terrestres''?

c) Como é possível que a infantaria de um órgão imperialista como a OTAN, comandado pelos EUA, possa estar questionamento permanente seus supostos comandantes do CNT, ao ponto de assassinar ou tentar assassinar o chefe de seu Estado Maior? Que tipo de infantaria é essa que faz manifestações de rua e diz publicamente que desconhece a autoridade militar de seus supostos superiores?

d)Ainda mais básico e importante: Como explicam o afã, declarado explicitamente, e central na situação política da líbia, que tem o CNT e o imperialismo, de desarmar as milícias? Por que o CNT e todo o imperialismo quereria desarmar sua própria infantaria? Subitamente tornaram-se suicidas?

As contradições do PTS-FT são de ferro. O problema é gravíssimo, pois uma condição básica para uma organização que se diz revolucionária é identificar com precisão onde está a revolução e onde está a contrarrevolução; sobretudo em uma guerra civil. E a realidade confirma que as milícias populares armadas são parte da revolução, não da contrarrevolução. Todo o contrário da tese castro-chavista que o PTS repete em sua essência: as milícias não só não são “tropas terrestres” da OTAN ao mando do CNT, mas estão se enfrentando com a contrarrevolução encarnada no CNT.

Se as milícias estão enfrentando o CNT, que são agentes do imperialismo da pior espécie; se as milícias estão resistindo com tudo o que possuem para não entregar as armas, de que lado estão o castro-chavismo e o PTS-FT nesse enfrentamento armado? Do lado das milícias ou do CNT? Do lado da revolução ou da contrarrevolução?

É fundamental tomar uma posição em uma situação sem espaço para “nem, nem”. Se agora optam por apoiar as milícias populares, o que seria muito progressivo, então devem corrigir sua caracterização e, no mínimo, fazer a autocrítica. Se mantêm sua caracterização – na verdade, uma calúnia – de que as milícias populares são os “soldados do imperialismo”, então devem ser coerentes até o final e apoiar com tudo o CNT na tarefa de desarmá-las o mais rápido possível, pois não poderia haver nada tão progressivo, como urgente, que desarmar – e derrotar – tropas do imperialismo.


As milícias devem manter suas armas contra o CNT e contra o imperialismo!

Nós da LIT nos opomos categoricamente à caracterização e à política para Líbia que defendem o castro-chavismo e sua correia de transmissão dentro do trotskismo, o PTS-FT. Apostamos em que se aprofundem ao máximo as contradições que existem entre as aspirações democráticas e econômicas das massas (que estão conscientes de sua vitória) e os planos contrarrevolucionários do CNT e do imperialismo. O projeto burguês e entreguista do CNT e o agravamento da situação de fome que padece o povo pobre da Líbia coloca a necessidade urgente de levantar um programa que aponte a garantia dos direitos e tarefas democráticas, começando pela libertação do país da dominação imperialista, na perspectiva de um governo operário e popular. Para lutar por isto, defendemos que as milícias mantenham suas armas e sua organização completamente independente do governo e do imperialismo.

O CNT pretende desmontar a revolução através da canalização dos anseios por mudança, fazendo promessas de eleições e de uma assembleia constituinte controlada de cima. As milícias populares não podem depositar confiança no CNT por sequer um minuto. Isso equivaleria ao fim da revolução. As milícias populares devem manter-se armadas como única garantia para que a tremenda conquista de haver derrotado o regime de Kadafi não lhes seja roubada. Não só isto, no calor da revolução, é questão de vida ou morte a centralização das milícias armadas sob uma direção revolucionária e socialista.

A falta de uma direção marxista-revolucionária é o centro do problema na Líbia e no resto das revoluções que sacodem o norte da África e o Oriente Médio. Essa ausência é um ponto importantíssimo a favor da contrarrevolução. No entanto, podemos ser otimistas no sentido de que as mobilizações, insurreições e situações de guerra civil geraram as condições favoráveis e abrem maiores espaços para o surgimento, através de uma política e ação conscientes, de uma direção revolucionária.

As massas líbias devem lutar pela concretização de uma assembleia nacional constituinte livre e soberana, que refunde o país sobre novas bases econômicas e sociais. Isto é central em um país que historicamente foi submetido pelo imperialismo através de ditaduras sanguinárias. O central é garantir a libertação do país do imperialismo e de suas garras, que sempre roubaram suas riquezas. São fundamentais as tarefas no sentido de conquistar a independência nacional na Líbia. Para concretizar esse programa democrático, no entanto, é condição indispensável derrotar o CNT. Enquanto exista esse governo títere das multinacionais imperialistas não se pode pensar nem em liberdades democráticas reais nem em um melhoramento da qualidade de vida das maiorias trabalhadoras. Em seu lugar, as milícias devem lutar por instaurar um governo da classe trabalhadora e do povo líbio. A sustentação desse governo devem ser as milícias armadas e as organizações da classe que podem estar surgindo.

Só um governo operário e popular, que inicie a construção do socialismo, poderá: a) garantir liberdades democráticas para que seja o povo líbio quem realmente dirija seu destino apoiado em novas instituições populares; b) anular todos os contratos de Kadafi, que o CNT quer manter, com as grandes empresas dos países imperialistas; c) nacionalizar o petróleo e todas as fontes de riqueza do país, colocando-as a serviço de satisfazer as necessidades do povo e sob controle da classe trabalhadora organizada; d) castigar os responsáveis por todos os crimes de lesa humanidade cometidos durante a ditadura kadafista que o CNT quer perdoar. Este governo da classe trabalhadora é imprescindível para lutar na perspectiva de uma Federação das Repúblicas Socialistas Árabes.


Retirado do Site do PSTU

Reitoria da USP expulsa seis alunos que lutavam por moradia estudantil

No dia 16 de dezembro de 2011, em despacho divulgado no Diário Oficial, a reitoria da Universidade de São Paulo divulgou a expulsão de seis estudantes, por terem participado da ocupação da sede do COSEAS (Coordenadoria de Assistência Social da USP) em um processo de luta por mais moradia e assistência estudantil na universidade. Esse é mais um infeliz capítulo dos ataques que a reitoria e o governo do estado de São Paulo fazem ao movimento estudantil na USP.

Essas expulsões são um claro ataque ao conjunto dos estudantes, que estão em greve desde o dia 8 de novembro, dia em que a mesma reitoria invadiu a universidade com mais de 400 policiais, prendendo 73 estudantes que protestavam contra a presença da PM no campus.


Perseguição contra aqueles que lutam

O governo estadual vem implantando um projeto de universidade cada vez mais elitista. As verbas da universidade são gastas na construção de centros de convenção e em prédios administrativos, enquanto faltam professores, assistência estudantil, bolsas e moradia. A classe trabalhadora fica cada vez mais distante do acesso ao ensino superior público. Por isso, os estudantes da USP têm um histórico de luta por melhores condições de ensino e por uma educação de qualidade.

José Serra, ex-governador do estado de São Paulo, para acabar com a resistência de professores funcionários e estudantes, escolheu como reitor João Grandino Rodas, seu homem de confiança e verdadeiro interventor. Disfarçada como projeto de segurança no campus, Rodas colocou a polícia no interior da USP para intimidar aqueles que lutam. Essa política culminou na prisão de 73 estudantes que se organizavam politicamente contra os desmandos da reitoria.

Os estudantes da USP estão em greve desde o começo de novembro, pois entendem que são inadmissíveis a prisão e a perseguição de estudantes. Ficou claro que, ao colocar a Polícia Militar para patrulhar a universidade, a reitoria não se preocupava com a segurança da comunidade acadêmica, mas queria acabar com aqueles que se levantassem contra o projeto de universidade que vem sendo implantado na USP pelo governo.

Ao ver que o movimento estudantil não se calou diante de 73 prisões, exigindo através de sua greve o fim dos processos criminais contra esses estudantes, o Reitor da USP explicita sua política antidemocrática e expulsa da universidade aqueles que têm opiniões diferentes, para tentar impor uma derrota aos estudantes.


Contra a repressão! Anulação imediata das expulsões!

Sendo assim, repudiamos a reitoria da USP, encabeçada por João Grandino Rodas, e exigimos imediata reintegração dos estudantes expulsos ao quadro discente. Nenhuma punição aos estudantes que lutam. Defendemos:

  • Anulação imediata das expulsões! Pela reintegração dos 6 estudantes ao quadro discente da USP

  • Revogação completa dos processos criminais e administrativos contra os 73 presos.

  • Fim do convênio da USP com a Polícia Militar! Aplicação de um Plano Alternativo de Segurança no campus.

  • Fora Rodas! Estatuinte Já!


  • Retirado do Site do PSTU

    Plebiscito popular mostra o espaço para a luta em defesa da educação

    Campanha recolhe cerca de 400 mil votos pela aplicação de 10% do PIB para o setor; sem o boicote de entidades como a UNE, resultado seria muito superior


    Foram cerca de 400 mil votos em todo o país
    Cerca de 400 mil pessoas foram ouvidas no plebiscito nacional em defesa da educação pública. Durante um mês, centenas de ativistas por todo o país estiveram nas praças públicas, nas portas das fábricas, nos canteiros de obra, nas escolas e nas universidades defendendo a aplicação imediata de 10% do PIB para educação. Mais de cinco milhões de panfletos foram distribuídos. Entre os trabalhadores e jovens de norte a sul do país um grande consenso: a educação pública no Brasil vai de mal a pior. A situação das escolas públicas, o baixo salário dos professores, a elitização do ensino superior são questões que atingem de uma forma ou de outra todos os brasileiros. A campanha pelos 10% do PIB para educação se encontrou com a indignação de milhares de trabalhadores e jovens com o caos do ensino público brasileiro.

    Neste ano o tema da educação veio à tona com dezenas de greves dos professores da educação básica e com as ocupações de reitorias nas universidades públicas. Muitas delas vão marcar a história da defesa da educação pública brasileira. A força dessas greves foi alicerçada na disposição heróica de luta de muitos ativistas e também no apoio popular que ficou em tantos momentos evidente. Foi por isso que um simples vídeo em que a professora Amanda Gurgel descrevia a rotina de um professor foi assistido por mais de três milhões de pessoas. As campanhas de desmoralização do professorado feitas pela mídia e pelos governos não foram suficientes para esconder a verdade da população.

    Todos entenderam de alguma maneira que o problema dos professores era um problema de todos. Em Minas Gerais, numa greve de 103 dias da rede estadual os professores cobraram do Governo Anastasia (PSDB) que simplesmente aplicasse a Lei e pagasse o piso nacional da categoria. Neste momento, o CPERS no Rio Grande do Sul enfrenta o mesmo embate contra o Governo Estadual de Tarso Genro do PT. E isso foi assim em quase todos os estados e muitos municípios.

    Mas, infelizmente, este ano não será lembrado somente pelas lutas e pela resistência dos trabalhadores. Este também foi o ano em que o Governo Dilma apresentou o novo Plano Nacional de Educação. O governo chamou uma Conferencia Nacional da Educação (a CONAE 2010) e não cumpriu nem as deliberações da conferência totalmente controlada pelo Ministério da Educação. A referida conferência votou a aplicação de 10 % do PIB na educação, bandeira histórica dos movimentos sociais brasileiros. Mas o PNE da Dilma prevê apenas 7 % e só para 2020.

    Diante desse poderoso ataque, as entidades que hoje compõe o Comitê Nacional pelos 10 % do PIB para educação pública estão há meses construindo a resistência, enfrentando o boicote daqueles que passaram para o lado dos ministérios e gabinetes, enfrentando os altos índices de popularidade do governo Dilma e abrindo as urnas do plebiscito para dialogar com milhares de brasileiros. Nesse diálogo os ativistas que tocaram esta campanha encontraram muito apoio: onde havia uma urna se formava fila para votar. Nas caixas de papelão do plebiscito popular ficou claro que o brasileiro diz ‘sim’ ao investimento imediato de 10 % do PIB na educação pública.


    A luta pelos 10% do PIB foi abandonada pelas entidades tradicionais do movimento social

    Enquanto vimos neste ano muitos se despertarem para apoiar a defesa da educação pública, as entidades tradicionais do movimento de massas trilharam o caminho oposto. CUT, UNE, CNTE não se dispuseram a fazer nenhuma ação unitária em defesa dos 10 % do PIB para educação. Ou seja, as entidades governistas não estavam dispostas a realizar qualquer atividade unitária de impacto que demonstrasse que o governo é o responsável pela situação da educação pública. Entre a defesa dessa bandeira histórica e preservação do Governo Dilma, prevaleceu essa última opção infelizmente.

    O mais criminoso desta atitude é que o Plebiscito demonstrou o enorme potencial que esta ação poderia ter, caso fosse catapultada pelas entidades que em outros tempos defenderam esta bandeira. Com todo o movimento social unido era sem dúvida possível interferir nos rumos da votação do PNE.

    A UNE fez uma ocupação de aparato na primeira semana de dezembro que não contagiou nem mesmo a vanguarda do movimento estudantil brasileiro. Com 150 barracas no gramado da esplanada dos ministérios os dirigentes da UNE estavam mesmo preocupados em pressionar o Congresso para aprovar o PNE ainda este ano. A CNTE fez uma marcha muito aquém do poderia ter feito.

    Há que se separar o MST. Foi entidade importante na organização da marcha unitária em 24 de agosto na qual a reivindicação dos 10% do PIB para a Educação Pública já era ponto importante. Infelizmente depois dela não se somou mais as atividades da campanha.

    No apagar das luzes do ano, o relator do projeto Angelo Vanhoni (PT-PR), tentou uma manobra e aumentou de 7 para 8 % o investimento e incluiu no projeto a palavra total. Considerando o investimento total, o que incluiria outros gastos na pauta da educação, a porcentagem de investimento direto poderia ser até mesmo menor que os iniciais 7%.


    O plebiscito manteve de pé a bandeira da educação

    O plebiscito foi a maior iniciativa organizada no movimento para defender os 10% do PIB, constituiu-se como um instrumento essencial da campanha, sem dúvida foi a melhor maneira de ouvir 400 mil pessoas e chegar a muitos outros milhares.

    Entretanto, este foi só um passo inicial. A campanha não terminou e até 8 de fevereiro, data em que está marcada a votação do Projeto na Comissão Especial da Câmara dos Deputados, o Comitê Nacional da Campanha reafirmou a necessidade de seguir fazendo barulho para que não passe em silêncio a opção política do governo Dilma em negar a necessidade evidente de aumentar significativamente os investimentos na educação pública brasileira.

    Se você ainda não participou da campanha, pode acessar o site 10% do PIB para a educação pública já! e deixar registrado o seu voto.


    Retirado do Site do PSTU

    Natal: Lançamento das pré-candidaturas do PSTU reúne militantes, filiados e simpatizantes

    Em preparação para as eleições municipais de 2012, as pré-candidaturas da professora Amanda Gurgel a vereadora e do professor Dário Barbosa a prefeito foram referendadas por militantes, filiados e simpatizantes


    Detalhe do lançamento das candidaturas
    Na noite da última sexta-feira, dia 16, mais de 100 pessoas compareceram ao lançamento oficial das pré-candidaturas do PSTU para as eleições de 2012 em Natal. Eram militantes, filiados e simpatizantes, todos reunidos no auditório do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública (Sinte/RN). Gente que queria dar seu apoio ao partido e referendar os nomes da jovem professora Amanda Gurgel, pré-candidata a vereadora, e do veterano professor Dário Barbosa, pré-candidato a prefeito da capital do Rio Grande do Norte. O evento também foi marcado por apresentações culturais, vídeos sobre a grave situação da educação e depoimentos acerca da necessidade de uma alternativa de esquerda e socialista para Natal. Ao final do lançamento, houve uma comemoração que reuniu artistas locais, trabalhadores, intelectuais e militantes do partido.

    Sob a coordenação da Presidente Municipal do PSTU em Natal, a enfermeira Simone Dutra, o ato de lançamento das pré-candidaturas teve início com as apresentações culturais do cordelista Hélio Gomes e da professora e poetisa Selma Ramos. Reconhecido poeta popular, Hélio Gomes declamou trechos de seu cordel “Vamos à Frente”, sobre a necessidade de uma frente de esquerda em Natal, e empolgou todos os presentes. “É preciso construir / Uma frente de partidos / Que sejam socialistas / De esquerdas, comprometidos / Com a classe que trabalha / E também os excluídos / Um frente com PSOL / Envolvendo o PCB / Unindo o PSTU / Pra mudança acontecer / Com um governo popular / Sem os ricos no poder” , diziam alguns versos do cordel.

    O professor universitário Robério Paulino esteve presente ao lançamento e também defendeu a formação de uma frente de esquerda com partidos socialistas e movimentos sociais. Representante do PSOL, Robério afirmou que era preciso ir amadurecendo as discussões sobre o programa político da frente, a exemplo do primeiro seminário sobre o tema ocorrido no último dia 10 de dezembro. “A esquerda não pode mais sair dividida.”, alertou.


    “Nós já vivemos uma crise”

    O primeiro dos pré-candidatos a falar foi o professor Dário Barbosa. Analisando a situação mundial diante da mais grave crise econômica desde 1929, Dário destacou as conseqüências sociais que estão sendo impostas aos trabalhadores de todo o mundo por governos e bancos. “Nessa crise, nós estamos vendo as pessoas perdendo suas casas, seus empregos, morando nas ruas, em seus carros. Nós esperamos que essa crise não chegue ao Brasil com a mesma intensidade. Mas o que tem feito o governo Dilma para se precaver? Cortou do orçamento do país mais de R$ 50 bilhões e está salvando os empresários, concedendo a eles mais privilégios, com sua política econômica. É sempre assim. Nas crises econômicas, os patrões e governos querem salvar suas peles jogando nas nossas costas os prejuízos deles mesmos”, disse.

    Pré-candidato a prefeito de Natal, Dário Barbosa não poupou críticas à prefeita Micarla de Souza (PV) e aos que já governaram a capital potiguar. “A crise nem chegou ainda ao Brasil e Natal já está em estado de calamidade pública. E nós vamos ouvir os mesmos de sempre, as mesmas oligarquias, os mesmos que governam esta cidade há décadas, dizerem que são alternativas” . E concluiu: “As pré-candidaturas do PSTU existem para mostrar que os trabalhadores sabem e podem governar. Pois as oligarquias sabem governar para elas mesmas, para os ricos, para os empresários, para sua própria classe. Se governassem para os trabalhadores, os hospitais, as escolas e as ruas não estariam abandonadas e os salários dos professores e demais trabalhadores não seriam miseráveis. Nós já vivemos uma crise. ”.




    “Participar das eleições também é uma tarefa dos revolucionários”

    Pré-candidata a vereadora em Natal pelo PSTU, a professora Amanda Gurgel foi a mais aguardada da noite para falar. Mas antes de passar o microfone para a educadora que calou deputados do Rio Grande do Norte, o partido exibiu o famoso vídeo responsável pela indignação que invadiu a internet, tomou as redes sociais e ganhou as ruas impulsionando greves da educação e empolgando protestos. “A razão dessa repercussão toda não foi apenas a coragem do discurso. O sucesso ocorreu mesmo por causa do caos na educação. Eu disse o que muitos queriam dizer. Na verdade, a gente precisa de muito mais coragem para enfrentar a rotina que nós enfrentamos diariamente nas escolas, com baixos salários, salas superlotadas e falta de infraestrutura”, comentou Amanda sob aplausos.

    Sobre a participação de um partido revolucionário em eleições burguesas, Amanda Gurgel foi taxativa e não deixou margens para dúvidas. “Embora essa seja uma democracia que só favoreça aos ricos, a burguesia, e que apenas nos permite escolher a cada dois anos quem irá nos explorar, não tenho dúvidas de que participar das eleições é também uma tarefa dos revolucionários. É neste momento que temos a oportunidade de dizer, para um número maior de pessoas, que as eleições não podem transformar radicalmente nossas vidas. Mais do que o voto na esquerda, nós queremos que os trabalhadores lutem com a esquerda”, destacou a pré-candidata.

    Amanda ainda alertou para o perigo de discursos que visam a enganar os trabalhadores com ilusões sobre as possibilidades de mudança com as eleições. “A participação do PSTU nas eleições não é para criar falsas esperanças nos trabalhadores. Um possível mandato do PSTU na Câmara de Natal não é para dizer que agora está nas mãos da professora Amanda Gurgel a transformação da vida das pessoas. Não se trata disso. Mas sim para servir de apoio às lutas e às mobilizações dos trabalhadores, para denunciar de dentro os ataques contra nossa classe e convocá-la para transformar a própria vida com as próprias mãos”, defendeu ela.


    “Precisamos da força de todos”

    Assim como Dário Barbosa, Amanda também não poupou os vereadores de Natal e a prefeita Micarla. A professora argumentou que eles não representam os trabalhadores e não respeitam suas vontades. “Temos que dizer que existe uma alternativa para a Câmara e a Prefeitura de Natal. Temos que dizer que os trabalhadores não precisam votar naqueles que não nos representam. Essa alternativa precisa vir da nossa classe. Hoje, 90% da população de Natal rejeita a prefeita Micarla de Souza, mas os vereadores que estão lá não rejeitam. Porque representam os mesmos empresários que ajudaram a eleger a prefeita”, denunciou Amanda.

    No final do lançamento, a pré-candidata a vereadora reforçou a necessidade de se construir um frente de esquerda nas lutas e nas eleições e fez um convite a todos os presentes. “Quero deixar também o convite para que cada um aqui presente ajude na construção da nossa frente de esquerda. Um frente não só com partidos de esquerda, mas também com movimentos sociais e com todos os trabalhadores que estejam dispostos a construir uma alternativa para Natal. Não podemos fazer nada sozinhos. Precisamos da força de todos”, concluiu.


    Retirado do Site do PSTU