sábado, 23 de fevereiro de 2013

Quanto vale a vida de uma pessoa?

Escândalo em hospital de Curitiba nos faz abrir os olhos para as consequências da crescente mercantilização da saúde



Médica chefe da UTI do hospital Evangélico de Curitiba (PR) é presa por mortes de pacientes do SUS
Esta semana foi veiculada uma notícia chocante, na qual a chefe da UTI (Unidade de Terapia Intensiva) de um hospital filantrópico de Curitiba (PR) teria provocado a morte de pacientes internados pelo SUS. A polícia suspeita que a motivação para o homicídio qualificado tenha sido a liberação de vagas para pacientes privados. A médica já está presa, mas a investigação vai seguir. Independente do resultado das investigações, este fato nos obriga a uma profunda reflexão. Longe de ser um fato individual e pontual, demonstra o lado mais nefasto da mercantilização da saúde.

Enquanto é implementada e tenta-se convencer o conjunto da população que as "parcerias" público-privadas vêm para solucionar as debilidades da saúde pública, seja na forma das OS (Organizações sociais) ou da EBSERH (Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares), é preciso olhar atentamente para este exemplo e enxergar até onde pode ir este grande negócio que se tornou a saúde da classe trabalhadora. Segundo informações do próprio hospital, dos 615 leitos, "apenas" 103 são privados. Ou seja, a grande maioria é público. No entanto, para as vidas interrompidas pelo dinheiro, quem dá a ordem do dia são os leitos privados. Nesta "parceria", o dono da bola é os grandes empresários da saúde.

Que este caso escandaloso sirva para que tenhamos cada vez mais clareza que saúde não é mercadoria e que vidas não se negociam.

Por uma saúde 100% pública e estatal! Não às OS e à EBSERH!
Estatização dos hospitais privados e filantrópicos.
6% do PIB pra saúde pública já!



Retirado do Site do PSTU

Tráfico de pessoas e regime de escravidão em Belo Monte

Mulheres eram mantidas em cárcere privado, exploradas sexualmente e viviam em regime de escravidão na região da Usina de Belo Monte



Movimentos sociais protestam em frente à sede do CCBM em Belém
Recentes denúncias tornaram pública mais uma violação de Direitos Humanos decorrente da construção da Usina de Belo Monte. No dia 13 de fevereiro, a Polícia Civil do Pará e o Conselho Tutelar de Altamira libertaram 18 mulheres, entre elas uma menor de idade, de uma “boate”, próximo ao canteiro do mega empreendimento, onde eram exploradas sexualmente e viviam em regime de escravidão. O prostíbulo ficava na região entre Altamira e Vitória do Xingu. Na mesma semana, uma operação policial libertou mais 14 vítimas.

As mulheres tinham, na sua maioria, entre 18 e 20 anos, e eram provenientes de outros estados, como Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. De acordo com a polícia, todas viviam em condições insalubres, confinadas em quartos sem qualquer ventilação. Eram proibidas de sair da “boate” sem autorização e quando saíam eram vigiadas por capangas. No local, foi encontrado ainda um caderno, no qual eram contabilizadas as “dívidas” das meninas com o dono do estabelecimento, que eram desde passagens do seu estado para o Pará a vestimentas e alimentação, além de “multas” por motivos diversos.

Estas mulheres eram aliciadas, atraídas para o Pará com a promessa de emprego. Quando chegavam ao estado, já deviam para o dono da boate o valor das passagens. Em cárcere privado, eram obrigadas a se prostituir para pagar as “dívidas”. De acordo com as vítimas, elas chegavam a fazer programa 24h por dia, sempre que havia “clientes”, exclusivamente operários, gerentes e funcionários da Usina de Belo Monte. Traficadas, viviam sob ameaças, vigiadas sob a mira de armas, e em regime de trabalho escravo.


Belo Monstro

A Usina de Belo Monte, um dos principais investimentos do governo do PT, emperrado por quase três décadas por ameaçar o Rio Xingu e a população local, está diretamente relacionada com a última denúncia de violação de direitos humanos na região.

De acordo com a conselheira do Conselho Tutelar que acompanhou a operação para libertar as mulheres, Lucenilda Lima, para chegar à “boate” foi preciso atravessar um canteiro de obra da construção e se submeter à burocracia do Consórcio Construtor de Belo Monte (CCBM). Inclusive, a investigação do Ministério Público sobre os casos de exploração sexual na região, iniciada no dia 18 de fevereiro, questiona o CCBM e a empresa Norte Energia sobre a localização da casa de prostituição, considerando o perímetro de desapropriação da usina de Belo Monte.

Mas não é somente pela localização da “boate” que o empreendimento da Usina de Belo Monte e os seus responsáveis estão envolvidos até o pescoço com as violações de direitos na região. Diferente do propagandeado pelo Governo Federal, de que a Usina Belo Monte traria progresso e riqueza para a região, o empreendimento trouxe uma avalanche de mazelas sociais ao priorizar o lucro das empresas em detrimento do meio ambiente, dos ribeirinhos, indígenas e de toda a população local.

Os impactos e as violações vão desde os despejos da população ribeirinha, obrigados a deixarem suas casas por morarem em locais que serão alagados pela represa, a crimes ambientais, passando pelo desrespeito às leis trabalhistas e pelo aumento da violência e do uso de drogas, como crack e óxi (a apreensão de crack aumentou 900% na região de Altamira). Exploração sexual, trabalho escravo e tráfico de mulheres somam-se a estas mazelas trazidas pelo empreendimento à região.




Dilma, pare Belo Monte

O compromisso do Governo Federal com empreiteiras e grupos políticos foi o que possibilitou o aval para a construção da Usina de Belo Monte. Em nota, logo após a denúncia de tráfico humano na região, a Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH) resgata a posição do governo do PT em permitir o empreendimento custe o que custar. “Responsabilizamos o Estado Brasileiro, e em especial o Governo Federal, nas pessoas do Ex-presidente Lula e da atual presidente Dilma Roussef, por esta tragédia que se abate sobre pessoas, adultas ou adolescentes, que foram traficadas e escravizadas para exploração sexual, pois estes governantes sabiam das consequências nefastas da obra e decidiram faze-la custe o que custasse. O resultado não poderia ser outro”.

Nesta quinta-feira, 21 de fevereiro, O SDDH, o Comitê Metropolitano Xingu Vivo, o Movimento Mulheres em Luta e partidos políticos como o PSTU realizaram um ato em frente à sede do Consórcio Construtor Belo Monte (CCBM), na cidade de Belém (PA), em repúdio às constantes violações de direitos humanos em decorrência do empreendimento. O protesto exigia a paralisação imediata da construção da Usina.

A luta para que este grande empreendimento seja interrompido ganha força no país e no mundo. Organizações e movimentos sociais, trabalhadores, pesquisadores, juristas, associações científicas etc. denunciam a todo o momento a inviabilidade e a ilegalidade de Belo Monte, e exigem do governo Dilma que pare Belo Monte.


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Tráfico humano: dor, humilhação e violência contra as mulheres


Retirado do Site do PSTU

Tráfico humano: dor, humilhação e violência contra as mulheres

O tráfico de mulheres e a exploração sexual são práticas correlatas à exploração e opressão das mulheres no conjunto da sociedade



O tráfico de pessoas é o terceiro ramo mais lucrativo dos negócios ilícitos
O capitalismo dá aulas de como oprimir, como escravizar e submeter os seres humanos. Ao invés do bem-estar, da liberdade e emancipação, o que vem crescendo em todo o mundo é a exploração, a humilhação e escravização de milhões. Uma das práticas que tem crescido muito ultimamente é a formação de verdadeiras empresas capitalistas dedicadas ao tráfico internacional de mulheres. Começou com pequenas empresas fazendo grandes negócios: raptavam meninas no Sul do país e as levavam para o Norte e Nordeste onde eram escravizadas como prostitutas nos bordéis infectos que disputam o lugar com os bares no entorno dos grandes empreendimentos, como a construção de usinas. Agora, o negócio ficou mais sofisticado; rompeu as fronteiras nacionais e ganhou status internacional. Os países mais pobres da América Latina e América Central se tornaram celeiro de jovens que são enviadas para a Ásia, Europa e Estados Unidos, e nunca mais são vistas.

Violação das mais perversas contra os Direitos Humanos, o tráfico de pessoas aparece no ranking global dos negócios ilícitos como o terceiro ramo mais lucrativo do crime, perdendo apenas para o tráfico de armas e drogas. Dentre essas formas de tráfico, a maior incidência é o tráfico para exploração sexual de mulheres, também conhecido como “trata”. Considerada crime pela legislação brasileira, a trata em geral é de difícil detecção, prevenção e punição, devido em grande parte ao silêncio que impera entre os envolvidos, não raro ligados às redes de prostituição, à polícia e aos cartéis do tráfico de drogas e armas.

Talvez seja um dos negócios que mais tenha se beneficiado com a globalização da economia a partir dos anos 80. As pesquisas indicam a existência de quase 300 rotas nacionais e internacionais de tráfico de pessoas. Estima-se que por ano cerca de um milhão de jovens brasileiras, colombianas, bolivianas, equatorianas e de outros países próximos sejam traficadas e escravizadas. Nesse montante, está englobado também o tráfico para retirada de órgãos. Existem poucas pesquisas sobre o tema, as mais recentes datam do início de 2000. Em 2004, a ONU divulgou um relatório comprovando que o tráfico de seres humanos é majoritariamente administrado pelos mesmos integrantes do tráfico de entorpecentes. O relatório constata que 83% das vítimas são mulheres, 48% menores de 18 anos e apenas 4% são homens. As estimativas globais em 2005 foram de 2,4 milhões de pessoas traficadas e destes números 98% são mulheres e garotas que fazem trabalho escravo, sendo que 43% são usadas para exploração sexual comercial forçada, principalmente nas regiões da América Latina e Caribe, rendendo cifras de US$ 1,3 bilhão.

Nessa estatística macabra, o Brasil detém o vergonhoso título de campeão latino-americano na “exportação” de mulheres para a “indústria” da prostituição nos países de “primeiro mundo”. O relatório de 2010 do Departamento de Estado dos Estados Unidos cita o Brasil como "fonte de homens, mulheres, meninos e meninas para prostituição forçada no país e no exterior". O Brasil passou a fazer parte do mapa do turismo sexual por volta dos anos 80, quando o mercado asiático começou a se saturar e os países da América Latina tornaram-se os destinos mais procurados por turistas europeus e japoneses. A década de 90 consolidou o Nordeste brasileiro como paraíso do turismo sexual e dos casamentos interculturais. Daí para o tráfico de pessoas foi um pulo.

O Relatório Anual de 2009 do Observatório do Tráfico de Seres Humanos revelou que 40% das mulheres vítimas do tráfico humano em Portugal são brasileiras. Baseado em 85 casos identificados em 2009, o estudo apontou que a maioria dessas mulheres é originária de Goiás, Minas Gerais e estados do Nordeste. As mulheres são aliciadas nas regiões mais pobres do país e levadas para as regiões mais ricas. Esse é o chamado “tráfico interno”, que também é grande no sul do país, como Rio de Janeiro e São Paulo, além da rota que une o Rio Grande do Sul com os países vizinhos do Mercosul. No “tráfico externo”, São Paulo e Rio de Janeiro são as portas de saída mais utilizadas, através de seus grandes aeroportos, que chamam menos a atenção.


Empresários do crime

O tráfico de mulheres, sobretudo para o exterior, é uma operação delicada. Transportar pessoas de um lado a outro de forma ilegal, sobretudo para outros países, não é coisa que se faça sem um grande esquema de sustentação. Por isso, são montadas verdadeiras empresas que envolvem diversos “funcionários”, incluindo contatos bem localizados e da maior confiança entre si aqui e no exterior, além de grandes somas de dinheiro, inclusive para cobrir os imprevistos.

Esse esquema complexo requer que seus integrantes tenham facilidades junto às autoridades para conseguir documentos, como passaportes e certidões, e junto à polícia federal, que controla o fluxo nos aeroportos. É um esquema caro, por isso em geral é financiado com o dinheiro do tráfico de drogas.

Os agenciadores buscam suas vítimas, de preferência mulheres jovens entre 18 e 25 anos, em favelas e bairros empobrecidos, mas não é raro que também rondem as portas das escolas e faculdades de classe média, onde uma grande concentração de jovens está exposta ao consumo de bebida alcoólica e drogas, incluindo a prostituição. Essas jovens são “convidadas” a viver no exterior, com a promessa de um trabalho honesto e bem remunerado, moradia e outras facilidades. Recebem toda a documentação necessária para viajar, inclusive passaporte, passagem e um adiantamento em dinheiro. Com um discurso coerente, passam sem problemas pelos controles dos aeroportos e conseguem desembarcar igualmente sem qualquer constrangimento.

Quando chegam ao destino descobrem que caíram numa armadilha. São mantidas trancafiadas em cárceres privados e obrigadas a trabalhar em casas de prostituição em regime de trabalho escravo, que não termina nunca porque elas têm de pagar suas “dívidas” com passagens e documentação. Vivem sob constantes ameaças, inclusive de verem suas famílias vitimadas caso tentem fugir ou fazer qualquer denúncia contra as organizações criminosas. No exterior, elas são vistas como imigrantes, com toda a carga de preconceito que recai sobre esse setor da população; o desconhecimento do idioma e das leis do país agrava enormemente sua condição.

Encontrar essas mulheres, conhecer seu paradeiro e as condições de vida a que estão submetidas não é fácil; quase sempre são mantidas incomunicáveis e impotentes para tomar qualquer atitude, deixando as famílias em desespero. Com o tempo, acabam entrando para o cadastro de pessoas desaparecidas e nunca mais se tem notícia delas.


Muitas leis, poucas ações

A polícia e as autoridades, o Estado em suma, alegam ter muitas dificuldades para conseguir exercer uma investigação a fundo contra o tráfico de mulheres, a libertação delas e a prisão dos culpados. Mas o fato concreto é que muitas vezes quem está por trás do negócio são empresários milionários ou mesmo políticos, que são acobertados pelas autoridades. Além disso, as leis não são cumpridas. A prostituição e a “trata” são questões exaustivamente abordadas e condenadas pela legislação internacional e nacional. O Brasil é aderente à Convenção para Eliminação de todas as formas de Discriminação Contra as Mulheres, assinada pela ONU em 1979.

O Congresso Nacional aprovou em 2003, por meio da resolução 231, um protocolo contra o crime organizado e o tráfico de pessoas, reconhecendo a necessidade de proteção global e internacional dos direitos fundamentais internacionalmente reconhecidos, para as mulheres brasileiras. Além disso, o tráfico internacional de pessoas para fins de exploração sexual, bem como o tráfico interno, são previstos no Código Penal Brasileiro, em seu artigo 231, com pena de reclusão de 2 a 6 anos.

No entanto, o tráfico vem aumentando a cada dia, sem que o Estado se empenhe a fundo em reprimir esse tipo de crime. Para que a Polícia Federal e o Ministério do Exterior se mexam é preciso aparecer algum caso chamativo na imprensa ou alguém fazer alguma denúncia que apareça na televisão, como na novela da Rede Globo que recentemente divulgou a denúncia de uma mulher cuja filha havia sido traficada para a Espanha. Ela e outras jovens eram mantidas em cativeiro dentro de uma casa de prostituição, sem poder sair ou se comunicar com o mundo exterior. O caso tomou tamanha repercussão que a polícia espanhola foi forçada a ir até o local para libertar as jovens.

Esse caso foi uma exceção. Em geral, as famílias não têm condições de investigar por conta própria. À sua impotência soma-se a inércia das autoridades competentes, além do preconceito que ronda as mulheres. Não é incomum elas serem acusadas de mentirosas e terem saído do país por livre e espontânea vontade, sem consciência do que as esperava no exterior. Assim, não são consideradas vítimas, mas coparticipantes do processo, já que deram seu consentimento e muitas vezes chegaram inclusive a assinar documentos autorizando a viagem.

Some-se a isso o fato de o Código Penal não estabelecer a diferença entre prostituição forçada e voluntária; isso depende da interpretação da polícia, do ministério público e do judiciário. Tanto uma quanto a outra não são criminalizadas, deixando assim os aliciadores com as mãos livres. Existe ainda o agravante de que a lei não considera o tráfico como trabalho escravo, o que poderia assegurar a prisão dos criminosos.


A relação com a prostituição

A relação entre o tráfico de pessoas e a prostituição é direta. De acordo com o Relatório do Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, publicado em 2010 e coordenado pela Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério da Justiça, as mulheres, crianças, adolescentes e travestis já envolvidos de alguma maneira com o ambiente da prostituição são os principais alvos do crime de tráfico de pessoas, quando a prática tem por fim a exploração sexual.

As vítimas têm em comum o fato de serem, em sua maioria, pessoas jovens, de baixa renda, pouca escolaridade, sem oportunidade nem perspectiva de melhoria de vida e provenientes de lugares e de regiões pobres. Na ausência de ampla qualificação e pleno emprego, esses são, portanto, os setores da população mais carentes e em situação de desamparo.

Um estudo feito para o Ministério da Justiça em 2003 pergunta: “por que mulheres (adultas e adolescentes) são aliciadas para fins sexuais? A resposta está na razão direta da precarização de sua força de trabalho e da construção social de sua subalternidade. No Brasil, o tráfico para fins de exploração sexual comercial, é predominantemente de mulheres e adolescentes negras, sendo que a faixa etária de maior incidência é de 22 a 24 anos e de 15 a 17 anos, respectivamente. Geralmente, são oriundas de classes populares, apresentam baixa escolaridade, habitam em espaços urbanos periféricos com carência de saneamento, transporte (dentre outros bens sociais comunitários), moram com algum familiar e têm filhos. [...] Sobre as condições de vida das mulheres/adolescentes, antes de serem aliciadas pelos traficantes, a maioria provém de municípios de baixo desenvolvimento socioeconômico, situados no interior do País. Dentre as que vivem em capitais ou em municípios localizados nas regiões metropolitanas, a grande maioria mora em bairros e áreas suburbanas ou periféricas”. (Leal e Leal, 2003)

O mesmo estudo mostra que as mulheres mais sujeitas ao tráfico humano são aquelas que “já sofreram algum tipo de violência intrafamiliar (abuso sexual, estupro, sedução, atentado violento ao pudor, abandono, negligência, maus tratos, dentre outros) e extrafamiliar (os mesmos e outros tipos de violência em escolas, abrigos, em redes de exploração sexual e outros tipos de relações); as famílias também apresentam quadros situacionais difíceis (violência social, interpessoal e estrutural) vulneráveis frente à fragilidade das redes protetoras (família/estado/sociedade)”.

Em 2011, um grupo de formandas em Serviço Social de São Paulo fez um amplo estudo sobre o tema, relacionando diretamente o tráfico de seres humanos com a prostituição e exploração sexual de mulheres. O estudo de Rosineide Silva, Roberta de Moraes e Alessandra Matricaldi traz uma série de depoimentos de mulheres que viajavam para fora do país na esperança de conseguir um emprego e uma vida melhor, e acabaram vítimas da exploração sexual. Essa realidade demonstra cabalmente como a opressão das mulheres na sociedade capitalista, a situação de inferioridade em que são colocadas em todos os âmbitos, favorece esse tipo de crime. Alguns desses depoimentos foram colhidos junto ao Posto de Atendimento aos Migrantes que funciona no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, desde 2006.

A maioria das mulheres relata que ao chegar ao país de destino sentiram-se discriminadas por funcionários de migração e pelos cidadãos estrangeiros, relacionando-as a prostitutas e sentiram na pele o abuso de autoridade quando argumentavam que não tinham dinheiro e não sabiam falar o idioma. A maioria das mulheres atendidas viajava sem a certeza de conseguir um emprego, formal ou informal, contando apenas com algum parente ou amigo que, possivelmente, poderia lhe arrumar um emprego no país de destino. Uma das mulheres relatou que foi agredida fisicamente por policiais da imigração espanhola, por ocasião de sua estadia no centro de imigração em Valença/Espanha. Conta que um policial tentou acariciá-la e foi repelido; como represália, ele a espancou usando um cassetete de ferro, desferindo-lhe golpes nas nádegas enquanto outro policial a segurava pelos cabelos.

Ao narrar suas histórias de vida, apontam para diferentes motivações para a migração, desde o desejo de não mais morar na zona rural até para fugir de um marido ou um pai violento. Muitas contam que foram abusadas, intimidadas, ameaçadas, perseguidas e tiveram seus passaportes confiscados. Viviam em cárcere privado e eram obrigadas a se prostituir, só recebiam um preservativo por dia e eram vigiadas o tempo todo. Com medo de prejudicar a família, procuravam não se rebelar; para poder comer, tinham que ficar com mais de um homem por noite. Só saiam para ir ao cabeleireiro, lojas e mercados, já que precisavam se cuidar, mas sempre escoltadas e não tinham permissão de fazer ligações para os familiares. As que viveram esta situação relatam que só conseguiram voltar porque pagaram pela sua liberdade e outras por terem conseguido ajuda para fugir.

O tráfico de mulheres e a exploração sexual são práticas correlatas à exploração e opressão das mulheres no conjunto da sociedade. As mulheres são vistas como mercadoria, como objetos sexuais e propriedade privada, que podem ser vendidas e traficadas ao bel prazer dos ricos. Inclusive muitos grandes burgueses, empresários e banqueiros participam dessas atividades ilícitas, e ganham milhões de dólares com isso. A prostituição em larga escala, como instituição do Estado burguês, também é uma violência desmedida contra as mulheres. Trata-se de um grande negócio, onde as maiores vítimas são as próprias mulheres, que se vêem presas a essa prática, sem forma de livrar-se de um sistema que muitas vezes também as envolvem no consumo de drogas. Sem emprego digno, sem educação de boa qualidade, sem perspectiva de um futuro de felicidade e plenitude, a grande maioria dessas mulheres não tem outra saída que entregar-se à prostituição como forma de ganhar a vida. Essa situação crítica de vida também é aquela que permite o tráfico de mulheres, já que muitas delas têm a ilusão de conseguir em outro país um emprego e uma vida melhor para sua família, mas a realidade cruel tem nos mostrado que esse é um caminho sem volta.

Um sistema assentado na exploração econômica de milhões de seres humanos não poderia produzir outra coisa. Conforme o capitalismo avança, a situação tende a ficar cada vez pior. A degeneração dos seres humanos, os trabalhos vis e humilhantes, a destruição dos vínculos de família sem que o Estado os substitua por outra realidade criam um mundo de dor, onde o único que avança é o egoísmo, o individualismo, o “salve-se quem puder”. E os setores mais oprimidos, como os jovens, as mulheres, em especial, as pobres e negras, os imigrantes, são as maiores vítimas.


Retirado do Site do PSTU

Quem tem medo de Yoani Sánchez?

É necessário um real debate sobre o que se passa em Cuba e o verdadeiro caráter do regime castrista


Agência Brasil
A blogueira cubana Yoani Sánchez
Desde o dia em que aterrissou no Brasil, a blogueira cubana Yoani Sánchez vem enfrentando protestos de militantes pró-regime castrista. Em Feira de Santana (BA), chegaram a impedir a exibição do documentário "Conexão Cuba-Honduras" que tem a blogueira como uma das entrevistadas. Além de defender o governo cubano, essas manifestações impulsionadas pela UJS/PCdoB e outros setores, atacam Yoani como "agente da CIA", supostamente bancada pelo imperialismo com o objetivo de desestabilizar Cuba.

Esses protestos mostram parte do respaldo que o regime cubano ainda encontra em vários setores da esquerda. Outros setores, no entanto, como o PSTU, não integram nem apoiam essas manifestações. E mais ainda, defendem a necessidade de se abrir uma real discussão sobre Cuba e o que representa o governo encabeçado pelos irmãos Castro. É esse o debate que os manifestantes que perseguem Yoani querem impedir que aconteça.


Cuba em debate

O que é Cuba hoje? Um bastião do socialismo que sobreviveu ao débâcle do chamado “socialismo real” na década de 1990, ou um país capitalista com uma ditadura que se perpetua graças à repressão e perseguição aos seus opositores? Por que essa discussão desperta tantas paixões em todo o mundo? A primeira resposta certamente é que, quando falamos de Cuba, estamos nos referindo a um país que foi palco de uma das mais importantes revoluções do século XX.

O regime castrista goza ainda da autoridade política e do prestígio conquistados com a revolução que, em 1959, depôs a ditadura de Fulgêncio Batista e pouco depois expropriou a burguesia. A primeira e única revolução socialista da América Latina transformou a pequena ilha do caribe do "quintal dos EUA" como era conhecido, em um país com índices sociais comparáveis aos dos países desenvolvidos. A reforma agrária e investimentos maciços nas áreas sociais extinguiram pragas do capitalismo como a miséria, o desemprego e o analfabetismo. Não foi por menos que Cuba se tornou em um exemplo para gerações de ativistas socialistas ao redor do mundo.

Cuba, porém, não é só um exemplo do que é possível avançar ao se expropriar a burguesia e o imperialismo. É uma prova também de que, tudo o que não avança, retrocede. No caso, o país, governado por uma burocracia estalinista desde o início, viu o capitalismo ser restaurado pelas mãos do próprio setor que dirigiu a revolução. Os três pilares de uma economia de transição ao socialismo hoje já não existem: o monopólio do comércio exterior, a propriedade estatal e o planejamento econômico pelo Estado.

A restauração do capitalismo imposta pela ditadura Castro principalmente a partir dos anos 1990, levou de volta à ilha velhos problemas sociais, como uma desigualdade cada vez maior, pobreza e antigas chagas do capitalismo que haviam desaparecido, como a prostituição que se prolifera nas áreas frequentadas pelos turistas estrangeiros. Em Havana, regiões ricas e sofisticadas dedicadas ao turismo e à burocracia castrista convivem ao lado de áreas pobres e literalmente caindo aos pedaços. Já os trabalhadores são obrigados a sobreviverem com um salário médio de 18 a 20 dólares por mês.

Em 2011, o governo anunciou a demissão de nada menos que um milhão e trezentos mil trabalhadores das estatais no país, como forma de se "reduzir" o peso do setor público. A dura verdade, que os defensores do regime castrista se negam a reconhecer, é que o capitalismo há muito é uma realidade em Cuba, assim como os demais males inerentes de uma sociedade capitalista. Confundem e transformam em uma só coisa a revolução cubana e a burocracia castrista.

O que restou no país, além do capitalismo, foi o controle de uma ditadura de partido único, que não permite qualquer liberdade de expressão e organização. Quando os militantes da UJS/PCdoB impedem Yoani Sánchez de falar ou qualquer debate sobre o tema, estão tentando bloquear aqui no Brasil esse mesmo debate que não pode ser feito em Cuba. Se não concordam que existe hoje uma ditadura, por que não argumentam e apresentam seu ponto de vista? Lamentavelmente, é essa a discussão que tanto temem esses ativistas. Mais do que qualquer suposto agente da CIA.


Yoani e as liberdades democráticas

Mas quem é essa figura chamada de “terrorista” pelos defensores do castrismo? Yoani Sanchez é filóloga e se tornou conhecida quando, em 2007, passou a publicar o blog "Geração Y", com fortes críticas ao regime cubano. Passou a denunciar perseguições e intimidações do governo e a ganhar notoriedade em grandes veículos de comunicação mundo afora. É colunista, por exemplo, do espanhol El Pais e, no Brasil, tem seus posts publicados pelo Estadão. Antes da reforma migratória, teve seu visto de saída negado 20 vezes pelas autoridades cubanas.

A esquerda castrista acusa Yoani de ser uma “agente do imperialismo”, guiada pela CIA e o próprio governo norte-americano. Para embasar tal tese, citam, por exemplo, os prêmios que a blogueira recebeu de veículos da imprensa internacional e documentos vazados pelo Wikileaks que relatariam reuniões da cubana com representantes do governo dos Estados Unidos. Em seu périplo pelo Brasil, a blogueira criticou a posição do governo brasileiro em relação aos Direitos Humanos em Cuba, condenou o embargo norte-americano à ilha e chegou a elogiar as últimas medidas do governo Castro: “as reformas econômicas que tem feito estão na direção correta”.


Protesto contra a blogueira cubana no Brasil

Suposições sobre suas reais motivações à parte, fato é que a blogueira faz uma crítica correta a partir de um fato concreto: a ausência de liberdade de expressão e organização em seu país. Ou os defensores do castrismo também dirão que vigora a democracia na ilha? Seria possível, por exemplo, organizar um partido que se coloca como oposição à burocracia castrista, como o PSTU, em Cuba? Ou como o PSOL? Ou qualquer partido ou organização sindical que tenha como objetivo organizar os trabalhadores e o povo de forma independente do governo? Sabemos muito bem que não.

O mais perverso dessa história é que a ausência de liberdades na ilha faz com que a única oposição à burocracia castrista que aparece como alternativa ao povo cubano seja composto pela direita e os gusanos (os exilados da revolução que se refugiaram na Flórida e que desejam reaver suas propriedades expropriadas). Ou Yoani que, apesar de corretamente reivindicar a democracia em seu país, tem como horizonte político um regime democrático burguês (por isso elogia as recentes medidas do governo).

A infeliz posição da esquerda castrista no Brasil, por sua vez, tem seu grau de responsabilidade, ao entregar de bandeja à direita a bandeira por liberdades democráticas em Cuba. É patético observar, por exemplo, o deputado Jair Bolsonaro, defensor da ditadura militar no Brasil, condenar a ditadura cubana.

O castrismo é responsável ainda por reforçar um estereótipo de socialismo associado a caricaturas totalitárias, como a China ou Coreia da Norte. O socialismo deveria não só aceitar como estimular debates e opiniões diversas. Deveria contrapor-se ao capitalismo e ao monopólio de seus grandes conglomerados de mídia com a mais ampla liberdade de expressão e crítica.

Já é hora de a esquerda identificada com o castrismo desfazer-se de seu arsenal de calúnias e acusações estalinistas e debater essas questões de forma franca, com ideias e argumentos.


Retirado do Site do PSTU

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Exigimos punição aos integrantes da Banda New Hit

Integrantes da banda são acusados de estuprar coletivamente duas jovens após show no ano passado



Os estupradores ficaram presos durante 38 dias, mas conseguiram um habeas corpus
Foi adiado para setembro o julgamento dos integrantes da Banda New Hit, acusados de estuprar coletivamente duas adolescentes em agosto do ano passado. Embora os laudos periciais comprovem a brutal violência sofrida pelas jovens, os agressores alegam ter havido consentimento.

A estratégia de defesa adotada pelos advogados dos integrantes, vitimizá-los e responsabilizar as garotas, tem grande apelo e se alicerça na cultura do estupro que impera no país. A nossa sociedade não somente naturaliza e tolera como incentiva a prática do estupro e a violência contra a mulher. Amplamente comercializada, a cultura do estupro comumente se traveste em humor, música e propagandas de cerveja. Incita os homens à prática do sexo forçado e rouba das mulheres o direito de decidirem sobre os seus corpos. Reforça e se apoia no senso comum de que, nesse caso, a culpa é sempre da vítima.

Nada mais hipócrita. As duas adolescentes violentadas pelos integrantes da banda New Hit tiveram que mudar de escola e endereço e se tornaram alvos de constantes ameaças. Os agressores, no entanto, receberam convites para novos shows. O caso ainda foi qualificado como positivo pelo empresário da banda por tê-la tornado conhecida. E assim invertem-se os papéis: confinamento para as vítimas, liberdade em grande estilo aos agressores.

A banda New Hit ficou conhecida por suas letras repugnantes que entoam a ideologia machista de que as mulheres devem ser objetos do prazer masculino, submissas e sem vontade própria. Depois da agressão coletiva, porém, o grupo teve de amargar uma faceta das mulheres que as suas letras escondem: a força, capacidade de organização e a luta incansável pelo direito de decidirem por seus corpos. Não à toa tiveram vários shows cancelados, perderam patrocínio importante e, por cada cidade por onde passaram, foram perseguidos por atos e manifestações de repúdio.

É necessário que os movimentos sociais envolvidos na luta por punição aos integrantes da banda cobrem dos governos, em especial da presidente Dilma, uma política firme de combate ao machismo que passe pela tolerância zero aos casos de violência e que puna todos os agressores.

No governo de uma mulher, nenhuma mulher deve ser vítima da violência machista acobertada pela impunidade.

Diante dos alarmantes índices de violência sexual, a condenação desses agressores representa, a todas nós, um suspiro.

As vítimas não podem mais esperar! A violência contra uma mulher, fere todas. Somos solidárias às jovens e exigimos punição aos agressores.

O PSTU exige celeridade no julgamento e defende a punição de todos os envolvidos no caso. Lugar de machista agressor é na cadeia.


Leia também:

Integrantes da Banda New Hit continuam alvo de protestos



Retirado do Site do PSTU

Operários do Comperj votam acordo, mas patronal se nega a pagar e a greve continua

Greve começou no dia 8 de fevereiro e exige reajuste salarial e melhorias nas condições de trabalho


Na última terça-feira (dia 19), os operários do Comperj, em assembleia lotada, aprovaram o final da greve, iniciada no dia 8 de fevereiro, após ouvir nova proposta apresentada.

A proposta de acordo salarial, que deveria ser assinado pelo sindicato e a patronal, se aproximava das reivindicações dos trabalhadores no início da greve e tem conquistas como 10% de aumento salarial, o pagamento diário de 30 minutos de horas “in tinere`s” (que corresponde a 5% de aumento no salário), aumento no vale refeição de R$ 300,00 para R$360,00 (sendo o mês de março no valor de R$720) e a garantia do pagamento da PLR até o próximo dia 22, além de conquistar o abono dos dias de greve.

Porém, no dia seguinte, os trabalhadores foram pegos de surpresa pela patronal que dizia não aceitar uma parte do acordo votado. No mesmo dia pela manhã, uma parte significativa das empresas já estava parada novamente e a tarde não havia mais ninguém trabalhando.

O sindicato cutista foi à porta das empresas, com panfleto em mãos, dizendo que o acordo havia sido assinado e pedindo ao trabalhador que retornasse ao trabalho, sem sucesso. Os trabalhadores do Comperj continuam em greve até a gerência se posicionar.

O PSTU e a CSP Conlutas seguem firmes ao lado dos trabalhadores nessa luta. Sem acordo assinado é canteiro parado!

Na próxima segunda-feira, está marcado assembleia da categoria para decidir os rumos da greve.


Retirado do Site do PSTU

terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

O “Oriente Médio” e a Revolução Permanente


Egito: protestos contrários ao presidente Mursi dois anos após as revoltas que derrubaram Mubarak
Entre 1905 e 1906, o jovem revolucionário Leon Trotsky, sob o impacto da Revolução de 1905, formulou as bases de sua conhecida Teoria da Revolução Permanente. Nesse período, o pensamento hegemônico no marxismo russo se apegava à ideia de que a Rússia deveria, primeiramente, passar por uma revolução burguesa e consolidar o Estado democrático-burguês para, só então, pensar em uma revolução socialista. Essa ideia tinha implicações práticas, uma vez que se desdobrava no apoio e na submissão política dos socialistas frente aos liberais.

A partir de uma análise da formação histórica e econômica do Império Russo, Trotsky se colocou diametralmente contra esse paradigma. Para ele, a débil burguesia russa nasceu e se desenvolveu sob o patrocínio da autocracia czarista e, dessa forma, não constituía uma força revolucionária tal qual a burguesia francesa, por exemplo. Por outro lado, apesar de o proletariado russo constituir uma minoria em relação à população absoluta, a concentração industrial e o porte das indústrias possibilitaram a formação de um proletariado altamente combativo e revolucionário.

Assim, para Trotsky, a Rússia não precisaria necessariamente passar pelo período de consolidação burguesa, como pregavam os mencheviques por exemplo. Não precisaria e não poderia, uma vez que a burguesia russa seria “por natureza” reacionária. Trotsky rompeu com o menchevismo justamente nesse ponto, ou seja, ao propor que a revolução na Rússia deveria ser permanente, passando da fase burguesa ininterruptamente para a fase socialista. Dessa forma, mesmo as “conquistas tipicamente burguesas”, como liberdades civis e políticas, deveriam ser levadas sob a liderança do proletariado. Uma vez no poder, esse proletariado não trabalharia no sentido de manter sua própria exploração, ao contrário, iniciaria a fase socialista da revolução, expropriando os meios de produção e colocando-os sob seu controle.

As atuais revoluções no Oriente Médio[1], que ficaram conhecidas como a “Primavera Árabe”, revelam um forte descontentamento com os regimes políticos autoritários e opressores, que por muito tempo conseguiram conter pela força das armas os anseios populares. Na Síria, uma verdadeira Guerra Civil colocou o povo e diversas lideranças tribais em armas contra o regime de Bashar Al-Assad. Na Líbia, o descontentamento popular culminou na derrubada do governo do fossilizado Khadafi. No Irã, apesar de contida pela repressão, a insatisfação não é menor e isso ficou evidente na última eleição de Mahmoud Ahmadinejad. Iêmen, Tunísia etc. A revolução bate as portas. Mas, o caso mais emblemático, parece ser o Egípcio.

No Egito, apesar da derrubada do presidente Hosni Mubarak, as massas não abandonaram “a praça”, mostrando claramente sua insatisfação com as reformas na superfície política, com o poder que ainda desfruta o exército e com as condições sociais que esmagam o povo. O atual governo da Irmandade Muçulmana, presidido por Mohamed Morsi, tenta calar com a força das baionetas os gritos de “pão, liberdade e justiça social” que ecoa nas ruas. Nessa perspectiva, o Egito é um forte indicativo de que a luta do “povo árabe” por democracia é apenas a ponta do iceberg. A insatisfação é bem mais profunda e a “Primavera árabe” talvez não se detenha em sua fase de construção da democracia burguesa.

Líbia, Síria, Egito Irã, Iêmen, enfim, o que aqui chamamos de Oriente Médio são países caracterizados por economias extremamente dependentes do petróleo e com um proletariado relativamente especializado. Contam também, esses países, com importantes concentrações urbanas. A insatisfação com os regimes autoritários é agravada, ou mesmo despertada, pela péssima divisão da renda do petróleo. Nesse sentido, as contradições sociais parecem profundas demais e talvez não se resolvam com doses homeopáticas de liberdade política. Assim, estaria o “Oriente Médio” condenado a seguir o caminho das democracias ocidentais? A revolução política será inexoravelmente contida na democracia burguesa? Ou ao contrário, o desenvolvimento econômico e social dessa região pode abrir a possibilidade para uma nova e mais profunda forma de democracia, a democracia social pela revolução socialista?

A essas perguntas, só o tempo responderá. E se, por um lado, o porvir ainda não está escrito e comporta uma série de caminhos e possibilidades, uma lição a História ensina: as revoluções são eventos “abertos”, que tornam inevitável o que antes parecia impossível.


[1] O conceito “Oriente Médio” utilizado aqui não é um conceito geográfico, como fica evidente. Sob esse termo refiro-me aos países tanto da Península Arábica como aos do norte da África. O que justifica tal generalização são algumas importantes semelhanças, como por exemplo, o fato de esses países sustentarem suas economias com a exploração do petróleo e seus derivados; a péssima distribuição da renda desse recurso natural; governos autoritários e no plano cultural o islamismo.


Retirado do Site do PSTU