Uma polêmica com a ultraesquerda stalinizada
Na Universidade de São Paulo (USP), Brasil, estamos assistindo a acontecimentos tão impactantes como repudiáveis, cujas repercussões não só transcenderam os limites da universidade, como também adquiriram relevância internacional.
Desde o mês de setembro deste ano, o reitor dessa instituição, João Grandino Rodas, assinou um convênio que estabelece a presença permanente da Polícia Militar (PM) no campus da USP, com o argumento de que esta medida garantiria uma “maior segurança” à comunidade acadêmica1. Esta iniciativa altamente reacionária, que viola de forma flagrante o princípio da autonomia universitária, em pouco mais de dois meses começou a mostrar seus verdadeiros objetivos, que não têm nada a ver com a “proteção” dos estudantes, professores ou trabalhadores da USP, ou algo similar, mas sim com a repressão e intimidação do movimento estudantil e sindical dentro da instituição.
Isto ficou evidente, ante o assombro de muitos, quando, na madrugada do dia 8 de novembro, cerca de 400 policiais da tropa de choque da PM, apoiados em seu operativo pela cavalaria, veículos blindados e helicópteros, invadiram o prédio da USP para desalojar, de forma violenta e brutal, um grupo de estudantes que ocupava a sede da reitoria havia alguns dias. O saldo desta ação de guerra contra o movimento estudantil e social foi de 73 companheiras e companheiros presos e processados criminalmente. A PM atuou cumprindo uma ordem judicial que, por sua vez, foi impulsionada pelo próprio reitor Rodas.
Aqui não há relâmpago em céu azul. Esses fatos vergonhosos são parte de todo um processo consciente de militarização da USP, que é encabeçado pelo próprio Rodas, um fiel servidor do governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, do direitista PSDB. O projeto de militarizar a USP, instaurando um regime “macarthista” em seu seio, isto é, uma situação de perseguição permanente, reacionária e paranoica da esquerda ou de qualquer tipo de oposição à ordem estabelecida, responde a um projeto mais global. Esse projeto consiste em consumar a privatização–elitização das universidades brasileiras, colocando-as – ainda mais – a serviço dos interesses das multinacionais e do mercado. Como condição para concretizar esta estratégia, a burguesia brasileira e seus representantes políticos sabem perfeitamente que devem acabar com qualquer resistência que possa vir do movimento estudantil ou dos demais setores do movimento social. Descabeçar e desmantelar nossas organizações é, para eles, tarefa de primeira ordem. Eis o motivo da importância política de militarizar e liquidar a autonomia universitária na USP e nas demais universidades.
Diante dos perigos concretos desta ofensiva, é que a luta contra a militarização na USP – cujos objetivos, para o PSTU e a LIT, concretizam-se nas palavras de ordem de: !Fora PM! !Fora Rodas! !Pelo arquivamento imediato do processo contra os 73 estudantes que foram presos! !Por um projeto alternativo de segurança para a comunidade acadêmica da USP! – é, atualmente, parte fundamental da luta mais geral por uma educação pública, gratuita, autônoma e de qualidade. Estamos diante de uma luta de vital importância em defesa de liberdades democráticas elementares, sem as quais será impossível frear o processo de destruição da universidade pública, impulsionado pelo governo federal chefiado pela petista Dilma Rousseff.
Leon Trotsky dizia que “a estratégia sem sua correspondente tática será sempre uma abstração teórica inerte”2. Se concordamos nesses objetivos gerais, torna-se indispensável, para avançar, pesar as diferentes políticas, táticas, métodos e propostas de ação que as diferentes correntes dentro do movimento estudantil têm defendido até agora. Nesse sentido, existe uma polêmica com as correntes ultraesquerdistas que atuam na USP e que ganhou importância com o desenvolvimento do conflito.
Referimo-nos, concretamente, à chamada Liga Estratégia Revolucionária (LER–QI), ligada ao PTS argentino. Desde o início da luta, essa organização defendeu ações que, ao não corresponder com a correlação de forças entre o movimento estudantil e nossos inimigos, não passaram de meras aventuras irresponsáveis que colocaram em risco a luta dos estudantes. Para piorar, impulsionaram tudo isso com métodos burocráticos e apelando a calúnias da pior espécie stalinista contra o PSTU e outras correntes com as que não concordam politicamente. O debate, pelo que está em jogo, é inevitável. Para iniciá-lo, é necessário ir primeiro aos fatos.
Como as coisas aconteceram?
A crise atual começou no dia 27 de outubro quando, no contexto do reacionário convênio Rodas–PM, a polícia tentou prender três estudantes por suposta posse de maconha. Nesse momento, um setor dos estudantes reagiu e, protegendo seus companheiros da arbitrariedade policial, conseguiu expulsar os policiais do local. Foi uma vitória importante dos estudantes, que abria uma situação favorável para colocar com mais força o debate sobre a presença policial na USP, ampliando o espaço para organizar uma forte campanha contra isso. No entanto, sem maiores reflexões, a LER e outros setores afins à sua política e concepções arrebatadamente propuseram, de imediato, a ocupação da sede administrativa da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). Os militantes do PSTU, naquele momento, propuseram outro tipo de medidas como atos, marchas e debates no âmbito de uma campanha com o objetivo de ganhar importantes setores da massa estudantil para esta causa democrática. No entanto, a assembleia decidiu ocupar e, apesar de o PSTU não achar que as condições estivessem dadas para essa medida, acatou a decisão dessa instância e participou ativamente da ocupação.
É um fato que aquela ocupação da FFLCH nasceu isolada e debilitada, tanto na USP como para a opinião pública. Foi então que, em outra assembleia, realizada em 1º de novembro, o tema foi discutido democraticamente por mais de mil estudantes e, por uma maioria de 559 contra 458, votou-se pela desocupação dessa faculdade. Depois do horário máximo marcado pela assembleia e a declaração de seu final, um grupo de estudantes, encabeçado pela LER, resolveu ocupar outro prédio da USP, desta vez a própria reitoria. Esta ocupação, decidida pelas costas das instâncias deliberativas e resolutivas legítimas dos estudantes, não só permaneceu isolada como também dividiu o movimento estudantil. A reitoria, de maneira totalmente antidemocrática e autoritária, convocou novamente a PM para efetuar a desocupação violenta, em que foram presos e processados 73 estudantes.
Democracia “para os que lutam” ou democracia em que a base decide?
Sabemos que, em política, nada é por acaso. Tudo tem um porquê de fundo. As questões “táticas” de uma organização sempre estão ligadas a sua estratégia e concepções gerais.
Essa forma de atuar nos conflitos, isto é, a política e a metodologia da LER–PTS tem por trás toda uma concepção teórico-ideológica que eles passaram a chamar de “democracia para os que lutam”. Este esquema propõe, basicamente, que as decisões sobre os rumos do movimento devem ser tomadas somente pelos ativistas que estejam dispostos a lutar ou, utilizando as palavras de uma curiosa “nota militar” da LER, por aqueles cujo centro é “o combate, a reflexão e a vontade de agir para vencer”3, aqueles que têm “moral para o combate”. Assim, a decisão do que é melhor para uma determinada luta não corresponde às massas, à base do movimento, mas somente àqueles que tenham a “obstinada vontade na linha de frente dos combates”4.
Esses fraseólogos ultraesquerdistas profissionais atuam com um critério já assinalado por Trotsky: “Para o sectário, a vida social é uma grande escola e ele, seu professor”5. Por serem inimigos irreconciliáveis da dialética (não nas palavras, em que ninguém ganha deles, mas na ação), método que para Trotsky “sempre toma a experiência como ponto de partida para depois voltar a ela”, aplicam um método formal e iluminista, nunca isento de arrogância, típico da intelectualidade pequeno-burguesa radicalizada.
Esta armação teórica leva-os, evidentemente, a desrespeitar burocraticamente as decisões das assembleias legitimamente constituídas dentro do movimento de massas. Como a democracia é “para os que lutam” e não para as massas, nossos brilhantes estrategistas só participam e acatam as decisões das assembleias quando estas coincidem com sua política e suas propostas de ação. Foi assim que, na USP, ao defender a importância do comando de greve que se constituiu (que é correto), começaram a questionar a legitimidade do DCE7 como entidade de massas, como instância legítima dos estudantes (um erro grave, típico de todo ultraesquerdista ou do anarquismo). Nós temos muitas críticas à atual direção do DCE da USP, nas mãos de correntes ligadas ao PSOL, mas isso nunca nos pode levar a questionar o DCE como entidade representativa dos estudantes. Uma coisa é questionar a direção política de um sindicato, outra muito diferente é, por causa de sua direção, negar a legitimidade do sindicato como tal. A LER expressa este erro de concepção de forma clara em sua já citada “nota militar”: “Este organismo [o comando de greve] é o que permitirá, como uma assembleia das assembleias, sua evolução democrática e radical [do movimento]. Duas democracias começam a se chocar. A formal por fora da luta de classes, a da eleição das entidades como o DCE, e a democracia dos que lutam, da representação dos mobilizados, das assembleias, (...) das ocupações”8. Ou seja, o DCE seria algo “por fora da luta de classes” e nesse espaço se exerceria uma “democracia formal”, enquanto o comando de greve, onde estariam somente “os que lutam”, longe de estar submetido às decisões da assembleia geral (onde a base estudantil deve mandar), estaria acima delas, ao se converter em uma “assembleia das assembleias”.
Essa lógica não responde à principal necessidade do movimento neste momento, que é construir uma ampla unidade de todos os setores, no âmbito de uma forte campanha democrática contra a reitoria e a PM. Somente com um movimento forte e unificado será possível conquistar a vitória. A LER se nega a construir esse movimento, assim como se nega a reconhecer as entidades históricas e legítimas do movimento estudantil. Desse modo, não atua no sentido desta grande tarefa.
Estamos perante outra concepção de movimento e de democracia operária. O objetivo deixou de ser fazer política para as massas, para centrar-nos exclusivamente na vanguarda mais radicalizada. Coerentes com esta concepção, definem assim seus objetivos: “Nossa tarefa é formar uma corrente de milhares em todo o país que seja a voz daqueles que estão fora da universidade. Que encare cada luta sua como parte da luta geral dos trabalhadores e do povo contra a burguesia. Para isso, precisamos ser os mais consequentes defensores e implantadores da democracia dos que lutam, desta nova forma de construir uma direção do movimento que começa a ser realizada na USP, o comando de delegados de assembleias de curso”9. Nós estamos completamente a favor de ter sido conformado um comando de greve e nos jogamos com tudo para fortalecê-lo, pois é um espaço democrático e necessário para organizar e centralizar a luta. Dito isso, devemos ser categóricos em defender que todo comando deve ser submetido à base do sindicato, não pode estar “por fora” das decisões dos estudantes, pois, se fosse assim, de democrática esta instância passaria a ser burocrática. Nunca um “comando”, do tipo que for e por mais indispensável que seja para qualquer luta, pode ser superior ou substituir as assembleias de base. Desta “nova forma de construir uma direção do movimento”, altamente elitista, a única direção que pode surgir é uma que seja profundamente burocrática.
Tal é a concepção da LER. Eles sustentam que as assembleias são espaços de tipo “parlamentares”, que só “servem para pressionar por negociações com a reitoria”. Por isso, “o comando de greve não pode ser meramente um organismo executivo das resoluções da assembleia geral”. Se o comando de greve não é uma instância que está subordinada e executa as decisões da assembleia geral de todos os estudantes, significa que, para a LER, aquele espaço está acima desta máxima e soberana instância. Para nossos mestres de “democracia” sindical, o comando de greve não só estaria acima das assembleias gerais, mas também das próprias assembleias de curso. Afirmam que “os mandatos dos delegados não devem ser imperativos (quando os delegados só podem votar exatamente sobre o que já foi votado em sua assembleia de curso), pois senão (…) os delegados de um curso podem expressar somente as posições majoritárias do mesmo (...)”10. Perguntamo-nos: se os delegados ao comando de greve não devem estar submetidos a mandatos imperativos de suas bases (assembleias de curso) e não devem ser obrigados a defender as “posições majoritárias” dessas assembleias, então quem eles representam? Seriam delegados de quem? Suas propostas responderiam a quem ou ao quê? Esses delegados – quiçá porque têm uma “moral” de combate mais avançada que os “atrasados” estudantes que os elegeram nas assembleias de curso baseados somente em seu “senso comum” – estão acima de todo e têm carta branca? A LER, que se ufana de democrática e acusa o PSTU de burocrático o tempo todo, entra em uma série de contradições ao defender as assembleias de curso (onde dizem que está a base, mas terminam defendendo que os delegados não se submetam totalmente a suas decisões majoritárias) contra as assembleias gerais (onde também está a base), para acabar anulando o poder de ambas em favor de um comando de greve que não esteja submetido à disciplina de nenhum dos dois níveis de assembleias. Evidencia-se, assim, apesar de suas palavras, a concepção completamente burocrática que a LER defende dentro do movimento estudantil e social.
Toda essa concepção burocrática baseia-se na teoria da “democracia dos que lutam”. Esta teoria, posta em prática, termina sendo nefasta, suicida e criminosa para as lutas em geral, pois preparam, como neste caso, as derrotas mais duras e desmoralizantes para o movimento. Parte de uma lógica que, na prática, busca substituir a ação das massas pelas de uma pequena vanguarda dirigida por eles, que se acham conhecedores de todo o humano e o divino. Esta teoria, ainda que não o admitam, não tem a menor confiança no poder criador das massas, pois as consideram muito atrasadas para poderem decidir seus destinos de forma soberana.
No caso do conflito na USP, a LER defende sua política focada na vanguarda radicalizada com a seguinte apreciação das massas: “(...) O PSTU esquece-se de que, como ensinava Clausewitz (…), a ‘massa’ (opinião pública incluída) deve ser vista como força ‘física’ (força numérica) mas principalmente como força ‘moral’ (ânimo, disposição para lutar, coragem, coesão como grupo ou coletivo). A ‘massa’, depois de três décadas de neoliberalismo e derrotas, é cada vez maior (força numérica) porém cada vez menos coesa, corajosa e disposta a lutar, cada vez mais individualista, conformista, passiva e pacífica. Ou seja, contraditoriamente a massa tem mais força numérica porém menos força de combate, pois sua ‘moral’ é cada vez mais a moral do inimigo (defesa da ordem, da polícia, da lei, da paz social, do ‘estado de coisas’)”11. Está tudo dito. Como a “coragem” e a “moral” combatente das massas não satisfazem as exigências do refinado paladar político da LER, por que perder tempo fazendo política para elas? Por que perder tempo tentando elevar seu nível de consciência, aplicando o método do programa de transição trotskista? É melhor – mais fácil e mais cômodo – fazer política para “uma pequena vanguarda estudantil dotada de um sentimento (moral) antipolícia” e dedicar-se, “como vanguarda consciente, revolucionária (…) a construir uma forte vanguarda de jovens conscientes do papel da polícia e da necessidade de combatê-la e dissolvê-la”12.
A LER, como o resto da ultraesquerda, encara suas ações como se se tratasse de uma partida de pingue-pongue: de um lado, Rodas–PM, e, do outro, eles e o que eles consideram como a vanguarda mais combativa e decidida; as massas (que têm a “moral do inimigo”) ficam sempre no meio, relegadas a simples espectadoras. Esse desprezo em relação às massas e ao próprio princípio da democracia operária é típico de correntes que caem no desespero pequeno-burguês. Justificam com todo tipo de ideologias sua covardia para realizar um trabalho político na base e seu rechaço em relação ao que Lenin ensinava sobre “explicar pacientemente” nossa política às massas para elevar sua consciência e, nesse processo, ganhá-las para as posições revolucionárias.
Lenin, Trotsky e… Von Clausewitz contra a LER
Os militantes da LER, supostos estrategistas “militares”, recorrem, para subsidiar suas posições, ao conhecido e genial general prussiano Claus Von Clausewitz. Este brilhante teórico e prático da ciência da guerra é autor da famosa máxima de que “a guerra é a continuação da política por outros meios”. Sábia verdade. Outra grande verdade é o que dizia Trotsky, tomando esta definição de Clausewitz, sobre o ultraesquerdismo: “Sua política em tempos de guerra será a fatal consumação de sua política em tempos de paz”13. A política da LER, como a de todo aquele que padece da doença do ultraesquerdismo, baseia-se não só no desprezo pequeno-burguês em relação às massas, como também em abstrair-se completamente da realidade objetiva e não levar em conta a análise rigorosa de algo que, na ciência militar e no marxismo, chama-se correlação de forças. E tanto Clausewitz quanto Lenin e Trotsky se dedicavam a fazê-lo de uma forma milimétrica antes de propor uma tática ou de empreender qualquer tipo de ação.
Lenin dizia que a “medula do marxismo e da tática marxista” reside em “levar em consideração a correlação de forças”. O máximo dirigente do outubro russo insistia em que: “Nós, os marxistas, nos orgulhamos sempre de saber determinar, considerando estritamente as forças das massas e as relações entre as classes, a conveniência de uma ou outra forma de luta. Dissemos: a insurreição não é sempre oportuna; sem certas premissas concretas é uma aventura. Condenamos muito frequentemente, como inoportunas e nocivas desde o ponto de vista da revolução, as formas mais heroicas de resistência individual”14. Para Lenin, propor uma forma de luta sem considerar as forças das quais se dispõe era simplesmente um crime. Em 1918, em sua famosa polêmica com os “comunistas de esquerda”, em que, pela falta de um exército, defendeu até à morte assinar o tratado de paz “arquidesvantajoso” de Brest–Litovsk, que imposto de forma humilhante pelo Estado imperialista alemão antes que empreender uma “guerra revolucionária”, como propunham os ultraesquerdistas, escreveu: “(...) é preciso (...) limitar-nos à propaganda, à agitação e à confraternização enquanto não possuirmos forças para mirar um golpe duro, sério e decisivo em um patente conflito militar ou insurrecional (…) É evidente para todos (salvo, quiçá, para os que estão completamente embriagados pela frase) que aceitar um importante conflito insurrecional ou militar sabendo que não se dispõe de forças, sabendo que não se tem exército, é uma aventura que, longe de ajudar os operários alemães, torna mais difícil a sua luta e facilita a tarefa de seu inimigo e do nosso”15. Esta última parte é importante, pois não faltam os que dizem que “fatos políticos” derivados de ações radicalizadas na USP podem inflamar ou despertar a luta em outras universidades. Se a vida fosse tão fácil…
E, a propósito de Von Clausewitz, vejamos como Lenin interpretava seus ensinamentos em momentos em que a correlação de forças lhe era desfavorável: “Se com certeza as forças são pequenas, o principal meio de defesa é retirar-se para o interior do país (quem vir nisto uma fórmula tirada do contexto para o caso presente, que leia o que diz o velho Clausewitz, um dos grandes autores militares, a respeito dos ensinamentos da história sobre o particular)”16. Nem sempre a tática mais apropriada para “vencer” é atacar. No geral, alguém ataca uma posição se tem as condições para fazê-lo.
Mas essas lições básicas não cabem nos esquemas da LER. Para eles: “Como sabem os marxistas, diante de grandes interesses antagônicos, a força (combate, métodos radicais, guerra) será o elemento decisivo, portanto os ‘métodos’ devem ser ‘de guerra’, proporcionais aos ‘grandes objetivos e interesses’ ”17. Ou seja, sempre que existirem “grandes interesses antagônicos” (na luta de classes sempre existe isso) ou “grandes objetivos e interesses”, o “método” deve corresponder não às forças de que dispomos, mas sim à magnitude de nossos fins. É um bom momento para agradecer que esses generais não contem com um exército.
É lamentável constatar, compartilhando com Lenin, que na LER e em outros grupos afins à sua política e métodos “não há o menor indício de que compreendam a importância do problema da correlação de forças”18. Isso é impossível, pois, como escrevia Trotsky: “os escolásticos ultraesquerdistas não pensam em termos concretos, senão em abstrações vazias”.19
Na ofensiva ou na defensiva?
É preciso analisar, à luz dessas definições e ensinamentos de nossos mestres, que política a LER defendeu e defende ante o conflito na USP. Contrastar, como marxistas, suas propostas de ação com a realidade objetiva vivida pelo movimento estudantil da USP é fundamental para extrair as lições necessárias e poder continuar esta luta tão importante.
O primeiro é saber que este conflito se deu em um momento em que um amplo setor dos estudantes não se posicionava a favor das pautas do movimento estudantil. A base de apoio desta luta ainda era bastante limitada e a reitoria contava com o respaldo da opinião pública dentro e fora da universidade. Neste contexto político, a ocupação unilateral da reitoria dividiu o movimento e acabou colocando-o ainda mais na defensiva. Em vez de buscar outros meios para disputar a consciência dos estudantes e ganhá-los para a luta massiva e contundente contra Rodas–Alckmin–PM, a ultraesquerda tomou um caminho que só isolou ainda mais a luta, ao afastar dela muitos estudantes. Segundo dados do Datafolha publicados em 13 de novembro, 58% dos estudantes aprovam a presença da PM no campus e 57% têm mais confiança do que medo desse corpo repressivo. Por outro lado, 73% dos estudantes estavam contra aquela ocupação aventureira e 53% opinam que os estudantes que participaram devem ser punidos. Assim, fica evidente que o apoio à PM dentro do campus ainda é amplo. Inclusive entre aqueles que estão contra a presença da PM na USP, um setor considerável era contra a tática da ocupação. Realidade amarga, mas, no fim, realidade.
Porém, quando falamos de correlação de forças não falamos só de números. É verdade que as pesquisas de opinião não podem ser nosso único critério ou parâmetro e, como se sabe, é muito improvável conseguir na massa estudantil uma maioria absoluta a favor das bandeiras históricas do movimento. Por isso, além das pesquisas de opinião, é preciso determinar quem está politicamente na ofensiva e quem está na defensiva. Aqui cabe ser categórico e constatar que, até agora, quem está na ofensiva é a reitoria e o governo estadual. Nesse sentido, apesar dos esforços de resistência do movimento, a reitoria, com o apoio irrestrito do governo estadual e federal, tem conseguido implementar seu projeto, abrindo cursos pagos, aprofundando a entrada de empresas privadas na universidade, cometendo atos de corrupção, abrindo processos administrativos contra dezenas de militantes estudantis e sindicais etc. Isso ocorre, além do mais, porque a reitoria também está na ofensiva e bem posicionada diante da opinião pública, tendo respaldo para aplicar seus planos de maneira categórica e brutal.
A tarefa da vanguarda estudantil é, portanto, lutar para reverter essa correlação de forças – conquistando, antes de tudo, um apoio mais amplo dentro e fora da universidade – e proteger o movimento das ofensivas políticas e repressivas de Rodas–Alckmin–PM. Assim, era inaceitável colocar o movimento em risco. Após a desocupação da reitoria, a LER tentou atenuar sua responsabilidade política neste fato desastroso para o movimento estudantil dizendo que: “toda batalha implica em perigos” e que “as conquistas também abrem dificuldades até para o exército vitorioso”20. Esses delírios até poderiam nos fazer rir, se não estivéssemos com 73 estudantes processados, fruto dessa “conquista” de seu suposto “exército vitorioso”.
Depois da repressão, houve um crescimento no movimento estudantil, que se expressou em assembleias, atos e marchas com dois ou três mil estudantes e um cenário de menor isolamento dentro e fora da USP. Este novo momento, que é muito progressivo, é possível porque, embora 73% dos estudantes estivessem contra a ocupação, 46% também criticaram a agressividade policial. Os “excessos” e a “brutalidade” da PM (que, sinceramente, teve uma reação desproporcional diante de uma ocupação de menos de 100 estudantes) possibilitaram que um setor mais numeroso de estudantes se some e, em um movimento de solidariedade bastante comum nesses casos e por tratar-se de estudantes, pronunciaram-se intelectuais, professores, artistas e até alguns meios de comunicação começaram a moderar suas posições ultrarreacionárias. Mas sejamos claros: o que abriu um novo momento, que devemos aproveitar a fundo para fortalecer o movimento de conjunto, não foi a ocupação burocrática dos “estudantes combativos” – que quase nos liquida –, mas um erro político do inimigo. A discussão é se esses novos fatos e elementos configuraram uma mudança qualitativa na correlação de forças. Nós opinamos que não, opinamos que a luta continua sendo defensiva. A construção de grandes assembleias e atos é uma vitória dos estudantes da USP, que mostraram à reitoria e à sociedade que podem lutar unificadamente para defender a educação pública e a autonomia universitária; mas a correlação de forças se mantém. A luta é tão defensiva que, ainda que não tire esta conclusão, até a LER defende que a “prioridade” da luta é o fim dos processos conta os 73 ex-presos políticos. O centro, agora, deixou de ser o “!Fora Rodas, Fora PM!” para ser a defesa de nossos presos, isto é, não avançar “deixando para trás os mortos e feridos” de nosso exército, como eles mesmos escrevem em sua “nota militar”. O que pode ser mais defensivo que isso?
A concepção de “ações exemplares”
Queremos deixar claro que não concordamos com o raciocínio de que, quanto piores as coisas estão, há melhores condições para lutar. Não concordamos com a lógica de que, realizando “ações exemplares” ou gerando “fatos políticos” em que uma elite iluminada, que tudo sabe e tudo pode, esbanje heroísmo, sacrifício e inusitada valentia, as massas serão despertadas para a luta.
E o problema não é a ousadia ou a radicalização das ações. Estamos completamente a favor das ações mais radicalizadas da juventude e do resto do movimento de massas. O problema é quando essas ações radicalizadas são realizadas dando as costas (ou, o que é pior, contra) às massas e não se colocam a serviço de fortalecer o movimento social de conjunto. O problema é quando a ousadia, a temeridade e a coragem, que são indispensáveis em qualquer luta, estão simplesmente a serviço de agradar setores ultraesquerdistas que, desta forma, saciam suas necessidades de convencer a si mesmos que são os únicos “revolucionários”. É aí que a ultraesquerda demonstra um individualismo extremo e cruza caminho com o anarquismo, a quem Lenin denominava, com toda razão, “liberais com 40º de febre”.
A LER acusa o PSTU de ter se colocado contra as ocupações e a declaração imediata de greve estudantil (a qual, uma vez votada, nos jogamos com tudo para construir e fortalecer) porque teríamos uma estratégia que busca “ligar-se a setores mais amplos dos estudantes, adaptando-se ao senso comum pró-segurança elitista e privilegiando os espaços eleitorais (...)”21. Em contraposição, nossos estrategistas infalíveis dizem que, desde o princípio, trabalharam “(...) criando uma vanguarda pelo FORA PM que questionasse o caráter elitista da universidade e o papel que a polícia cumpre fora dela, privilegiando os métodos da luta de classes (ocupações e greve estudantil)”22. Duas questões: a primeira é que é verdade que o PSTU buscou e continua buscando chegar a setores “mais amplos” dos estudantes, mas não para se adaptar ao seu nível de consciência ou ao seu “senso comum”, e sim para fazer exatamente o contrário, para disputar sua consciência que hoje, verdade amarga e dolorosa de engolir, está majoritariamente com a política de Rodas-Alckmin-PM-Imprensa burguesa. Neste contexto, defendemos que é necessário acompanhar a disputa político-ideológica dentro do conjunto dos estudantes, com ações que ajudem a elevar seu nível de consciência, levantando o sistema de palavras de ordem corretas, no momento correto. Em outras palavras, seguindo a metodologia do Programa de Transição. Fazer o contrário, ou seja, trabalhar só com o programa máximo23, é abrir um abismo entre as massas e a própria luta, sem falar da vanguarda, que ficaria falando sozinha com a verdade na mão.
A segunda questão é que as “ocupações e a greve estudantil” não são os únicos “métodos da luta de classes”. Justamente porque estamos falando de táticas de luta, existem outras mil variantes que podem ser utilizadas se as condições para essas “ocupações e greve estudantil” não estiverem dadas nesse momento. O problema é quando não queremos ver a realidade (que quase nunca é a que alguém queria que fosse) e, para nos olhar satisfeitos no espelho ou girar em toro de nosso umbigo, começamos pelo final. A outra questão é que a vanguarda não é algo que se “cria”. Ela é um fenômeno que surge dos processos de luta reais, objetivos, e que reflete as características gerais desses processos.
Para a LER, não estar a favor dos “métodos da luta de classes”, que para seu parco esquema passam somente pelas ocupações ou ações mais radicalizadas, significa capitulação, traição, não ser “ousado” e adaptar-se às pressões do “senso comum”. Para nós, a ousadia não passa por lutar isolado. Isso, na verdade, significa ser suicida. Se fizéssemos isso, seríamos, como dizia Trotsky ao se referir a Stalin, meros e eficazes “organizadores de derrotas” para a nossa classe. Para nós, a questão é a oposta: quem realmente capitula ao “senso comum” das massas é aquele que não tem a ousadia –porque é preciso ser ousado e audaz para ir até a base e tentar convencer os estudantes ou as massas de uma determinada política! –, lidando com as contradições e disputando a consciência que, por ação da ideologia dominante, é geralmente atrasada e cheia de preconceitos de todo tipo. Na verdade e afinal de contas, o mais fácil é ficar isolado sem dar essa batalha, sem fazer esse trabalho cinzento, mas indispensável para o triunfo de qualquer luta e, chegado o momento, da própria revolução.
Nós defendemos o método das ocupações e das greves como ações legítimas do movimento estudantil e de qualquer outro setor do movimento de massas. Estas são questões táticas, isto é, que dependem das condições objetivas e subjetivas que tenhamos para aplicá-las e, sobretudo, sustentá-las. No entanto, não é por serem questões “táticas” que são assuntos menos importantes. No movimento operário, que tem pouco a ver com as características do movimento estudantil, uma greve ou ocupação mal medida custa a demissão a centenas de trabalhadores e até a prisão para os dirigentes.
Mas não coloquemos o exemplo do movimento operário, onde dá calafrios pensar o que pode chegar a fazer um grupo como a LER em posição de direção, e voltemos ao mundo do movimento estudantil. Por exemplo, a ocupação isolada empreendida pela LER e seus amigos não tem nada a ver com o processo de greves e ocupações das reitorias da USP, da Unesp e da Unicamp durante o primeiro semestre de 2007, as quais foram acompanhadas por uma verdadeira onda de ocupações e greves em todo o país. Este processo de luta – contra o decreto do ex-governador de São Paulo, o direitista José Serra, que criava a Secretaria de Educação Superior atentando contra a autonomia universitária, desconsiderando a pesquisa básica para favorecer a “operacional”, e ameaçando seriamente o financiamento das universidades brasileiras – envolveu, além de uma vanguarda numerosa, setores importantes da massa estudantil. A força do movimento conseguiu neutralizar a ação venenosa da imprensa e ganhar o apoio de importantes setores da sociedade. Não foi por acaso que esse movimento foi vitorioso e Serra não conseguiu que a PM (como Alckmin e Rodas conseguiram agora, graças ao isolamento) entrasse para reprimir essas ocupações, não porque lhe faltasse vontade, mas porque – eles, sim, consideram este tipo de coisas – não tinham uma correlação de forças favorável.
É assim que, para além de qualquer fraseologia altissonante e grandiloquente da qual tanto gostam os ultraesquerdistas, sua política concreta, por mais “radical” que soe ou pareça, termina servindo à burguesia e facilitando a vida, neste caso, para Rodas–Alckmin–PM. Eles aproveitaram o isolamento para reprimir violentamente e abrir um precedente nefasto na história do movimento estudantil.
No entanto, apesar dos planos de Rodas–Alckmin–PM e da política nefasta da ultraesquerda, a luta está em curso e nada está definido. Devemos continuar lutando com a mesma força e decisão de sempre. É necessário aproveitar este novo momento, disputar e ganhar politicamente a vanguarda gerada nesta luta para nossas bandeiras e dar uma batalha clara e paciente entre as massas estudantis. É indispensável manter nossas posições se queremos passar à ofensiva. Devemos também ter como aliados os sindicatos de professores, trabalhadores e o resto do movimento sindical e social brasileiro e internacional. Agora nós é que devemos isolar politicamente Rodas–Alckmin–PM. Toda a política do PSTU vai neste sentido, de fortalecer a luta e de cercá-la de solidariedade no movimento operário e social. Assim, podemos citar o caso de nossa posição no Sindicato de Metroviários de São Paulo, em que o PSTU propôs tanto o apoio político contra a presença da PM na USP como o apoio financeiro para a libertação efetiva dos estudantes presos. Fizemos esta defesa sabendo e apesar de existirem setores da base contrários a esta ação de solidariedade, devido obviamente à campanha demonizadora da imprensa burguesa, que se valeu muito das ações isoladas promovidas pela ultraesquerda.
Devemos e podemos fazer tudo isso para vencer. Porque os estudantes da USP precisam e podem vencer, apesar das forças da direita reacionária dentro e fora da USP e daqueles que padecem da doença do ultraesquerdismo.
Garantir uma vitória dos estudantes da USP é uma necessidade de todo o movimento que defende a educação pública. O primeiro passo é conquistar o arquivamento dos processos contra os 73 companheiros e companheiras que foram presos na ocupação da reitoria. Isto só se dará com base em uma ampla unidade democrática de todos os setores do movimento estudantil, dos trabalhadores e professores da universidade, que ousem disputar amplos setores dentro e fora da USP para empreender uma grande campanha.
Uma seita burocrática com moral stalinista
Não obstante, o que nos parece realmente grave e inaceitável não são nossas diferenças políticas. Estas, ainda que sejam de fundo e irreconciliáveis, passam para o segundo plano se comparadas ao método stalinista utilizado pela LER, em seu afã desesperado por diferenciar-se, de iniciar uma campanha de calúnias na contra o PSTU, acusando-o de ter feito um acordo com o reitor Rodas para liquidar a primeira ocupação da FFLCH. Em outra nota, assinada por Bruno Gilga, afirmam que o PSOL, quando houve o caso dos três estudantes que foram defendidos por seus companheiros, “cumpriu o ‘papel de polícia’ no movimento, ‘escoltando’ os estudantes até a viatura, contra os que queríamos expulsá-la”. Em seguida, envolve o PSTU nessa acusação dizendo, ao referir-se ao PSOL e a nosso partido, que “estas direções vão se reafirmando como uma ‘esquerda moderada’. Não lhes bastou entregar os estudantes à polícia (...)”24.
As acusações são gravíssimas. Se fossem verdadeiras, não estaríamos diante de “pelegos”, mas sim de colaboradores diretos do reitor e da polícia capitalista. Se a LER fosse consequente, deveria ter alertado o movimento estudantil, deveria ter colocado isso como primeiro e inevitável ponto das assembleias que vêm ocorrendo, deveria apresentar as provas (que para acusações desta magnitude devem ser contundentes e irrefutáveis) e deveria ter solicitado a imediata e direta expulsão de nossos companheiros e os do PSOL do DCE. A atitude de lutadores honestos e sérios deveria ter sido esta, pois, como é possível sequer discutir com agentes das forças repressivas, do reitor; com traidores da luta?
No entanto, não fizeram nada disso porque simplesmente não têm provas que sustentem essas acusações. Ao fazer esse tipo de acusações e amálgamas sem ter como prová-las ao movimento estudantil e à esquerda brasileira e mundial, os membros da LER transformam-se em caluniadores vulgares ao mais puro estilo stalinista. E tem mais. Em outra nota, criticando o suposto desprezo, por parte do PSTU, na defesa dos 73 presos da USP, insinuam de forma caluniosa que isso se devia ao fato de serem subproduto de uma tática (a ocupação da reitoria) com a qual não concordamos. Atrevem-se a dizer isto apesar não só de nossa posição incontestável de solidariedade aos companheiros, como também depois de ter sido a própria CSP–CONLUTAS, onde o PSTU cumpre um papel destacado, que pagou as fianças dos estudantes presos!
A baixeza dessas calúnias, amálgamas e insinuações é escandalosa. Reafirmamos plenamente, nesse sentido, a nota da Juventude do PSTU a respeito desses métodos: “A LER abandona assim as regras mais elementares da esquerda e empreende uma campanha vergonhosa, indigna, suja e mesquinha, com o único objetivo de combater nossas posições políticas. É a moral do vale tudo, que não tem nada em comum com os valores defendidos pela esquerda revolucionária e socialista, à qual a LER diz pertencer”25.
Apesar disso e ainda que seja repugnante, essa atitude não nos surpreende vindo de uma seita burocrática que, com gritos belicosos e alaridos infantis, termina sempre em posições oportunistas. Tal como escreveu Trotsky: “Para o sectário, todo aquele que trata de explicar-lhe que a participação ativa no movimento operário exige o estudo permanente da situação objetiva em vez dos conselhos altaneiros pronunciados a partir da tribuna professoral sectária, é um inimigo. Em lugar de dedicar-se a analisar a realidade, o sectário dedica-se às intrigas, rumores e histeria”26.
Nossa classe saberá julgar de forma implacável as posições políticas, os métodos e a moral desses charlatães com pose de revolucionários.
Notas:
1. No entanto, segundo dados publicados pelo Datafolha, 57% dos estudantes opina que, após a presença da polícia, a sensação de insegurança é a mesma.
2. Trotsky, Leon: Prólogo à edição polonesa do Esquerdismo, doença infantil do comunismo, de Lenin, escrito em outubro de 1932.
3. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” sobre as conquistas e novas contradições no movimento, publicado no site da LER–QI.
4. Idem.
5. Trotsky, Leon: Sectarismo, centrismo e a Quarta Internacional, escrito em outubro de 1935.
6. Idem.
7. DCE: Diretório Central dos Estudantes.
8. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” (....)
9. Idem.
10. Viskov, Natália: Transformar o comando de greve com delegados mandatados e revogáveis no organismo mais democrático de direção da luta, publicado no site da LER–QI.
11. Ventura, Leandro e Lisboa, Val: As lutas, assim como as guerras, são radicais quando os objetivos são radicais, publicado no site da LER–QI.
12. Idem.
13. Trotsky, Leon: Aprendam a pensar: Uma sugestão amistosa a certos ultraesquerdistas, escrito em maio de 1938.
14. Lenin, V. I.: Sobre a frase revolucionária, publicado na compilação denominada A política exterior do Estado Soviético. Editorial Progresso, Moscou, 1979, p. 35.
15. Ibidem, grifos no original.
16. Lenin, V. I.: Sobre o infantilismo “esquerdista” e o espírito pequeno-burguês, publicado na compilação denominada A política exterior do Estado Soviético. Editorial Progresso, Moscou, 1979, p. 80. Lenin refere-se ao capítulo XXV, A retirada para o interior do país, da sexta parte da obra de Von Clausewitz Da Guerra, em que fala dos problemas da defesa.
17. Ventura, Leandro: As lutas, bem como as guerras (…)
18. Lenin, V. I.: Sobre o do infantilismo “esquerdista” e o espírito pequeno-burguês (...)
19. Trotsky, Leon: Aprendam a pensar (…)
20. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” (...)
21. Fortalecer o comando de greve para expulsar a PM e revogar o convênio! Lutemos pela retirada do processo aos 73 presos da USP!, publicado no site da LER–QI.
22. Ibidem.
23. Por exemplo, a LER–QI nega-se a levantar uma saída alternativa ao problema da insegurança no campus da USP, apesar de que 79% dos estudantes tenham declarado que têm medo de circular no prédio universitário à noite. A palavra de ordem “Segurança sim, PM não”, seria, por parte do PSTU, “ceder ao senso comum” e “naturalizar” a presença da PM como um “mal necessário”. Defendem isso sabendo que nosso projeto de segurança alternativo parte do “Fora PM”.
24. Gilga, Bruno: Estudantes organizam massiva luta contra a polícia, publicado no site da Fração Trotskista.
25. Juventude do PSTU: Onde o ultraesquerdismo se encontra com o stalinismo, publicado no site do PSTU.
26. Trotsky, Leon: Sectarismo (…)
Retirado do Site do PSTU
Na Universidade de São Paulo (USP), Brasil, estamos assistindo a acontecimentos tão impactantes como repudiáveis, cujas repercussões não só transcenderam os limites da universidade, como também adquiriram relevância internacional.
Desde o mês de setembro deste ano, o reitor dessa instituição, João Grandino Rodas, assinou um convênio que estabelece a presença permanente da Polícia Militar (PM) no campus da USP, com o argumento de que esta medida garantiria uma “maior segurança” à comunidade acadêmica1. Esta iniciativa altamente reacionária, que viola de forma flagrante o princípio da autonomia universitária, em pouco mais de dois meses começou a mostrar seus verdadeiros objetivos, que não têm nada a ver com a “proteção” dos estudantes, professores ou trabalhadores da USP, ou algo similar, mas sim com a repressão e intimidação do movimento estudantil e sindical dentro da instituição.
Isto ficou evidente, ante o assombro de muitos, quando, na madrugada do dia 8 de novembro, cerca de 400 policiais da tropa de choque da PM, apoiados em seu operativo pela cavalaria, veículos blindados e helicópteros, invadiram o prédio da USP para desalojar, de forma violenta e brutal, um grupo de estudantes que ocupava a sede da reitoria havia alguns dias. O saldo desta ação de guerra contra o movimento estudantil e social foi de 73 companheiras e companheiros presos e processados criminalmente. A PM atuou cumprindo uma ordem judicial que, por sua vez, foi impulsionada pelo próprio reitor Rodas.
Aqui não há relâmpago em céu azul. Esses fatos vergonhosos são parte de todo um processo consciente de militarização da USP, que é encabeçado pelo próprio Rodas, um fiel servidor do governador do Estado de São Paulo, Geraldo Alckmin, do direitista PSDB. O projeto de militarizar a USP, instaurando um regime “macarthista” em seu seio, isto é, uma situação de perseguição permanente, reacionária e paranoica da esquerda ou de qualquer tipo de oposição à ordem estabelecida, responde a um projeto mais global. Esse projeto consiste em consumar a privatização–elitização das universidades brasileiras, colocando-as – ainda mais – a serviço dos interesses das multinacionais e do mercado. Como condição para concretizar esta estratégia, a burguesia brasileira e seus representantes políticos sabem perfeitamente que devem acabar com qualquer resistência que possa vir do movimento estudantil ou dos demais setores do movimento social. Descabeçar e desmantelar nossas organizações é, para eles, tarefa de primeira ordem. Eis o motivo da importância política de militarizar e liquidar a autonomia universitária na USP e nas demais universidades.
Diante dos perigos concretos desta ofensiva, é que a luta contra a militarização na USP – cujos objetivos, para o PSTU e a LIT, concretizam-se nas palavras de ordem de: !Fora PM! !Fora Rodas! !Pelo arquivamento imediato do processo contra os 73 estudantes que foram presos! !Por um projeto alternativo de segurança para a comunidade acadêmica da USP! – é, atualmente, parte fundamental da luta mais geral por uma educação pública, gratuita, autônoma e de qualidade. Estamos diante de uma luta de vital importância em defesa de liberdades democráticas elementares, sem as quais será impossível frear o processo de destruição da universidade pública, impulsionado pelo governo federal chefiado pela petista Dilma Rousseff.
Leon Trotsky dizia que “a estratégia sem sua correspondente tática será sempre uma abstração teórica inerte”2. Se concordamos nesses objetivos gerais, torna-se indispensável, para avançar, pesar as diferentes políticas, táticas, métodos e propostas de ação que as diferentes correntes dentro do movimento estudantil têm defendido até agora. Nesse sentido, existe uma polêmica com as correntes ultraesquerdistas que atuam na USP e que ganhou importância com o desenvolvimento do conflito.
Referimo-nos, concretamente, à chamada Liga Estratégia Revolucionária (LER–QI), ligada ao PTS argentino. Desde o início da luta, essa organização defendeu ações que, ao não corresponder com a correlação de forças entre o movimento estudantil e nossos inimigos, não passaram de meras aventuras irresponsáveis que colocaram em risco a luta dos estudantes. Para piorar, impulsionaram tudo isso com métodos burocráticos e apelando a calúnias da pior espécie stalinista contra o PSTU e outras correntes com as que não concordam politicamente. O debate, pelo que está em jogo, é inevitável. Para iniciá-lo, é necessário ir primeiro aos fatos.
Como as coisas aconteceram?
A crise atual começou no dia 27 de outubro quando, no contexto do reacionário convênio Rodas–PM, a polícia tentou prender três estudantes por suposta posse de maconha. Nesse momento, um setor dos estudantes reagiu e, protegendo seus companheiros da arbitrariedade policial, conseguiu expulsar os policiais do local. Foi uma vitória importante dos estudantes, que abria uma situação favorável para colocar com mais força o debate sobre a presença policial na USP, ampliando o espaço para organizar uma forte campanha contra isso. No entanto, sem maiores reflexões, a LER e outros setores afins à sua política e concepções arrebatadamente propuseram, de imediato, a ocupação da sede administrativa da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas). Os militantes do PSTU, naquele momento, propuseram outro tipo de medidas como atos, marchas e debates no âmbito de uma campanha com o objetivo de ganhar importantes setores da massa estudantil para esta causa democrática. No entanto, a assembleia decidiu ocupar e, apesar de o PSTU não achar que as condições estivessem dadas para essa medida, acatou a decisão dessa instância e participou ativamente da ocupação.
É um fato que aquela ocupação da FFLCH nasceu isolada e debilitada, tanto na USP como para a opinião pública. Foi então que, em outra assembleia, realizada em 1º de novembro, o tema foi discutido democraticamente por mais de mil estudantes e, por uma maioria de 559 contra 458, votou-se pela desocupação dessa faculdade. Depois do horário máximo marcado pela assembleia e a declaração de seu final, um grupo de estudantes, encabeçado pela LER, resolveu ocupar outro prédio da USP, desta vez a própria reitoria. Esta ocupação, decidida pelas costas das instâncias deliberativas e resolutivas legítimas dos estudantes, não só permaneceu isolada como também dividiu o movimento estudantil. A reitoria, de maneira totalmente antidemocrática e autoritária, convocou novamente a PM para efetuar a desocupação violenta, em que foram presos e processados 73 estudantes.
Democracia “para os que lutam” ou democracia em que a base decide?
Sabemos que, em política, nada é por acaso. Tudo tem um porquê de fundo. As questões “táticas” de uma organização sempre estão ligadas a sua estratégia e concepções gerais.
Essa forma de atuar nos conflitos, isto é, a política e a metodologia da LER–PTS tem por trás toda uma concepção teórico-ideológica que eles passaram a chamar de “democracia para os que lutam”. Este esquema propõe, basicamente, que as decisões sobre os rumos do movimento devem ser tomadas somente pelos ativistas que estejam dispostos a lutar ou, utilizando as palavras de uma curiosa “nota militar” da LER, por aqueles cujo centro é “o combate, a reflexão e a vontade de agir para vencer”3, aqueles que têm “moral para o combate”. Assim, a decisão do que é melhor para uma determinada luta não corresponde às massas, à base do movimento, mas somente àqueles que tenham a “obstinada vontade na linha de frente dos combates”4.
Esses fraseólogos ultraesquerdistas profissionais atuam com um critério já assinalado por Trotsky: “Para o sectário, a vida social é uma grande escola e ele, seu professor”5. Por serem inimigos irreconciliáveis da dialética (não nas palavras, em que ninguém ganha deles, mas na ação), método que para Trotsky “sempre toma a experiência como ponto de partida para depois voltar a ela”, aplicam um método formal e iluminista, nunca isento de arrogância, típico da intelectualidade pequeno-burguesa radicalizada.
Esta armação teórica leva-os, evidentemente, a desrespeitar burocraticamente as decisões das assembleias legitimamente constituídas dentro do movimento de massas. Como a democracia é “para os que lutam” e não para as massas, nossos brilhantes estrategistas só participam e acatam as decisões das assembleias quando estas coincidem com sua política e suas propostas de ação. Foi assim que, na USP, ao defender a importância do comando de greve que se constituiu (que é correto), começaram a questionar a legitimidade do DCE7 como entidade de massas, como instância legítima dos estudantes (um erro grave, típico de todo ultraesquerdista ou do anarquismo). Nós temos muitas críticas à atual direção do DCE da USP, nas mãos de correntes ligadas ao PSOL, mas isso nunca nos pode levar a questionar o DCE como entidade representativa dos estudantes. Uma coisa é questionar a direção política de um sindicato, outra muito diferente é, por causa de sua direção, negar a legitimidade do sindicato como tal. A LER expressa este erro de concepção de forma clara em sua já citada “nota militar”: “Este organismo [o comando de greve] é o que permitirá, como uma assembleia das assembleias, sua evolução democrática e radical [do movimento]. Duas democracias começam a se chocar. A formal por fora da luta de classes, a da eleição das entidades como o DCE, e a democracia dos que lutam, da representação dos mobilizados, das assembleias, (...) das ocupações”8. Ou seja, o DCE seria algo “por fora da luta de classes” e nesse espaço se exerceria uma “democracia formal”, enquanto o comando de greve, onde estariam somente “os que lutam”, longe de estar submetido às decisões da assembleia geral (onde a base estudantil deve mandar), estaria acima delas, ao se converter em uma “assembleia das assembleias”.
Essa lógica não responde à principal necessidade do movimento neste momento, que é construir uma ampla unidade de todos os setores, no âmbito de uma forte campanha democrática contra a reitoria e a PM. Somente com um movimento forte e unificado será possível conquistar a vitória. A LER se nega a construir esse movimento, assim como se nega a reconhecer as entidades históricas e legítimas do movimento estudantil. Desse modo, não atua no sentido desta grande tarefa.
Estamos perante outra concepção de movimento e de democracia operária. O objetivo deixou de ser fazer política para as massas, para centrar-nos exclusivamente na vanguarda mais radicalizada. Coerentes com esta concepção, definem assim seus objetivos: “Nossa tarefa é formar uma corrente de milhares em todo o país que seja a voz daqueles que estão fora da universidade. Que encare cada luta sua como parte da luta geral dos trabalhadores e do povo contra a burguesia. Para isso, precisamos ser os mais consequentes defensores e implantadores da democracia dos que lutam, desta nova forma de construir uma direção do movimento que começa a ser realizada na USP, o comando de delegados de assembleias de curso”9. Nós estamos completamente a favor de ter sido conformado um comando de greve e nos jogamos com tudo para fortalecê-lo, pois é um espaço democrático e necessário para organizar e centralizar a luta. Dito isso, devemos ser categóricos em defender que todo comando deve ser submetido à base do sindicato, não pode estar “por fora” das decisões dos estudantes, pois, se fosse assim, de democrática esta instância passaria a ser burocrática. Nunca um “comando”, do tipo que for e por mais indispensável que seja para qualquer luta, pode ser superior ou substituir as assembleias de base. Desta “nova forma de construir uma direção do movimento”, altamente elitista, a única direção que pode surgir é uma que seja profundamente burocrática.
Tal é a concepção da LER. Eles sustentam que as assembleias são espaços de tipo “parlamentares”, que só “servem para pressionar por negociações com a reitoria”. Por isso, “o comando de greve não pode ser meramente um organismo executivo das resoluções da assembleia geral”. Se o comando de greve não é uma instância que está subordinada e executa as decisões da assembleia geral de todos os estudantes, significa que, para a LER, aquele espaço está acima desta máxima e soberana instância. Para nossos mestres de “democracia” sindical, o comando de greve não só estaria acima das assembleias gerais, mas também das próprias assembleias de curso. Afirmam que “os mandatos dos delegados não devem ser imperativos (quando os delegados só podem votar exatamente sobre o que já foi votado em sua assembleia de curso), pois senão (…) os delegados de um curso podem expressar somente as posições majoritárias do mesmo (...)”10. Perguntamo-nos: se os delegados ao comando de greve não devem estar submetidos a mandatos imperativos de suas bases (assembleias de curso) e não devem ser obrigados a defender as “posições majoritárias” dessas assembleias, então quem eles representam? Seriam delegados de quem? Suas propostas responderiam a quem ou ao quê? Esses delegados – quiçá porque têm uma “moral” de combate mais avançada que os “atrasados” estudantes que os elegeram nas assembleias de curso baseados somente em seu “senso comum” – estão acima de todo e têm carta branca? A LER, que se ufana de democrática e acusa o PSTU de burocrático o tempo todo, entra em uma série de contradições ao defender as assembleias de curso (onde dizem que está a base, mas terminam defendendo que os delegados não se submetam totalmente a suas decisões majoritárias) contra as assembleias gerais (onde também está a base), para acabar anulando o poder de ambas em favor de um comando de greve que não esteja submetido à disciplina de nenhum dos dois níveis de assembleias. Evidencia-se, assim, apesar de suas palavras, a concepção completamente burocrática que a LER defende dentro do movimento estudantil e social.
Toda essa concepção burocrática baseia-se na teoria da “democracia dos que lutam”. Esta teoria, posta em prática, termina sendo nefasta, suicida e criminosa para as lutas em geral, pois preparam, como neste caso, as derrotas mais duras e desmoralizantes para o movimento. Parte de uma lógica que, na prática, busca substituir a ação das massas pelas de uma pequena vanguarda dirigida por eles, que se acham conhecedores de todo o humano e o divino. Esta teoria, ainda que não o admitam, não tem a menor confiança no poder criador das massas, pois as consideram muito atrasadas para poderem decidir seus destinos de forma soberana.
No caso do conflito na USP, a LER defende sua política focada na vanguarda radicalizada com a seguinte apreciação das massas: “(...) O PSTU esquece-se de que, como ensinava Clausewitz (…), a ‘massa’ (opinião pública incluída) deve ser vista como força ‘física’ (força numérica) mas principalmente como força ‘moral’ (ânimo, disposição para lutar, coragem, coesão como grupo ou coletivo). A ‘massa’, depois de três décadas de neoliberalismo e derrotas, é cada vez maior (força numérica) porém cada vez menos coesa, corajosa e disposta a lutar, cada vez mais individualista, conformista, passiva e pacífica. Ou seja, contraditoriamente a massa tem mais força numérica porém menos força de combate, pois sua ‘moral’ é cada vez mais a moral do inimigo (defesa da ordem, da polícia, da lei, da paz social, do ‘estado de coisas’)”11. Está tudo dito. Como a “coragem” e a “moral” combatente das massas não satisfazem as exigências do refinado paladar político da LER, por que perder tempo fazendo política para elas? Por que perder tempo tentando elevar seu nível de consciência, aplicando o método do programa de transição trotskista? É melhor – mais fácil e mais cômodo – fazer política para “uma pequena vanguarda estudantil dotada de um sentimento (moral) antipolícia” e dedicar-se, “como vanguarda consciente, revolucionária (…) a construir uma forte vanguarda de jovens conscientes do papel da polícia e da necessidade de combatê-la e dissolvê-la”12.
A LER, como o resto da ultraesquerda, encara suas ações como se se tratasse de uma partida de pingue-pongue: de um lado, Rodas–PM, e, do outro, eles e o que eles consideram como a vanguarda mais combativa e decidida; as massas (que têm a “moral do inimigo”) ficam sempre no meio, relegadas a simples espectadoras. Esse desprezo em relação às massas e ao próprio princípio da democracia operária é típico de correntes que caem no desespero pequeno-burguês. Justificam com todo tipo de ideologias sua covardia para realizar um trabalho político na base e seu rechaço em relação ao que Lenin ensinava sobre “explicar pacientemente” nossa política às massas para elevar sua consciência e, nesse processo, ganhá-las para as posições revolucionárias.
Lenin, Trotsky e… Von Clausewitz contra a LER
Os militantes da LER, supostos estrategistas “militares”, recorrem, para subsidiar suas posições, ao conhecido e genial general prussiano Claus Von Clausewitz. Este brilhante teórico e prático da ciência da guerra é autor da famosa máxima de que “a guerra é a continuação da política por outros meios”. Sábia verdade. Outra grande verdade é o que dizia Trotsky, tomando esta definição de Clausewitz, sobre o ultraesquerdismo: “Sua política em tempos de guerra será a fatal consumação de sua política em tempos de paz”13. A política da LER, como a de todo aquele que padece da doença do ultraesquerdismo, baseia-se não só no desprezo pequeno-burguês em relação às massas, como também em abstrair-se completamente da realidade objetiva e não levar em conta a análise rigorosa de algo que, na ciência militar e no marxismo, chama-se correlação de forças. E tanto Clausewitz quanto Lenin e Trotsky se dedicavam a fazê-lo de uma forma milimétrica antes de propor uma tática ou de empreender qualquer tipo de ação.
Lenin dizia que a “medula do marxismo e da tática marxista” reside em “levar em consideração a correlação de forças”. O máximo dirigente do outubro russo insistia em que: “Nós, os marxistas, nos orgulhamos sempre de saber determinar, considerando estritamente as forças das massas e as relações entre as classes, a conveniência de uma ou outra forma de luta. Dissemos: a insurreição não é sempre oportuna; sem certas premissas concretas é uma aventura. Condenamos muito frequentemente, como inoportunas e nocivas desde o ponto de vista da revolução, as formas mais heroicas de resistência individual”14. Para Lenin, propor uma forma de luta sem considerar as forças das quais se dispõe era simplesmente um crime. Em 1918, em sua famosa polêmica com os “comunistas de esquerda”, em que, pela falta de um exército, defendeu até à morte assinar o tratado de paz “arquidesvantajoso” de Brest–Litovsk, que imposto de forma humilhante pelo Estado imperialista alemão antes que empreender uma “guerra revolucionária”, como propunham os ultraesquerdistas, escreveu: “(...) é preciso (...) limitar-nos à propaganda, à agitação e à confraternização enquanto não possuirmos forças para mirar um golpe duro, sério e decisivo em um patente conflito militar ou insurrecional (…) É evidente para todos (salvo, quiçá, para os que estão completamente embriagados pela frase) que aceitar um importante conflito insurrecional ou militar sabendo que não se dispõe de forças, sabendo que não se tem exército, é uma aventura que, longe de ajudar os operários alemães, torna mais difícil a sua luta e facilita a tarefa de seu inimigo e do nosso”15. Esta última parte é importante, pois não faltam os que dizem que “fatos políticos” derivados de ações radicalizadas na USP podem inflamar ou despertar a luta em outras universidades. Se a vida fosse tão fácil…
E, a propósito de Von Clausewitz, vejamos como Lenin interpretava seus ensinamentos em momentos em que a correlação de forças lhe era desfavorável: “Se com certeza as forças são pequenas, o principal meio de defesa é retirar-se para o interior do país (quem vir nisto uma fórmula tirada do contexto para o caso presente, que leia o que diz o velho Clausewitz, um dos grandes autores militares, a respeito dos ensinamentos da história sobre o particular)”16. Nem sempre a tática mais apropriada para “vencer” é atacar. No geral, alguém ataca uma posição se tem as condições para fazê-lo.
Mas essas lições básicas não cabem nos esquemas da LER. Para eles: “Como sabem os marxistas, diante de grandes interesses antagônicos, a força (combate, métodos radicais, guerra) será o elemento decisivo, portanto os ‘métodos’ devem ser ‘de guerra’, proporcionais aos ‘grandes objetivos e interesses’ ”17. Ou seja, sempre que existirem “grandes interesses antagônicos” (na luta de classes sempre existe isso) ou “grandes objetivos e interesses”, o “método” deve corresponder não às forças de que dispomos, mas sim à magnitude de nossos fins. É um bom momento para agradecer que esses generais não contem com um exército.
É lamentável constatar, compartilhando com Lenin, que na LER e em outros grupos afins à sua política e métodos “não há o menor indício de que compreendam a importância do problema da correlação de forças”18. Isso é impossível, pois, como escrevia Trotsky: “os escolásticos ultraesquerdistas não pensam em termos concretos, senão em abstrações vazias”.19
Na ofensiva ou na defensiva?
É preciso analisar, à luz dessas definições e ensinamentos de nossos mestres, que política a LER defendeu e defende ante o conflito na USP. Contrastar, como marxistas, suas propostas de ação com a realidade objetiva vivida pelo movimento estudantil da USP é fundamental para extrair as lições necessárias e poder continuar esta luta tão importante.
O primeiro é saber que este conflito se deu em um momento em que um amplo setor dos estudantes não se posicionava a favor das pautas do movimento estudantil. A base de apoio desta luta ainda era bastante limitada e a reitoria contava com o respaldo da opinião pública dentro e fora da universidade. Neste contexto político, a ocupação unilateral da reitoria dividiu o movimento e acabou colocando-o ainda mais na defensiva. Em vez de buscar outros meios para disputar a consciência dos estudantes e ganhá-los para a luta massiva e contundente contra Rodas–Alckmin–PM, a ultraesquerda tomou um caminho que só isolou ainda mais a luta, ao afastar dela muitos estudantes. Segundo dados do Datafolha publicados em 13 de novembro, 58% dos estudantes aprovam a presença da PM no campus e 57% têm mais confiança do que medo desse corpo repressivo. Por outro lado, 73% dos estudantes estavam contra aquela ocupação aventureira e 53% opinam que os estudantes que participaram devem ser punidos. Assim, fica evidente que o apoio à PM dentro do campus ainda é amplo. Inclusive entre aqueles que estão contra a presença da PM na USP, um setor considerável era contra a tática da ocupação. Realidade amarga, mas, no fim, realidade.
Porém, quando falamos de correlação de forças não falamos só de números. É verdade que as pesquisas de opinião não podem ser nosso único critério ou parâmetro e, como se sabe, é muito improvável conseguir na massa estudantil uma maioria absoluta a favor das bandeiras históricas do movimento. Por isso, além das pesquisas de opinião, é preciso determinar quem está politicamente na ofensiva e quem está na defensiva. Aqui cabe ser categórico e constatar que, até agora, quem está na ofensiva é a reitoria e o governo estadual. Nesse sentido, apesar dos esforços de resistência do movimento, a reitoria, com o apoio irrestrito do governo estadual e federal, tem conseguido implementar seu projeto, abrindo cursos pagos, aprofundando a entrada de empresas privadas na universidade, cometendo atos de corrupção, abrindo processos administrativos contra dezenas de militantes estudantis e sindicais etc. Isso ocorre, além do mais, porque a reitoria também está na ofensiva e bem posicionada diante da opinião pública, tendo respaldo para aplicar seus planos de maneira categórica e brutal.
A tarefa da vanguarda estudantil é, portanto, lutar para reverter essa correlação de forças – conquistando, antes de tudo, um apoio mais amplo dentro e fora da universidade – e proteger o movimento das ofensivas políticas e repressivas de Rodas–Alckmin–PM. Assim, era inaceitável colocar o movimento em risco. Após a desocupação da reitoria, a LER tentou atenuar sua responsabilidade política neste fato desastroso para o movimento estudantil dizendo que: “toda batalha implica em perigos” e que “as conquistas também abrem dificuldades até para o exército vitorioso”20. Esses delírios até poderiam nos fazer rir, se não estivéssemos com 73 estudantes processados, fruto dessa “conquista” de seu suposto “exército vitorioso”.
Depois da repressão, houve um crescimento no movimento estudantil, que se expressou em assembleias, atos e marchas com dois ou três mil estudantes e um cenário de menor isolamento dentro e fora da USP. Este novo momento, que é muito progressivo, é possível porque, embora 73% dos estudantes estivessem contra a ocupação, 46% também criticaram a agressividade policial. Os “excessos” e a “brutalidade” da PM (que, sinceramente, teve uma reação desproporcional diante de uma ocupação de menos de 100 estudantes) possibilitaram que um setor mais numeroso de estudantes se some e, em um movimento de solidariedade bastante comum nesses casos e por tratar-se de estudantes, pronunciaram-se intelectuais, professores, artistas e até alguns meios de comunicação começaram a moderar suas posições ultrarreacionárias. Mas sejamos claros: o que abriu um novo momento, que devemos aproveitar a fundo para fortalecer o movimento de conjunto, não foi a ocupação burocrática dos “estudantes combativos” – que quase nos liquida –, mas um erro político do inimigo. A discussão é se esses novos fatos e elementos configuraram uma mudança qualitativa na correlação de forças. Nós opinamos que não, opinamos que a luta continua sendo defensiva. A construção de grandes assembleias e atos é uma vitória dos estudantes da USP, que mostraram à reitoria e à sociedade que podem lutar unificadamente para defender a educação pública e a autonomia universitária; mas a correlação de forças se mantém. A luta é tão defensiva que, ainda que não tire esta conclusão, até a LER defende que a “prioridade” da luta é o fim dos processos conta os 73 ex-presos políticos. O centro, agora, deixou de ser o “!Fora Rodas, Fora PM!” para ser a defesa de nossos presos, isto é, não avançar “deixando para trás os mortos e feridos” de nosso exército, como eles mesmos escrevem em sua “nota militar”. O que pode ser mais defensivo que isso?
A concepção de “ações exemplares”
Queremos deixar claro que não concordamos com o raciocínio de que, quanto piores as coisas estão, há melhores condições para lutar. Não concordamos com a lógica de que, realizando “ações exemplares” ou gerando “fatos políticos” em que uma elite iluminada, que tudo sabe e tudo pode, esbanje heroísmo, sacrifício e inusitada valentia, as massas serão despertadas para a luta.
E o problema não é a ousadia ou a radicalização das ações. Estamos completamente a favor das ações mais radicalizadas da juventude e do resto do movimento de massas. O problema é quando essas ações radicalizadas são realizadas dando as costas (ou, o que é pior, contra) às massas e não se colocam a serviço de fortalecer o movimento social de conjunto. O problema é quando a ousadia, a temeridade e a coragem, que são indispensáveis em qualquer luta, estão simplesmente a serviço de agradar setores ultraesquerdistas que, desta forma, saciam suas necessidades de convencer a si mesmos que são os únicos “revolucionários”. É aí que a ultraesquerda demonstra um individualismo extremo e cruza caminho com o anarquismo, a quem Lenin denominava, com toda razão, “liberais com 40º de febre”.
A LER acusa o PSTU de ter se colocado contra as ocupações e a declaração imediata de greve estudantil (a qual, uma vez votada, nos jogamos com tudo para construir e fortalecer) porque teríamos uma estratégia que busca “ligar-se a setores mais amplos dos estudantes, adaptando-se ao senso comum pró-segurança elitista e privilegiando os espaços eleitorais (...)”21. Em contraposição, nossos estrategistas infalíveis dizem que, desde o princípio, trabalharam “(...) criando uma vanguarda pelo FORA PM que questionasse o caráter elitista da universidade e o papel que a polícia cumpre fora dela, privilegiando os métodos da luta de classes (ocupações e greve estudantil)”22. Duas questões: a primeira é que é verdade que o PSTU buscou e continua buscando chegar a setores “mais amplos” dos estudantes, mas não para se adaptar ao seu nível de consciência ou ao seu “senso comum”, e sim para fazer exatamente o contrário, para disputar sua consciência que hoje, verdade amarga e dolorosa de engolir, está majoritariamente com a política de Rodas-Alckmin-PM-Imprensa burguesa. Neste contexto, defendemos que é necessário acompanhar a disputa político-ideológica dentro do conjunto dos estudantes, com ações que ajudem a elevar seu nível de consciência, levantando o sistema de palavras de ordem corretas, no momento correto. Em outras palavras, seguindo a metodologia do Programa de Transição. Fazer o contrário, ou seja, trabalhar só com o programa máximo23, é abrir um abismo entre as massas e a própria luta, sem falar da vanguarda, que ficaria falando sozinha com a verdade na mão.
A segunda questão é que as “ocupações e a greve estudantil” não são os únicos “métodos da luta de classes”. Justamente porque estamos falando de táticas de luta, existem outras mil variantes que podem ser utilizadas se as condições para essas “ocupações e greve estudantil” não estiverem dadas nesse momento. O problema é quando não queremos ver a realidade (que quase nunca é a que alguém queria que fosse) e, para nos olhar satisfeitos no espelho ou girar em toro de nosso umbigo, começamos pelo final. A outra questão é que a vanguarda não é algo que se “cria”. Ela é um fenômeno que surge dos processos de luta reais, objetivos, e que reflete as características gerais desses processos.
Para a LER, não estar a favor dos “métodos da luta de classes”, que para seu parco esquema passam somente pelas ocupações ou ações mais radicalizadas, significa capitulação, traição, não ser “ousado” e adaptar-se às pressões do “senso comum”. Para nós, a ousadia não passa por lutar isolado. Isso, na verdade, significa ser suicida. Se fizéssemos isso, seríamos, como dizia Trotsky ao se referir a Stalin, meros e eficazes “organizadores de derrotas” para a nossa classe. Para nós, a questão é a oposta: quem realmente capitula ao “senso comum” das massas é aquele que não tem a ousadia –porque é preciso ser ousado e audaz para ir até a base e tentar convencer os estudantes ou as massas de uma determinada política! –, lidando com as contradições e disputando a consciência que, por ação da ideologia dominante, é geralmente atrasada e cheia de preconceitos de todo tipo. Na verdade e afinal de contas, o mais fácil é ficar isolado sem dar essa batalha, sem fazer esse trabalho cinzento, mas indispensável para o triunfo de qualquer luta e, chegado o momento, da própria revolução.
Nós defendemos o método das ocupações e das greves como ações legítimas do movimento estudantil e de qualquer outro setor do movimento de massas. Estas são questões táticas, isto é, que dependem das condições objetivas e subjetivas que tenhamos para aplicá-las e, sobretudo, sustentá-las. No entanto, não é por serem questões “táticas” que são assuntos menos importantes. No movimento operário, que tem pouco a ver com as características do movimento estudantil, uma greve ou ocupação mal medida custa a demissão a centenas de trabalhadores e até a prisão para os dirigentes.
Mas não coloquemos o exemplo do movimento operário, onde dá calafrios pensar o que pode chegar a fazer um grupo como a LER em posição de direção, e voltemos ao mundo do movimento estudantil. Por exemplo, a ocupação isolada empreendida pela LER e seus amigos não tem nada a ver com o processo de greves e ocupações das reitorias da USP, da Unesp e da Unicamp durante o primeiro semestre de 2007, as quais foram acompanhadas por uma verdadeira onda de ocupações e greves em todo o país. Este processo de luta – contra o decreto do ex-governador de São Paulo, o direitista José Serra, que criava a Secretaria de Educação Superior atentando contra a autonomia universitária, desconsiderando a pesquisa básica para favorecer a “operacional”, e ameaçando seriamente o financiamento das universidades brasileiras – envolveu, além de uma vanguarda numerosa, setores importantes da massa estudantil. A força do movimento conseguiu neutralizar a ação venenosa da imprensa e ganhar o apoio de importantes setores da sociedade. Não foi por acaso que esse movimento foi vitorioso e Serra não conseguiu que a PM (como Alckmin e Rodas conseguiram agora, graças ao isolamento) entrasse para reprimir essas ocupações, não porque lhe faltasse vontade, mas porque – eles, sim, consideram este tipo de coisas – não tinham uma correlação de forças favorável.
É assim que, para além de qualquer fraseologia altissonante e grandiloquente da qual tanto gostam os ultraesquerdistas, sua política concreta, por mais “radical” que soe ou pareça, termina servindo à burguesia e facilitando a vida, neste caso, para Rodas–Alckmin–PM. Eles aproveitaram o isolamento para reprimir violentamente e abrir um precedente nefasto na história do movimento estudantil.
No entanto, apesar dos planos de Rodas–Alckmin–PM e da política nefasta da ultraesquerda, a luta está em curso e nada está definido. Devemos continuar lutando com a mesma força e decisão de sempre. É necessário aproveitar este novo momento, disputar e ganhar politicamente a vanguarda gerada nesta luta para nossas bandeiras e dar uma batalha clara e paciente entre as massas estudantis. É indispensável manter nossas posições se queremos passar à ofensiva. Devemos também ter como aliados os sindicatos de professores, trabalhadores e o resto do movimento sindical e social brasileiro e internacional. Agora nós é que devemos isolar politicamente Rodas–Alckmin–PM. Toda a política do PSTU vai neste sentido, de fortalecer a luta e de cercá-la de solidariedade no movimento operário e social. Assim, podemos citar o caso de nossa posição no Sindicato de Metroviários de São Paulo, em que o PSTU propôs tanto o apoio político contra a presença da PM na USP como o apoio financeiro para a libertação efetiva dos estudantes presos. Fizemos esta defesa sabendo e apesar de existirem setores da base contrários a esta ação de solidariedade, devido obviamente à campanha demonizadora da imprensa burguesa, que se valeu muito das ações isoladas promovidas pela ultraesquerda.
Devemos e podemos fazer tudo isso para vencer. Porque os estudantes da USP precisam e podem vencer, apesar das forças da direita reacionária dentro e fora da USP e daqueles que padecem da doença do ultraesquerdismo.
Garantir uma vitória dos estudantes da USP é uma necessidade de todo o movimento que defende a educação pública. O primeiro passo é conquistar o arquivamento dos processos contra os 73 companheiros e companheiras que foram presos na ocupação da reitoria. Isto só se dará com base em uma ampla unidade democrática de todos os setores do movimento estudantil, dos trabalhadores e professores da universidade, que ousem disputar amplos setores dentro e fora da USP para empreender uma grande campanha.
Uma seita burocrática com moral stalinista
Não obstante, o que nos parece realmente grave e inaceitável não são nossas diferenças políticas. Estas, ainda que sejam de fundo e irreconciliáveis, passam para o segundo plano se comparadas ao método stalinista utilizado pela LER, em seu afã desesperado por diferenciar-se, de iniciar uma campanha de calúnias na contra o PSTU, acusando-o de ter feito um acordo com o reitor Rodas para liquidar a primeira ocupação da FFLCH. Em outra nota, assinada por Bruno Gilga, afirmam que o PSOL, quando houve o caso dos três estudantes que foram defendidos por seus companheiros, “cumpriu o ‘papel de polícia’ no movimento, ‘escoltando’ os estudantes até a viatura, contra os que queríamos expulsá-la”. Em seguida, envolve o PSTU nessa acusação dizendo, ao referir-se ao PSOL e a nosso partido, que “estas direções vão se reafirmando como uma ‘esquerda moderada’. Não lhes bastou entregar os estudantes à polícia (...)”24.
As acusações são gravíssimas. Se fossem verdadeiras, não estaríamos diante de “pelegos”, mas sim de colaboradores diretos do reitor e da polícia capitalista. Se a LER fosse consequente, deveria ter alertado o movimento estudantil, deveria ter colocado isso como primeiro e inevitável ponto das assembleias que vêm ocorrendo, deveria apresentar as provas (que para acusações desta magnitude devem ser contundentes e irrefutáveis) e deveria ter solicitado a imediata e direta expulsão de nossos companheiros e os do PSOL do DCE. A atitude de lutadores honestos e sérios deveria ter sido esta, pois, como é possível sequer discutir com agentes das forças repressivas, do reitor; com traidores da luta?
No entanto, não fizeram nada disso porque simplesmente não têm provas que sustentem essas acusações. Ao fazer esse tipo de acusações e amálgamas sem ter como prová-las ao movimento estudantil e à esquerda brasileira e mundial, os membros da LER transformam-se em caluniadores vulgares ao mais puro estilo stalinista. E tem mais. Em outra nota, criticando o suposto desprezo, por parte do PSTU, na defesa dos 73 presos da USP, insinuam de forma caluniosa que isso se devia ao fato de serem subproduto de uma tática (a ocupação da reitoria) com a qual não concordamos. Atrevem-se a dizer isto apesar não só de nossa posição incontestável de solidariedade aos companheiros, como também depois de ter sido a própria CSP–CONLUTAS, onde o PSTU cumpre um papel destacado, que pagou as fianças dos estudantes presos!
A baixeza dessas calúnias, amálgamas e insinuações é escandalosa. Reafirmamos plenamente, nesse sentido, a nota da Juventude do PSTU a respeito desses métodos: “A LER abandona assim as regras mais elementares da esquerda e empreende uma campanha vergonhosa, indigna, suja e mesquinha, com o único objetivo de combater nossas posições políticas. É a moral do vale tudo, que não tem nada em comum com os valores defendidos pela esquerda revolucionária e socialista, à qual a LER diz pertencer”25.
Apesar disso e ainda que seja repugnante, essa atitude não nos surpreende vindo de uma seita burocrática que, com gritos belicosos e alaridos infantis, termina sempre em posições oportunistas. Tal como escreveu Trotsky: “Para o sectário, todo aquele que trata de explicar-lhe que a participação ativa no movimento operário exige o estudo permanente da situação objetiva em vez dos conselhos altaneiros pronunciados a partir da tribuna professoral sectária, é um inimigo. Em lugar de dedicar-se a analisar a realidade, o sectário dedica-se às intrigas, rumores e histeria”26.
Nossa classe saberá julgar de forma implacável as posições políticas, os métodos e a moral desses charlatães com pose de revolucionários.
Notas:
1. No entanto, segundo dados publicados pelo Datafolha, 57% dos estudantes opina que, após a presença da polícia, a sensação de insegurança é a mesma.
2. Trotsky, Leon: Prólogo à edição polonesa do Esquerdismo, doença infantil do comunismo, de Lenin, escrito em outubro de 1932.
3. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” sobre as conquistas e novas contradições no movimento, publicado no site da LER–QI.
4. Idem.
5. Trotsky, Leon: Sectarismo, centrismo e a Quarta Internacional, escrito em outubro de 1935.
6. Idem.
7. DCE: Diretório Central dos Estudantes.
8. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” (....)
9. Idem.
10. Viskov, Natália: Transformar o comando de greve com delegados mandatados e revogáveis no organismo mais democrático de direção da luta, publicado no site da LER–QI.
11. Ventura, Leandro e Lisboa, Val: As lutas, assim como as guerras, são radicais quando os objetivos são radicais, publicado no site da LER–QI.
12. Idem.
13. Trotsky, Leon: Aprendam a pensar: Uma sugestão amistosa a certos ultraesquerdistas, escrito em maio de 1938.
14. Lenin, V. I.: Sobre a frase revolucionária, publicado na compilação denominada A política exterior do Estado Soviético. Editorial Progresso, Moscou, 1979, p. 35.
15. Ibidem, grifos no original.
16. Lenin, V. I.: Sobre o infantilismo “esquerdista” e o espírito pequeno-burguês, publicado na compilação denominada A política exterior do Estado Soviético. Editorial Progresso, Moscou, 1979, p. 80. Lenin refere-se ao capítulo XXV, A retirada para o interior do país, da sexta parte da obra de Von Clausewitz Da Guerra, em que fala dos problemas da defesa.
17. Ventura, Leandro: As lutas, bem como as guerras (…)
18. Lenin, V. I.: Sobre o do infantilismo “esquerdista” e o espírito pequeno-burguês (...)
19. Trotsky, Leon: Aprendam a pensar (…)
20. Ventura, Leandro: Grande ato e assembleia dos estudantes da USP: uma nota “militar” (...)
21. Fortalecer o comando de greve para expulsar a PM e revogar o convênio! Lutemos pela retirada do processo aos 73 presos da USP!, publicado no site da LER–QI.
22. Ibidem.
23. Por exemplo, a LER–QI nega-se a levantar uma saída alternativa ao problema da insegurança no campus da USP, apesar de que 79% dos estudantes tenham declarado que têm medo de circular no prédio universitário à noite. A palavra de ordem “Segurança sim, PM não”, seria, por parte do PSTU, “ceder ao senso comum” e “naturalizar” a presença da PM como um “mal necessário”. Defendem isso sabendo que nosso projeto de segurança alternativo parte do “Fora PM”.
24. Gilga, Bruno: Estudantes organizam massiva luta contra a polícia, publicado no site da Fração Trotskista.
25. Juventude do PSTU: Onde o ultraesquerdismo se encontra com o stalinismo, publicado no site do PSTU.
26. Trotsky, Leon: Sectarismo (…)
Retirado do Site do PSTU
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