Operação faz parte da política de militarização das favelas e criminalização da pobreza
Com cerca de 3 mil homens, com o Bope (Batalhão de Operações Especiais) à frente e a participação de veículos blindados da Marinha, a Secretaria de Segurança do Rio colocou em marcha, na madrugada de 12 para 13 de novembro, a cinematográfica operação “Choque da Paz”, que consistiu na tomada da Rocinha, Vidigal e Chácara do Céu, na Zona Sul da cidade.
A invasão, chamada de ‘pacificação’, contou ainda com um verdadeiro batalhão de jornalistas como retaguarda. Imagens veiculadas exaustivamente pelos telejornais reproduziam cenas que poderiam muito bem ter saído do Iraque, não fosse o cenário de barracos apinhados e ruelas estreitas da paisagem carioca.
Em uma cena montada para as grandes redes de TV, policiais hasteavam a bandeira do Brasil e a do Rio na favela, como símbolo da chegada do “Estado de Direito” à região. Consta que os policiais tiveram que esperar o final da corrida de Fórmula 1 para que a rede Globo pudesse transmitir ao vivo o “evento”. ‘A Rocinha é nossa’, estampou o jornal O Globo no dia seguinte à ocupação.
Militarização e criminalização da pobreza
A ocupação da Rocinha foi alardeada pelo conjunto da imprensa como um marco na gestão do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame, e do governo de Sérgio Cabral. Fecha-se um cinturão de favelas ocupadas ao redor de áreas nobres da cidade e abre-se caminho para a 19ª UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), já anunciada com 1.500 homens. A meta do governo Cabral é a criação de 40 UPP’s ao todo na cidade, com vistas à Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas de 2016, criando uma espécie de “zona verde” para seus amigos empresários desfrutarem das belezas do Rio.
O governo e a imprensa divulgam a ocupação militar na maior favela do país como uma ‘libertação’ dos cerca de 100 mil moradores da região. Com a tomada do controle do tráfico, agora os serviços públicos básicos poderiam chegar ao local. O prefeito Eduardo Paes já anunciou o aumento de 100 garis. “O grande desafio no primeiro momento é o lixo”, declarou à imprensa.
Paes e Cabral ignoram o histórico de abusos e violência que marcaram outras ocupações, como a do Complexo do Alemão em 2010, na qual os policiais deixaram um rastro de agressões e roubos. O furto aos domicílios foram tão freqüentes que começaram a ser chamados de ‘garimpo’ pelos próprios policiais, que se referiam às comunidades como ‘Serra Pelada’. As inúmeras denúncias realizadas pelos moradores, inclusive de um trabalhador que teve o seu Fundo de Garantia roubado, foram ignoradas.
Para não ocorrer novamente os mesmos escândalos, o governo Cabral adotou uma estratégia inusitada: os policiais foram proibidos de usar mochilas durante as operações na Rocinha. Isso mesmo, a solução para evitar que o “garimpo” se repetisse na Rocinha foi impedir... as mochilas.
Leva na mala
Na versão oficial, alardeada pela imprensa e o governo, a polícia e as Forças Armadas empreendem uma guerra contra o tráfico pelo controle das áreas das favelas. A realidade, por outro lado, não é tão maniqueísta. Recentemente, a prisão do homem apontado como o chefe do tráfico na Rocinha, o Nem, mostrou a relação entre o crime e a corporação. O traficante estava escondido no porta-malas de um carro escoltado por policiais, que até agora não conseguiram explicar o que faziam por lá.
O próprio Nem declarou em entrevista aquilo que todo mundo já sabe: metade de seu rendimento ia para subornar policiais. Suborno que necessitaria de centenas de mochilas para carregar. Como se impedir isso? Proibindo também o tráfego de veículos nas favelas?
Milícias
Quando não existe uma relação de cooperação pura e simples entre tráfico e polícia, existe uma relação de competição pelo controle da área e de serviços clandestinos como TV a cabo pirata e venda de gás. É aí que entram as milícias, associações de policiais que tomam determinada área para explorar seus moradores. A atuação das milícias nas áreas ocupadas do Rio é mais um elemento que mostra que a presença policial nas favelas não significa maior segurança ou qualquer tipo de vantagem à população.
Os traficantes podem não controlar hoje as áreas das três favelas ocupadas. Mas o consumo de drogas, principalmente das áreas nobres da Zona Sul do Rio, não vai acabar. Quem vai fornecer isso? Ninguém garante, por exemplo, que a própria polícia, através das atuais ou de novas milícias, não fique tentada a gerenciar um mercado tão lucrativo.
A tese de que os policiais envolvidos nas operações são novos e, assim, ainda não ‘contaminados’ pela corrupção que corrói a corporação tampouco é factível. A própria estrutura da polícia é viciada, com o alto escalão comprometido e articulado com a Justiça e políticos de expressão. Influência que torna as milícias, inclusive, ainda mais perigosa que o tráfico, com alto poder de pressão e retaliação. O assassinato da juíza Patrícia Acioli, em agosto último em Niterói, inclusive com o envolvimento de um comandante, mostrou a força desses bandidos fardados, que também ameaçam a vida do deputado Marcelo Freixo (PSOL).
Longe de ser uma medida contra o crime e em favor das populações pobres, a política de ocupação militar das comunidades do Rio faz parte de uma estratégia de militarização das favelas e de criminalização da pobreza, com o único objetivo de controlar aquelas áreas para garantir a tranqüilidade para a Copa e os Jogos Olímpicos. A população carente continuará no fogo cruzado entre traficantes e a polícia, enquanto lhes são negados serviços básicos como saúde, educação, saneamento e a mais básica infra-estrutura urbana.
E o governo Cabral, por sua vez, poderá prosseguir em sua política fascista de remoções e expulsão dos pobres das áreas visadas para os jogos.
Descriminalização das drogas e fim da polícia
O combate às drogas é apenas um pretexto para ocupar e reprimir as comunidades negras e pobres. Enquanto a polícia prende e exibe à imprensa os peixes pequenos, os grandes beneficiados pelo tráfico de drogas e armas estão bem longe das favelas. Políticos, juízes, a alta hierarquia da polícia gozam de absoluta imunidade enquanto a população se vê à mercê da violência dos bandidos e dos desmandos e abusos policiais.
Enquanto a produção e consumo de drogas forem proibidos, vai continuar havendo tráfico, violência e um pretexto para se atacar a população marginalizada. A única forma de se golpear o tráfico é através da descriminalização das drogas e seu controle através do Estado. Só assim se poderá tirar o monopólio que existe hoje, informalmente, dos grandes traficantes.
Da mesma forma, enquanto houver essa polícia que existe hoje, vai continuar existindo violência contra a população pobre e negra. A função desta polícia é a manutenção do status quo, da ordem atual, o que passa pela defesa dos interesses de quem está no poder. Por isso o PSTU defende a extinção da polícia e a criação de uma força de segurança popular, democrática, controlada pela população e que realmente defenda seus interesses e a sua segurança.
Retirado do Site do PSTU
Helicóptero sobrevoa favela no Rio |
A invasão, chamada de ‘pacificação’, contou ainda com um verdadeiro batalhão de jornalistas como retaguarda. Imagens veiculadas exaustivamente pelos telejornais reproduziam cenas que poderiam muito bem ter saído do Iraque, não fosse o cenário de barracos apinhados e ruelas estreitas da paisagem carioca.
Em uma cena montada para as grandes redes de TV, policiais hasteavam a bandeira do Brasil e a do Rio na favela, como símbolo da chegada do “Estado de Direito” à região. Consta que os policiais tiveram que esperar o final da corrida de Fórmula 1 para que a rede Globo pudesse transmitir ao vivo o “evento”. ‘A Rocinha é nossa’, estampou o jornal O Globo no dia seguinte à ocupação.
Militarização e criminalização da pobreza
A ocupação da Rocinha foi alardeada pelo conjunto da imprensa como um marco na gestão do Secretário de Segurança José Mariano Beltrame, e do governo de Sérgio Cabral. Fecha-se um cinturão de favelas ocupadas ao redor de áreas nobres da cidade e abre-se caminho para a 19ª UPP (Unidade de Polícia Pacificadora), já anunciada com 1.500 homens. A meta do governo Cabral é a criação de 40 UPP’s ao todo na cidade, com vistas à Copa do Mundo 2014 e as Olimpíadas de 2016, criando uma espécie de “zona verde” para seus amigos empresários desfrutarem das belezas do Rio.
O governo e a imprensa divulgam a ocupação militar na maior favela do país como uma ‘libertação’ dos cerca de 100 mil moradores da região. Com a tomada do controle do tráfico, agora os serviços públicos básicos poderiam chegar ao local. O prefeito Eduardo Paes já anunciou o aumento de 100 garis. “O grande desafio no primeiro momento é o lixo”, declarou à imprensa.
Paes e Cabral ignoram o histórico de abusos e violência que marcaram outras ocupações, como a do Complexo do Alemão em 2010, na qual os policiais deixaram um rastro de agressões e roubos. O furto aos domicílios foram tão freqüentes que começaram a ser chamados de ‘garimpo’ pelos próprios policiais, que se referiam às comunidades como ‘Serra Pelada’. As inúmeras denúncias realizadas pelos moradores, inclusive de um trabalhador que teve o seu Fundo de Garantia roubado, foram ignoradas.
Para não ocorrer novamente os mesmos escândalos, o governo Cabral adotou uma estratégia inusitada: os policiais foram proibidos de usar mochilas durante as operações na Rocinha. Isso mesmo, a solução para evitar que o “garimpo” se repetisse na Rocinha foi impedir... as mochilas.
Leva na mala
Na versão oficial, alardeada pela imprensa e o governo, a polícia e as Forças Armadas empreendem uma guerra contra o tráfico pelo controle das áreas das favelas. A realidade, por outro lado, não é tão maniqueísta. Recentemente, a prisão do homem apontado como o chefe do tráfico na Rocinha, o Nem, mostrou a relação entre o crime e a corporação. O traficante estava escondido no porta-malas de um carro escoltado por policiais, que até agora não conseguiram explicar o que faziam por lá.
O próprio Nem declarou em entrevista aquilo que todo mundo já sabe: metade de seu rendimento ia para subornar policiais. Suborno que necessitaria de centenas de mochilas para carregar. Como se impedir isso? Proibindo também o tráfego de veículos nas favelas?
Milícias
Quando não existe uma relação de cooperação pura e simples entre tráfico e polícia, existe uma relação de competição pelo controle da área e de serviços clandestinos como TV a cabo pirata e venda de gás. É aí que entram as milícias, associações de policiais que tomam determinada área para explorar seus moradores. A atuação das milícias nas áreas ocupadas do Rio é mais um elemento que mostra que a presença policial nas favelas não significa maior segurança ou qualquer tipo de vantagem à população.
Os traficantes podem não controlar hoje as áreas das três favelas ocupadas. Mas o consumo de drogas, principalmente das áreas nobres da Zona Sul do Rio, não vai acabar. Quem vai fornecer isso? Ninguém garante, por exemplo, que a própria polícia, através das atuais ou de novas milícias, não fique tentada a gerenciar um mercado tão lucrativo.
A tese de que os policiais envolvidos nas operações são novos e, assim, ainda não ‘contaminados’ pela corrupção que corrói a corporação tampouco é factível. A própria estrutura da polícia é viciada, com o alto escalão comprometido e articulado com a Justiça e políticos de expressão. Influência que torna as milícias, inclusive, ainda mais perigosa que o tráfico, com alto poder de pressão e retaliação. O assassinato da juíza Patrícia Acioli, em agosto último em Niterói, inclusive com o envolvimento de um comandante, mostrou a força desses bandidos fardados, que também ameaçam a vida do deputado Marcelo Freixo (PSOL).
Longe de ser uma medida contra o crime e em favor das populações pobres, a política de ocupação militar das comunidades do Rio faz parte de uma estratégia de militarização das favelas e de criminalização da pobreza, com o único objetivo de controlar aquelas áreas para garantir a tranqüilidade para a Copa e os Jogos Olímpicos. A população carente continuará no fogo cruzado entre traficantes e a polícia, enquanto lhes são negados serviços básicos como saúde, educação, saneamento e a mais básica infra-estrutura urbana.
E o governo Cabral, por sua vez, poderá prosseguir em sua política fascista de remoções e expulsão dos pobres das áreas visadas para os jogos.
Descriminalização das drogas e fim da polícia
O combate às drogas é apenas um pretexto para ocupar e reprimir as comunidades negras e pobres. Enquanto a polícia prende e exibe à imprensa os peixes pequenos, os grandes beneficiados pelo tráfico de drogas e armas estão bem longe das favelas. Políticos, juízes, a alta hierarquia da polícia gozam de absoluta imunidade enquanto a população se vê à mercê da violência dos bandidos e dos desmandos e abusos policiais.
Enquanto a produção e consumo de drogas forem proibidos, vai continuar havendo tráfico, violência e um pretexto para se atacar a população marginalizada. A única forma de se golpear o tráfico é através da descriminalização das drogas e seu controle através do Estado. Só assim se poderá tirar o monopólio que existe hoje, informalmente, dos grandes traficantes.
Da mesma forma, enquanto houver essa polícia que existe hoje, vai continuar existindo violência contra a população pobre e negra. A função desta polícia é a manutenção do status quo, da ordem atual, o que passa pela defesa dos interesses de quem está no poder. Por isso o PSTU defende a extinção da polícia e a criação de uma força de segurança popular, democrática, controlada pela população e que realmente defenda seus interesses e a sua segurança.
Retirado do Site do PSTU
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