terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

A Tragédia de Santa Maria: o lucro antes da vida

O que na lógica capitalista significa “redução de custos”, na vida significa um risco constante



População exige justiça
A madrugada do dia 27 de janeiro de 2013 ficará marcada na história internacional pela tragédia que silenciou centenas de jovens em uma boate da cidade de Santa Maria (RS), com mais de 235 mortos e 134 feridos. Primeiramente, gostaríamos de prestar nossa total solidariedade aos familiares e amigos das vítimas. As ações de solidariedade, muitas vezes espontâneas, em todo o país, na Argentina e Uruguai têm sido um belo exemplo de fraternidade, e certamente ajudaram a confortar os familiares e amigos das vítimas em um momento tão difícil.

O fato que comoveu o país e mobilizou a opinião pública está longe de ser uma "fatalidade", pois não restam dúvidas que poderia ser evitado. O incêndio da boate KISS representou uma combinação explosiva de ações criminosas, erros e omissões de empresários e governantes, gerando um grande desastre que afetará, por muitos anos, a vida de milhares de pessoas inocentes. A lógica do capital, de lucro a qualquer custo, e a dos governos, de favorecer os empresários, teve um efeito mortal em Santa Maria, no entanto essa é uma realidade de risco que os jovens e trabalhadores estão submetidos em todas as cidades do país.


Crônica de uma morte anunciada?

Parece até um cenário de uma peça que se encontra pronta para sua estréia: o fato do local ter somente uma saída e a porta ser de tamanho reduzido; o excesso de pessoas no local; artefatos incendiários em um ambiente inadequado para tal; uma espuma que revestia o teto que teria o seu custo reduzido; alvará vencido há 6 meses. São estes os principais argumentos veiculados na mídia para justificar o incêndio e as mortes na boate Kiss, um quadro de irregularidade que nos traz à tona o questionamento: como um espaço nestas condições ainda funcionava no centro da cidade?

Em meio ao luto de milhares de pessoas não são plausíveis justificativas que vão no sentido de uma “fatalidade”. A irregularidade está comprovada com mais de 235 mortos. Como um lugar pode se julgar capaz de abrigar mais de 1000 jovens sendo capaz de causar tal catástrofe? A indignação que brota em meio a uma grande tristeza é o combustível para que mais de 30 mil pessoas se juntassem em uma grande passeata pela cidade de Santa Maria (RS) na noite do dia 28 de janeiro.

Em nota de solidariedade aos familiares e amigos das vítimas de Santa Maria, a Associação dos Pais das Vítimas da tragédia de Cromañon (Argentina) afirma que “passam os anos e as histórias se repetem”. Em 2004, em um incêndio na boate Cromañon, de situações muito idênticas a de Santa Maria, 200 jovens perderam a vida. Após oito anos, parece-nos um filme que se repete.


O jogo do empurra-empurra dos governantes

Achar culpados não deve ser encarado como forma de encerrar tal caso investigativo. O sentimento da população e, principalmente, dos familiares das vitimas é de que se faça justiça. Deve se questionar a fundo tais responsabilidades. O que temos assistido nos últimos dias, com prisões preventivas e depoimentos, é um verdadeiro “empurra-empurra” diante da tragédia.

Não há espaço para isso! O prefeito Cesar Schirmer (PMDB) deve responder por que esta casa noturna possuía alvará para que continuasse a funcionar ou mesmo porque a mesma continuou funcionando com alvará vencido? Deve explicar por que fechou a boate do DCE da Federal de Santa Maria, organizado pelos estudantes, e não fechou a boate de empresários do ramo? Ao invés disso, o prefeito tem dito que nada sabe, que trata-se de uma fatalidade e tem jogado a culpa no Corpo de Bombeiros do RS.

O Governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, também tem que explicar o porquê do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul demorar tanto tempo para fazer vistorias ou mesmo por que permitiu a liberação do espaço da boate Kiss mesmo tendo apenas uma saída de emergência? A falta de investimentos no corpo de Bombeiros que se reflete em falta de pessoal também foi uma das causas do acidente. O estado não cumpriu seu dever de proteger a população.

Não basta chorar com as vítimas, exigimos do Governo Dilma que elabore uma lei nacional de fiscalização destes espaços e garanta que todas as boates sejam novamente inspecionadas a partir de regras muita mais rígidas. Não pode existir regras diferentes em diferentes estados.

A tecnologia da qual dispomos hoje torna o acontecimento algo que desmascara um nível de negligência absurdo das autoridades responsáveis pela fiscalização. Mas, o que juntamente a isso nos demonstra tal fato é que a ganância dos empresários também parece não conhecer limites, nem mesmo a própria vida foi respeitada. O que na lógica capitalista significa “redução de custos”, na materialidade da vida significa um risco constante.


Passeata por justiça reuniu 30 mil pessoas na cidade de Santa Maria


Punição dos culpados

A tragédia de Santa Maria foi causada por uma combinação de ações e omissões que vão desde empresários ambiciosos que colocam o lucro em primeiro lugar, uma banda irresponsável, negligência e omissão dos governantes e de um aparato de estado corrupto que não fiscaliza e não cumpre um papel de defender os interesses do povo, no qual quem manda são os grandes empresários.

Exigimos de imediato a saída do Prefeito de Santa Maria/RS, Cezar Schirmer, e a apuração dos fatos de maneira rigorosa. Incluindo também a responsabilidade do estado do Rio Grande do Sul e do Chefe do Corpo de Bombeiro de Santa Maria.

A apuração dos fatos deve ser feito em conjunto com uma comissão dos familiares das vítimas e sem segredo de justiça para garantir que de fato os responsáveis sejam punidos.

Devemos repetir o exemplo da tragédia de Cromañon na Argentina quando o movimento social organizado junto com os familiares das vítimas, através de uma grande mobilização social, conseguiu a punição dos culpados, inclusive do Prefeito de Buenos Aires.


Uma política de cultura e diversão para a população

Não é de hoje que os espaços de diversão e cultura estão sob o controle de empresários, não é de hoje que boa parte da população, principalmente a juventude, arrisca a vida para se divertir. A realidade brasileira é que as cidades estão repletas de comércios da diversão e raros espaços públicos que a população possa frequentar aos finais de semana ou em seus momentos reservados ao lazer.

A questão da mobilidade urbana nos principais centros urbanos brasileiros também é outro fator para que grande parte da juventude fique em guetos e seja impedida de viver a cidade e sair à noite. São raras linhas de transporte noturno e muitas vezes quando existem tornam-se perigosas pelo atual caos da segurança pública.

A juventude e a classe trabalhadora devem possuir o direito de produzir e usufruir das mais diversas fontes culturais, nosso acesso não pode mais estar ligado à interesses capitalista de produção que levam sempre à lógica da maior lucratividade. A juventude de Santa Maria sofreu com o fechamento de vários dos seus locais públicos de lazer e diversão. A mesma coisa acontece em Porto Alegre, como foi o caso do Araújo Viana. Devemos lutar pelo direito à cultura e lazer em espaços públicos, garantido pelo estado. Somente assim, esse será um direito de uma maioria.

  • Afastamento imediato do Prefeito de Santa Maria, Cezar Schirmer, do Chefe do Corpo de Bombeiros e investigação das responsabilidades dos governos estadual e municipal.
  • Punição para todos os responsáveis pelo incêndio como os sócios da boate Kiss e membros da banda.
  • Exigimos do Governo Dilma Roussef, a elaboração de uma lei federal que fiscalize sobre normas rígidas o funcionamento de boates e casas de espetáculo. Garantindo a fiscalização e cumprimento da lei.
  • Que o estado garanta espaços públicos para que a juventude e os trabalhadores tenham direito ao lazer, cultura e diversão.


  • Retirado do Site do PSTU

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