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Está tramitando no Congresso Nacional o projeto de Lei XXX que estabelece o novo PNE. O Plano Nacional de Educação é uma previsão constitucional, cujo objetivo é estabelecer diretrizes e metas para a educação em todos os níveis num período de 10 anos. Antes de analisarmos o conteúdo do novo plano é preciso fazer um balanço do antigo: o PNE 200 –2010 - Projeto de Lei 10 172/2001.
O que dizia o PNE 2001–2010 e o que ocorreu na prática?
O plano nacional de educação aprovado no Congresso Nacional em 2001 estabelecia 295 metas para o próximo decênio, entre elas estava a destinação de 7% do PIB (Produto Interno Bruto) para educação, a erradicação do analfabetismo, o combate à evasão escolar e a ampliação do acesso ao ensino superior. A análise comparativa de alguns dados sobre a educação brasileira já nos permite tirar conclusões:
O taxa de analfabetismo segue sendo muito alta, 9,7% em 2010. Em 2000, a taxa era de 13,6% e a meta do PNE era a erradicação do analfabetismo em 2010. A comparação com outros países da América Latina não deixa dúvidas sobre o tamanho do problema, no Uruguai, na Argentina e no Chile as taxas variam entre 2% e 4 %.
A evasão escolar aumentou. Entre 2006 e 2008, o índice passou de 10% para 13,2%. A meta do PNE era reduzir 5 % ao ano.
O número de jovens no ensino superior segue sendo muito baixo, 14,4% em 2009. A meta do PNE era chegar a 30 % dos jovens no ensino superior. Nesse ritmo, o país demoraria 59 anos para cumprir a meta. O Brasil também é campeão de exclusão neste aspecto, nos outros países da América Latina a porcentagem de jovens no ensino superior é muito maior: Argentina 40%, Chile 20,6%, Venezuela 26% e Bolívia 20,6%.
Na última década o ensino superior pago cresceu duas vezes mais do que o público. A meta do PNE era ofertar 40 % das vagas do ensino superior na rede pública, em 2002 esse índice era de 29% e em 2010 é de 25%.
A desigualdade no acesso ao ensino superior é altíssima. Apenas 5,6 % dos jovens que tem rendimentos mensais per capita de meio a um salário mínimo cursam o ensino superior. Para os jovens que se encontram na faixa de cinco salários mínimos ou mais, a porcentagem sobe 10 vezes: 55,6% cursam o ensino superior.
A implementação do PNE foi um fracasso, 2/3 das metas não foram cumpridas. O governo aponta uma série de motivos, excesso de metas, falta de indicadores que pudessem aferir o andamento das metas, falta de planejamento dos estados e municípios, etc. No entanto a opinião majoritária entre os especialistas, inclusive entre os que apóiam o governo, é que a razão central do fracasso foi a ausência de recursos. Veja abaixo o gráfico comparativo entre os recursos que foram de fato aplicados e o que deveria ter sido, segundo o antigo PNE:
O Governo de Fernando Henrique Cardoso vetou, já em 2001, a destinação de 7% do PIB para a educação. Durante os oito anos do Governo Lula, o veto foi mantido e o investimento em educação não chegou nem perto do previsto pelo PNE. A principal conclusão possível de chegar relação ao antigo PNE é que sem um investimento expressivo de recursos, o plano se tornou uma bela declaração de intenções sem viabilidade prática.
O novo PNE
Depois de uma década de ineficiência na solução de problemas cruciais da educação brasileira, o papel que o novo PNE deveria cumprir era o de estabelecer uma mudança profunda no investimento em educação. É preciso investir imediatamente 10 % do PIB e dar as bases para que a educação brasileira possa dar um salto. Sem isso o debate daqui a 10 anos será novamente a constatação de que estamos no mesmo lugar.
O novo PNE tem uma história muito distinta dos anteriores, a começar pela sua elaboração. A Conferência Nacional de Educação–CONAE reunida em Brasília em 2010 já não tem nenhuma semelhança com a Conferência de Belo Horizonte que elaborou o PNE – Proposta da Sociedade Brasileira em 1997. Organizada e totalmente controlada pelo MEC, a conferência reuniu representações dos empresários, do governo e dos trabalhadores. A Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, a Confederação Nacional dos Empresários e a Confederação Nacional da Indústria fizeram parte da Comissão Organizadora da CONAE, certamente esses sindicatos patronais não tem nenhum interesse comum com estudantes, trabalhadores em educação e movimentos sociais. Não têm sequer compromisso com a educação pública e com os interesses dos trabalhadores e do povo pobre brasileiro.
Muitas das entidades do movimento social presentes, CUT, UNE e UBES já não são mais as mesmas, em 1997, eram parte do movimento social combativo, formadoras de opinião crítica aos projetos neoliberais para a educação. Depois da chegada do PT ao Governo Federal, essas entidades não fizeram uma crítica sequer e apoiaram todos os projetos aprovados nos últimos oito anos, inclusive aqueles que se chocavam diretamente com o PNE da sociedade brasileira.
Mas o pior é que o governo não cumpriu nem as deliberações da conferência controlada por ele. A destinação de 10 % do PIB para educação, aprovada pela CONAE foi solenemente ignorada e no texto do novo PNE entrou apenas uma versão piorada do PNE anterior. Ou seja, o que era para ter sido o investimento anual em educação desde 2007, é a meta do Governo Dilma para 2020. Além disso, o PNE de 2001 definia claramente o percentual a ser acrescido a cada ano, 0,5 % do PIB nos quatro primeiros anos e 0,6 % em seguida. O novo PNE estabelece genericamente o prazo de 10 anos e no artigo 5° ainda abre a possibilidade de reavaliação da meta em 2014.
Enquanto o PNE 2001-2010 era um documento de 100 páginas dedicado a analisar a educação em seus distintos níveis estabelecendo objetivos e metas extensivas, o novo PNE é um documento de 14 páginas e 20 metas. A grande maioria delas é uma mera repetição das metas não cumpridas. O objetivo de incluir 30 % dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior em 2010 virou 33 % para 2020. A erradicação do analfabetismo e o atendimento de metade das crianças de 0 a 3 anos na educação infantil também ficaram para 2020.
Há também aquelas metas que apesar de não cumpridas, foram esquecidas e sequer são citadas no novo PNE, como a oferta de ao menos 40 % das vagas do ensino superior nas instituições públicas.
Entretanto, o problema do novo PNE não é somente a insuficiência das metas, mas a incorporação como uma política de estado de todos os projetos educacionais do governo Lula, que durante os últimos oito anos significaram uma verdadeira contra reforma da educação no Brasil. Vejamos cada um deles:
REUNI – Decreto 6096/07
Aprovado em abril de 2007, o Decreto 6096 institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI). O referido decreto segue o projeto educacional iniciado pelo governo Fernando Henrique Cardoso, tem como objetivo central “criar condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais”. Retomando as metas estabelecidas pelo Ministério da Educação no período de Paulo Renato/FHC, Fernando Haddad e Lula aprofundam os planos de “diversificação institucional”, desta vez de forma mais clara, não apenas com a expansão do ensino privado, mas através de um modelo a ser implantado nas universidades federais.
O decreto impõe uma série de metas a serem cumpridas pelas universidades federais e condiciona o recebimento de recursos ao cumprimento das metas. No prazo de cinco anos, as universidades têm que dobrar suas vagas na graduação com um acréscimo de apenas 20% das verbas.
A ANEL defende em seu programa a ampla expansão de vagas na educação superior pública com qualidade no ensino e assistência estudantil. Não temos que escolher entre expansão precarizada ou universidade elitizada. Por isso somos contra as metas do REUNI, que foram incorporadas no novo PNE e estendidas à educação profissional conforme demonstra o trecho que citamos abaixo:
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 11. Estratégia 11.10 Elevar gradualmente a taxa de conclusão média dos cursos técnicos de nível médio na rede federal de educação profissional, científica e tecnológica para 90% (noventa por cento) e elevar, nos cursos presenciais, a relação de alunos por professor para 20 (vinte), com base no incremento de programas de assistência estudantil e mecanismos de mobilidade acadêmica.
Meta 12. Estratégia 12.3 Elevar gradualmente a taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais nas universidades públicas para 90% (noventa por cento), ofertar um terço das vagas em cursos noturnos e elevar a relação de estudantes por professor para 18 (dezoito), mediante estratégias de aproveitamento de créditos e inovações acadêmicas que valorizem a aquisição de competências de nível superior.
O que significam essas duas metas:
Elevar a taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais nas universidades públicas para 90%.
Elevar para 90% a taxa de conclusão média dos cursos de graduação significa que numa determinada universidade o número de concluintes num determinado ano tem que ser 90% do número de estudantes ingressantes 5 anos antes. É um número muito alto: no Brasil essa média é hoje 60%. Nos Estados Unidos, essa taxa é de 66%, na Suécia 48%, o único país do mundo cuja taxa de diplomação é aproximadamente 90% é o Japão, que tem condições culturais e econômicas bastante distintas das nossas. Essa meta abre o caminho para políticas de aprovação automática e incentiva a implementação de cursos de menor duração. Por outro lado, o governo não incentiva a criação de mecanismos para a queda na evasão, já que o que importa são os alunos que no final ficam na universidade, ou seja, não cabe às estatísticas avaliarem se os alunos evadidos são substituídos por meio de transferências, o que importa são os números atingidos no final.
Elevar a relação de estudantes por professor para 18 (dezoito) nas federais e para 20 nos cursos técnicos federais. Pode não parecer muito um professor para 18 alunos, já que nas salas de aula geralmente têm bem mais que isso. Mas hoje, a relação professor aluno nas universidades federais é de 10,4 e na realidade já faltam professores, ou seja, é impossível elevar a relação professor aluno atual sem precarizar a educação. Para concretizar essa meta as atividades de pesquisa e extensão têm que diminuir e o número de estudantes em sala de aula aumentar. No documento que estabelece as Diretrizes Gerais para o REUNI o MEC prevê uma média de 45 alunos por sala de aula. No entanto, isso é uma média, como determinadas disciplinas que necessitam de um número reduzido de alunos em sala, como as de laboratório, 10 ou 20, outras classes teriam mais de 100 estudantes, como já acontece em diversas universidades.
SINAES/ENADE
A Lei 10861 de 2004 institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE como uma das formas de avaliação.
O projeto de avaliação foi um dos primeiros passos dados pelo governo na Reforma Universitária, é um mecanismo regulação-supervisão do governo e considera como critério de avaliação à aplicação dos demais projetos da reforma universitária. Assim, serão bem avaliadas as instituições que tiverem boas relações com o mercado, conforme determina a Lei e Inovação Tecnológica e o Decreto das Fundações; bom desempenho, entendido como uma competição entre as instituições; responsabilidade social, como fazer parte do ProUni; gestão nos moldes do governo, com maioria de docentes nos conselhos, criação de Conselhos com a participação da “sociedade civil”, etc. O SINAES é portanto um mecanismo de subordinação das universidades aos projetos do Governo Federal.
O ENADE substituiu o Provão do Governo FHC. É uma prova obrigatória feita por todos os estudantes no início e no final do curso, quem não comparecer não recebe o diploma. O ENADE permite o ranqueamento das universidades, a divulgação dos números é parte do marketing das grandes empresas da educação e muitas faculdades pagas chegam a dar cursos preparatórios para as provas.
Texto do PNE 2010–2020:Meta 13. Estratégia 13.1 Aprofundar e aperfeiçoar o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES, de que trata a Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, fortalecendo as ações de avaliação, regulação e supervisão.
Meta 13. Estratégia 13.2 Ampliar a cobertura do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes - ENADE, de modo a que mais estudantes, de mais áreas, sejam avaliados no que diz respeito à aprendizagem resultante da graduação.
Expansão do FIES para educação profissional e para a pós-graduação.
O FIES - Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES foi criado pelo Governo FHC ampliado pelo governo Lula e agora expandido ao nível técnico e à pós graduação pelo novo PNE. É um mecanismo de transferência direta de dinheiro público para o ensino pago. O Governo paga para a instituição privada na forma de empréstimo ao estudante, que restitui o valor à caixa econômica federal depois de formado. As instituições privadas sofrem com altos índices de inadimplência e o FIES, junto com o PROUNI, são fontes de recursos certos para essas empresas e o estudante além de ter acesso a cursos de baixa qualidade ainda se formam com uma dívida colossal que os acompanha pelo dobro do tempo do curso (em média 10 anos).
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 12. Estratégia 12.6 Expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES, de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, por meio da constituição de fundo garantidor do financiamento de forma a dispensar progressivamente a exigência de fiador.
Meta 11. Estratégia 11.6 Expandir a oferta de financiamento estudantil à educação profissional técnica de nível médio oferecidas em instituições privadas de educação superior.
Meta 14. Estratégia 14.3 Expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES, de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, à pós-graduação stricto sensu, especialmente ao mestrado profissional.
Novo ENEM
Utilizar o Exame Nacional do Ensino Médio como critério de acesso ao ensino superior foi um dos últimos projetos implementados pelo governo Lula. A aplicação do exame foi um desastre logístico, as provas foram roubadas, o SISU (Sistema de Seleção Unificada) divulgou resultados errados, o caderno de respostas foi trocado, etc. Sem dúvida o vestibular precisa acabar, mas a idéia de distribuir todas as vagas entre todos os estudantes do país não é menos excludente, nem menos meritocrática. Os melhores passam nas melhores vagas e quem tem mais dinheiro tem mais condições de estudar, seja perto, seja longe de casa. Democratizar o ensino superior através de uma nova prova unificada é uma demagogia, não vai à raiz de nenhum dos problemas do ensino superior. O que justifica a necessidade do vestibular é a alta competição pelas vagas e o baixíssimo número de vagas oferecidas no ensino superior. Enquanto essa contradição se mantiver, nenhuma mudança na forma de seleção resolve o modelo excludente que separa os ingressantes do ensino médio de uma vaga no ensino superior. Além disso, a ausência de políticas de assistência estudantil impede ou no mínimo dificulta muito que a mobilidade estudantil seja uma realidade para os estudantes de baixa renda.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 3. Estratégia 3.3 Utilizar exame nacional do ensino médio como critério de acesso à educação superior, fundamentado em matriz de referência do conteúdo curricular do ensino médio e em técnicas estatísticas e psicométricas que permitam a comparabilidade dos resultados do exame.
Mestrado e Doutorado à distância
A criação da Universidade Aberta do Brasil e com ela milhares de vagas no ensino a distância foi a principal forma de expansão do ensino superior nos últimos oito anos. O ensino à distância na rede pública cresceu 10.410% e 503% na rede privada. O PNE segue a mesma lógica e expande o ensino à distância para o mestrado e o doutorado. A comparação neste aspecto entre o novo PNE e o antigo revela as diferenças entre ambos, no PNE 2001-2010, o tema do ensino à distância era tratado no marco do uso de tecnologias para a aprendizagem ressalvadas explicitamente que as mesmas não deveriam substituir a relação aluno – professor: “A televisão, o vídeo, o rádio e o computador constituem importantes instrumentos pedagógicos auxiliares, não devendo substituir, no entanto, as relações de comunicação e interação direta entre educador e educando.”
Também neste aspecto o governo não cumpriu o PNE anterior, já que substituiu totalmente a interação direta entre educador e educando, formando milhares de professores e futuramente formará doutores que nunca entraram numa sala de aula. O novo PNE incorpora e amplia a Universidade Aberta do Brasil.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 14. Estratégia 14.4 Expandir a oferta de cursos de pós-graduação stricto sensu utilizando metodologias, recursos e tecnologias de educação à distância, inclusive por meio do Sistema Universidade Aberta do Brasil-UAB.
PRONATEC
O número de matrículas no ensino técnico cresceu 74,9 % nos últimos anos, chegando a 1,14 milhão. Essas vagas foram criadas em função das demandas da grande indústria que aumentou com o crescimento econômico. O PRONATEC é um programa elaborado pelo Governo Dilma em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). A proposta do programa é oferecer bolsas e financiamento estudantil em troca da isenção de impostos. É uma versão ainda mais privatizante que o PROUNI, com envio direto de dinheiro para o setor privado, não somente via isenção de impostos. Através do BNDES, o governo pretende oferecer financiamento ao Sistema S (SENAI, SESC, SESI, SENAC). Em contrapartida os estudantes do ensino médio de escolas públicas poderão fazer cursos gratuitos no horário em que não estão na escola. A previsão é atender 1,6 milhão de alunos no programa. O orçamento deste ano será de 1 bilhão, ou seja 1/3 do que foi cortado da educação pública.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 11. Estratégia 11.5 Ampliar a oferta de matrículas gratuitas de educação profissional técnica de nível médio pelas entidades privadas de formação profissional vinculadas ao sistema sindical.
Não ao PNE do governo!
O movimento social da educação, que se manteve comprometido com os interesses dos trabalhadores, passou os últimos oito anos combatendo esses projetos. Muitos deles enfrentaram resistência ampla na comunidade acadêmica nas universidades. O REUNI em especial, foi imposto por decreto e para ser aprovado nos conselhos universitários enfrentou dezenas de ocupações de reitoria e contou com a repressão policial e todo tipo de manobra.
O governo Lula fez uma verdadeira contra reforma do ensino superior apresentando cada projeto de forma fatiada e contanto como fiel aliado a grande maioria das entidades tradicionais do movimento estudantil e sindical. No entanto, muitos estudantes, professores e servidores resistiram e durante esses 8 anos batalharam pela formação de uma opinião crítica à mercantilização da educação brasileira, à destinação de verba pública para a educação privada, ao sucateamento das universidades públicas e à transformação da educação em um serviço. Pela primeira vez o governo apresentou a sua contra reforma sistematizada, num projeto único, através do Plano Nacional de Educação. Não nos calarão. É hora de começar uma grande campanha em defesa da educação que queremos, contra o PNE governista e pela destinação imediata de 10 % do PIB para a educação.
Retirado do Site do PSTU
Está tramitando no Congresso Nacional o projeto de Lei XXX que estabelece o novo PNE. O Plano Nacional de Educação é uma previsão constitucional, cujo objetivo é estabelecer diretrizes e metas para a educação em todos os níveis num período de 10 anos. Antes de analisarmos o conteúdo do novo plano é preciso fazer um balanço do antigo: o PNE 200 –2010 - Projeto de Lei 10 172/2001.
O que dizia o PNE 2001–2010 e o que ocorreu na prática?
O plano nacional de educação aprovado no Congresso Nacional em 2001 estabelecia 295 metas para o próximo decênio, entre elas estava a destinação de 7% do PIB (Produto Interno Bruto) para educação, a erradicação do analfabetismo, o combate à evasão escolar e a ampliação do acesso ao ensino superior. A análise comparativa de alguns dados sobre a educação brasileira já nos permite tirar conclusões:
A implementação do PNE foi um fracasso, 2/3 das metas não foram cumpridas. O governo aponta uma série de motivos, excesso de metas, falta de indicadores que pudessem aferir o andamento das metas, falta de planejamento dos estados e municípios, etc. No entanto a opinião majoritária entre os especialistas, inclusive entre os que apóiam o governo, é que a razão central do fracasso foi a ausência de recursos. Veja abaixo o gráfico comparativo entre os recursos que foram de fato aplicados e o que deveria ter sido, segundo o antigo PNE:
O Governo de Fernando Henrique Cardoso vetou, já em 2001, a destinação de 7% do PIB para a educação. Durante os oito anos do Governo Lula, o veto foi mantido e o investimento em educação não chegou nem perto do previsto pelo PNE. A principal conclusão possível de chegar relação ao antigo PNE é que sem um investimento expressivo de recursos, o plano se tornou uma bela declaração de intenções sem viabilidade prática.
O novo PNE
Depois de uma década de ineficiência na solução de problemas cruciais da educação brasileira, o papel que o novo PNE deveria cumprir era o de estabelecer uma mudança profunda no investimento em educação. É preciso investir imediatamente 10 % do PIB e dar as bases para que a educação brasileira possa dar um salto. Sem isso o debate daqui a 10 anos será novamente a constatação de que estamos no mesmo lugar.
O novo PNE tem uma história muito distinta dos anteriores, a começar pela sua elaboração. A Conferência Nacional de Educação–CONAE reunida em Brasília em 2010 já não tem nenhuma semelhança com a Conferência de Belo Horizonte que elaborou o PNE – Proposta da Sociedade Brasileira em 1997. Organizada e totalmente controlada pelo MEC, a conferência reuniu representações dos empresários, do governo e dos trabalhadores. A Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino, a Confederação Nacional dos Empresários e a Confederação Nacional da Indústria fizeram parte da Comissão Organizadora da CONAE, certamente esses sindicatos patronais não tem nenhum interesse comum com estudantes, trabalhadores em educação e movimentos sociais. Não têm sequer compromisso com a educação pública e com os interesses dos trabalhadores e do povo pobre brasileiro.
Muitas das entidades do movimento social presentes, CUT, UNE e UBES já não são mais as mesmas, em 1997, eram parte do movimento social combativo, formadoras de opinião crítica aos projetos neoliberais para a educação. Depois da chegada do PT ao Governo Federal, essas entidades não fizeram uma crítica sequer e apoiaram todos os projetos aprovados nos últimos oito anos, inclusive aqueles que se chocavam diretamente com o PNE da sociedade brasileira.
Mas o pior é que o governo não cumpriu nem as deliberações da conferência controlada por ele. A destinação de 10 % do PIB para educação, aprovada pela CONAE foi solenemente ignorada e no texto do novo PNE entrou apenas uma versão piorada do PNE anterior. Ou seja, o que era para ter sido o investimento anual em educação desde 2007, é a meta do Governo Dilma para 2020. Além disso, o PNE de 2001 definia claramente o percentual a ser acrescido a cada ano, 0,5 % do PIB nos quatro primeiros anos e 0,6 % em seguida. O novo PNE estabelece genericamente o prazo de 10 anos e no artigo 5° ainda abre a possibilidade de reavaliação da meta em 2014.
Enquanto o PNE 2001-2010 era um documento de 100 páginas dedicado a analisar a educação em seus distintos níveis estabelecendo objetivos e metas extensivas, o novo PNE é um documento de 14 páginas e 20 metas. A grande maioria delas é uma mera repetição das metas não cumpridas. O objetivo de incluir 30 % dos jovens de 18 a 24 anos no ensino superior em 2010 virou 33 % para 2020. A erradicação do analfabetismo e o atendimento de metade das crianças de 0 a 3 anos na educação infantil também ficaram para 2020.
Há também aquelas metas que apesar de não cumpridas, foram esquecidas e sequer são citadas no novo PNE, como a oferta de ao menos 40 % das vagas do ensino superior nas instituições públicas.
Entretanto, o problema do novo PNE não é somente a insuficiência das metas, mas a incorporação como uma política de estado de todos os projetos educacionais do governo Lula, que durante os últimos oito anos significaram uma verdadeira contra reforma da educação no Brasil. Vejamos cada um deles:
Aprovado em abril de 2007, o Decreto 6096 institui o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI). O referido decreto segue o projeto educacional iniciado pelo governo Fernando Henrique Cardoso, tem como objetivo central “criar condições para a ampliação do acesso e permanência na educação superior, no nível de graduação, pelo melhor aproveitamento da estrutura física e de recursos humanos existentes nas universidades federais”. Retomando as metas estabelecidas pelo Ministério da Educação no período de Paulo Renato/FHC, Fernando Haddad e Lula aprofundam os planos de “diversificação institucional”, desta vez de forma mais clara, não apenas com a expansão do ensino privado, mas através de um modelo a ser implantado nas universidades federais.
O decreto impõe uma série de metas a serem cumpridas pelas universidades federais e condiciona o recebimento de recursos ao cumprimento das metas. No prazo de cinco anos, as universidades têm que dobrar suas vagas na graduação com um acréscimo de apenas 20% das verbas.
A ANEL defende em seu programa a ampla expansão de vagas na educação superior pública com qualidade no ensino e assistência estudantil. Não temos que escolher entre expansão precarizada ou universidade elitizada. Por isso somos contra as metas do REUNI, que foram incorporadas no novo PNE e estendidas à educação profissional conforme demonstra o trecho que citamos abaixo:
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 11. Estratégia 11.10 Elevar gradualmente a taxa de conclusão média dos cursos técnicos de nível médio na rede federal de educação profissional, científica e tecnológica para 90% (noventa por cento) e elevar, nos cursos presenciais, a relação de alunos por professor para 20 (vinte), com base no incremento de programas de assistência estudantil e mecanismos de mobilidade acadêmica.
Meta 12. Estratégia 12.3 Elevar gradualmente a taxa de conclusão média dos cursos de graduação presenciais nas universidades públicas para 90% (noventa por cento), ofertar um terço das vagas em cursos noturnos e elevar a relação de estudantes por professor para 18 (dezoito), mediante estratégias de aproveitamento de créditos e inovações acadêmicas que valorizem a aquisição de competências de nível superior.
O que significam essas duas metas:
Elevar para 90% a taxa de conclusão média dos cursos de graduação significa que numa determinada universidade o número de concluintes num determinado ano tem que ser 90% do número de estudantes ingressantes 5 anos antes. É um número muito alto: no Brasil essa média é hoje 60%. Nos Estados Unidos, essa taxa é de 66%, na Suécia 48%, o único país do mundo cuja taxa de diplomação é aproximadamente 90% é o Japão, que tem condições culturais e econômicas bastante distintas das nossas. Essa meta abre o caminho para políticas de aprovação automática e incentiva a implementação de cursos de menor duração. Por outro lado, o governo não incentiva a criação de mecanismos para a queda na evasão, já que o que importa são os alunos que no final ficam na universidade, ou seja, não cabe às estatísticas avaliarem se os alunos evadidos são substituídos por meio de transferências, o que importa são os números atingidos no final.
A Lei 10861 de 2004 institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES e o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE como uma das formas de avaliação.
O projeto de avaliação foi um dos primeiros passos dados pelo governo na Reforma Universitária, é um mecanismo regulação-supervisão do governo e considera como critério de avaliação à aplicação dos demais projetos da reforma universitária. Assim, serão bem avaliadas as instituições que tiverem boas relações com o mercado, conforme determina a Lei e Inovação Tecnológica e o Decreto das Fundações; bom desempenho, entendido como uma competição entre as instituições; responsabilidade social, como fazer parte do ProUni; gestão nos moldes do governo, com maioria de docentes nos conselhos, criação de Conselhos com a participação da “sociedade civil”, etc. O SINAES é portanto um mecanismo de subordinação das universidades aos projetos do Governo Federal.
O ENADE substituiu o Provão do Governo FHC. É uma prova obrigatória feita por todos os estudantes no início e no final do curso, quem não comparecer não recebe o diploma. O ENADE permite o ranqueamento das universidades, a divulgação dos números é parte do marketing das grandes empresas da educação e muitas faculdades pagas chegam a dar cursos preparatórios para as provas.
Texto do PNE 2010–2020:Meta 13. Estratégia 13.1 Aprofundar e aperfeiçoar o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior - SINAES, de que trata a Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, fortalecendo as ações de avaliação, regulação e supervisão.
Meta 13. Estratégia 13.2 Ampliar a cobertura do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes - ENADE, de modo a que mais estudantes, de mais áreas, sejam avaliados no que diz respeito à aprendizagem resultante da graduação.
O FIES - Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior – FIES foi criado pelo Governo FHC ampliado pelo governo Lula e agora expandido ao nível técnico e à pós graduação pelo novo PNE. É um mecanismo de transferência direta de dinheiro público para o ensino pago. O Governo paga para a instituição privada na forma de empréstimo ao estudante, que restitui o valor à caixa econômica federal depois de formado. As instituições privadas sofrem com altos índices de inadimplência e o FIES, junto com o PROUNI, são fontes de recursos certos para essas empresas e o estudante além de ter acesso a cursos de baixa qualidade ainda se formam com uma dívida colossal que os acompanha pelo dobro do tempo do curso (em média 10 anos).
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 12. Estratégia 12.6 Expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES, de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, por meio da constituição de fundo garantidor do financiamento de forma a dispensar progressivamente a exigência de fiador.
Meta 11. Estratégia 11.6 Expandir a oferta de financiamento estudantil à educação profissional técnica de nível médio oferecidas em instituições privadas de educação superior.
Meta 14. Estratégia 14.3 Expandir o financiamento estudantil por meio do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior - FIES, de que trata a Lei nº 10.260, de 12 de julho de 2001, à pós-graduação stricto sensu, especialmente ao mestrado profissional.
Utilizar o Exame Nacional do Ensino Médio como critério de acesso ao ensino superior foi um dos últimos projetos implementados pelo governo Lula. A aplicação do exame foi um desastre logístico, as provas foram roubadas, o SISU (Sistema de Seleção Unificada) divulgou resultados errados, o caderno de respostas foi trocado, etc. Sem dúvida o vestibular precisa acabar, mas a idéia de distribuir todas as vagas entre todos os estudantes do país não é menos excludente, nem menos meritocrática. Os melhores passam nas melhores vagas e quem tem mais dinheiro tem mais condições de estudar, seja perto, seja longe de casa. Democratizar o ensino superior através de uma nova prova unificada é uma demagogia, não vai à raiz de nenhum dos problemas do ensino superior. O que justifica a necessidade do vestibular é a alta competição pelas vagas e o baixíssimo número de vagas oferecidas no ensino superior. Enquanto essa contradição se mantiver, nenhuma mudança na forma de seleção resolve o modelo excludente que separa os ingressantes do ensino médio de uma vaga no ensino superior. Além disso, a ausência de políticas de assistência estudantil impede ou no mínimo dificulta muito que a mobilidade estudantil seja uma realidade para os estudantes de baixa renda.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 3. Estratégia 3.3 Utilizar exame nacional do ensino médio como critério de acesso à educação superior, fundamentado em matriz de referência do conteúdo curricular do ensino médio e em técnicas estatísticas e psicométricas que permitam a comparabilidade dos resultados do exame.
A criação da Universidade Aberta do Brasil e com ela milhares de vagas no ensino a distância foi a principal forma de expansão do ensino superior nos últimos oito anos. O ensino à distância na rede pública cresceu 10.410% e 503% na rede privada. O PNE segue a mesma lógica e expande o ensino à distância para o mestrado e o doutorado. A comparação neste aspecto entre o novo PNE e o antigo revela as diferenças entre ambos, no PNE 2001-2010, o tema do ensino à distância era tratado no marco do uso de tecnologias para a aprendizagem ressalvadas explicitamente que as mesmas não deveriam substituir a relação aluno – professor: “A televisão, o vídeo, o rádio e o computador constituem importantes instrumentos pedagógicos auxiliares, não devendo substituir, no entanto, as relações de comunicação e interação direta entre educador e educando.”
Também neste aspecto o governo não cumpriu o PNE anterior, já que substituiu totalmente a interação direta entre educador e educando, formando milhares de professores e futuramente formará doutores que nunca entraram numa sala de aula. O novo PNE incorpora e amplia a Universidade Aberta do Brasil.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 14. Estratégia 14.4 Expandir a oferta de cursos de pós-graduação stricto sensu utilizando metodologias, recursos e tecnologias de educação à distância, inclusive por meio do Sistema Universidade Aberta do Brasil-UAB.
O número de matrículas no ensino técnico cresceu 74,9 % nos últimos anos, chegando a 1,14 milhão. Essas vagas foram criadas em função das demandas da grande indústria que aumentou com o crescimento econômico. O PRONATEC é um programa elaborado pelo Governo Dilma em parceria com a Confederação Nacional da Indústria (CNI). A proposta do programa é oferecer bolsas e financiamento estudantil em troca da isenção de impostos. É uma versão ainda mais privatizante que o PROUNI, com envio direto de dinheiro para o setor privado, não somente via isenção de impostos. Através do BNDES, o governo pretende oferecer financiamento ao Sistema S (SENAI, SESC, SESI, SENAC). Em contrapartida os estudantes do ensino médio de escolas públicas poderão fazer cursos gratuitos no horário em que não estão na escola. A previsão é atender 1,6 milhão de alunos no programa. O orçamento deste ano será de 1 bilhão, ou seja 1/3 do que foi cortado da educação pública.
Texto do PNE 2010 – 2020:
Meta 11. Estratégia 11.5 Ampliar a oferta de matrículas gratuitas de educação profissional técnica de nível médio pelas entidades privadas de formação profissional vinculadas ao sistema sindical.
Não ao PNE do governo!
O movimento social da educação, que se manteve comprometido com os interesses dos trabalhadores, passou os últimos oito anos combatendo esses projetos. Muitos deles enfrentaram resistência ampla na comunidade acadêmica nas universidades. O REUNI em especial, foi imposto por decreto e para ser aprovado nos conselhos universitários enfrentou dezenas de ocupações de reitoria e contou com a repressão policial e todo tipo de manobra.
O governo Lula fez uma verdadeira contra reforma do ensino superior apresentando cada projeto de forma fatiada e contanto como fiel aliado a grande maioria das entidades tradicionais do movimento estudantil e sindical. No entanto, muitos estudantes, professores e servidores resistiram e durante esses 8 anos batalharam pela formação de uma opinião crítica à mercantilização da educação brasileira, à destinação de verba pública para a educação privada, ao sucateamento das universidades públicas e à transformação da educação em um serviço. Pela primeira vez o governo apresentou a sua contra reforma sistematizada, num projeto único, através do Plano Nacional de Educação. Não nos calarão. É hora de começar uma grande campanha em defesa da educação que queremos, contra o PNE governista e pela destinação imediata de 10 % do PIB para a educação.
Retirado do Site do PSTU
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