Julgamento ocorre junto a perseguidos do MOMSP, o Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo
"O Estado brasileiro, oficialmente, pede desculpas pela
violência e arbitrariedades cometidas durante o período de exceção e
concede anistia política". As palavras do presidente da Comissão de
Anistia do Ministério da Justiça, Paulo Abrão foram ouvidas pelos
metalúrgicos do antigo Movimento de Oposição Metalúrgica de São Paulo, o
MOMSP, na tarde desse dia oito de dezembro na capital paulista.
Em um julgamento histórico que emocionou todos os presentes no Memorial da Resistência, antigo prédio do Deops, o Estado reconheceu as perseguições infligidas durante a ditadura, concedendo anistia política e reparação financeira aos ex-metalúrgicos, entre eles três membros da então Convergência Socialista: Luiz Carlos Prates, o Mancha, Alexandre Fusco e Antônio Fernandes Neto.
Também receberam anistia naquela tarde os ex-operários Sebastião Neto, Jorge Luiz dos Santos, Iria Molina, Salvador Pires, Maria Arleide Alves e João Prado de Andrade.
Resgate da luta operária contra a ditadura
O julgamento dos pedidos de anistia do MOMSP faz parte da 66ª Caravana da Comissão de Anistia, cujo objetivo é promover o desfecho dos processos de anistia de forma itinerante e mais próxima de onde os fatos ocorreram. "Nosso dever é de não apenas conceder anistia, mas promover aqui um ato de memória e de resgate histórico", afirmou Paulo Abrão logo no início dos trabalhos. Assim, o julgamento se tornou um ato de resgate da luta operária contra a ditadura, de denúncia às perseguições e à repressão do regime militar e também de homenagem aos mártires. A filha de Santo Dias, operário assassinado pela ditadura em 1979, Luciana Dias, foi convidada e prestou uma homenagem seu pai e todos os resistentes que tombaram na luta contra o regime de exceção.
O ex-dirigente do MOMSP, Waldemar Rossi, relembrou a repressão da ditadura contra a classe operária. "Uma das primeiras ações da ditadura foi intervir nos sindicatos e reprimir a classe trabalhadora", afirmou. Em um discurso emocionado, Rossi falou sobre a impunidade dos assassinos e torturadores. "Mas acredito que o povo, através de suas organizações, vai conseguir colocar no banco dos reus os responsáveis por tantas injustiças", disse, arrancando lágrimas dos presentes.
Ex-membros da Convergência são anistiados
Em um importante passo para o reconhecimento do papel cumprido pela Convergência Socialista na luta contra a ditadura, três membros da organização estiveram entre os anistiados daquela tarde. O primeiro a receber a anistia oficial do Estado foi Antônio Fernandes Neto, conhecido simplesmente como Neto. De longa trajetória militante iniciada no final da década de 1970, Neto foi demitido em função de sua militância enquanto era supervisor de segurança do trabalho. Foi também preso diversas vezes, inclusive quando era estudante na Argentina nos anos 1970 e pela polícia paraguaia quando trabalhou na construção da hidrelétrica de Itaipu, já em 1987.
A Comissão de Anistia fez questão de ressaltar que a perseguição a Neto no decorrer desses longos anos foi fruto da Operação Condor, a repressão articulada entre os países do Cone Sul contra militantes políticos de esquerda. "Quando fui preso em Córdoba, os policiais olharam pra mim e disseram: não vamos fazer nada com esse não, esse nós vamos mandar para o Fleury", testemunhou o anistiado. "Mas não fiz mais nada que a obrigação, quem mandou eu ler Marx com 16 anos de idade?" , declarou num discurso emocionado e bem-humorado.
Luiz Carlos Prates, o Mancha, foi o segundo membro da ex-CS a ser anistiado. A Comissão da Anistia destacou a larga documentação do processo de Mancha que atesta os anos de perseguição e monitoramento realizado pelas forças de repressão, o que lhe valeu diversas demissões. Mancha integrou as fileiras da Liga Operária, organização que precederia a Convergência, ainda em 1976, participando ativamente do movimento estudantil do período. Em maio de 1977 foi preso enquanto fazia uma panfletagem pela libertação de presos políticos, sendo libertado somente após os estudantes cercarem a delegacia. Foi preso novamente na fatídica invasão da PM à PUC, sendo levado à sede da Polícia Militar e, posteriormente ao Deops, mesmo local onde era realizado o julgamento naquele dia.
Fugindo das perseguições, o dirigente foi obrigado a ir para o Rio de Janeiro. Em 1982 retornou a São Paulo para trabalhar na fábrica de bicicletas da Monark. Na fábrica, continuou sua militância, foi preso novamente em 1983 e demitido após uma greve. Provando a articulação entre empresas e órgãos de repressão, a própria ficha de trabalho de Mancha foi parar no Deops.
Em seu pronunciamento, Mancha se lembrou de quando estava preso e o próprio delegado Romeu Tuma o chamou pelo nome para dizer que ele permaneceria detido ali. "Quando Tuma morreu, Lula o elogiou pelo bom tratamento que o delegado havia lhe prestado, mas ele foi o chefe da repressão, foi quem comandou tudo aquilo", disse. Mancha lembrou ainda que a ditadura e a repressão permanecem em muitos lugares. "A ditadura dentro das fábricas ainda não terminou, hoje um operário não pode fazer greve, não pode dizer que é filiado a um partido político, ainda mais um partido revolucionário. A ditadura na periferia também não terminou", denunciou.
Emocionado, Mancha terminou seu discurso dizendo que não se arrepende de nada, apesar de todas as perseguições. "Fui muito perseguido, fui preso, foragido, demitido... mas não me arrependo de nada. E vou continuar na luta até morrer", disse, sendo muito aplaudido.
O terceiro membro da ex-CS a receber a anistia foi Alexandre Fusco. Também militante de larga trajetória, Fusco começou sua vida política em 1978 e, nas fábricas, sofreu intensa perseguição , sendo preso várias vezes. Em 1984 foi obrigado a deixar o emprego na Fundação Educacional Lapa SA para não ser detido novamente. A Comissão de Anistia reconheceu que, longe de ter deixado o emprego por espontânea vontade, Fusco foi obrigado a sair do trabalho para não sofrer mais repressão, fato comprovado pelo intenso monitoramento a que o militante foi submetido pelos órgãos de espionagem.
A anistia e a reparação financeira concedida aos ex-militantes do MOMSP é uma página fundamental do resgate histórico da luta operária contra a ditadura, e a importante participação dos militantes da ex-Convergência Socialista, um avanço no reconhecimento do papel que a organização cumpriu durante os anos de chumbo no Brasil.
Retirado do Site do PSTU
Mancha presta seu depoimento na Comissão da Anistia |
Em um julgamento histórico que emocionou todos os presentes no Memorial da Resistência, antigo prédio do Deops, o Estado reconheceu as perseguições infligidas durante a ditadura, concedendo anistia política e reparação financeira aos ex-metalúrgicos, entre eles três membros da então Convergência Socialista: Luiz Carlos Prates, o Mancha, Alexandre Fusco e Antônio Fernandes Neto.
Também receberam anistia naquela tarde os ex-operários Sebastião Neto, Jorge Luiz dos Santos, Iria Molina, Salvador Pires, Maria Arleide Alves e João Prado de Andrade.
Resgate da luta operária contra a ditadura
O julgamento dos pedidos de anistia do MOMSP faz parte da 66ª Caravana da Comissão de Anistia, cujo objetivo é promover o desfecho dos processos de anistia de forma itinerante e mais próxima de onde os fatos ocorreram. "Nosso dever é de não apenas conceder anistia, mas promover aqui um ato de memória e de resgate histórico", afirmou Paulo Abrão logo no início dos trabalhos. Assim, o julgamento se tornou um ato de resgate da luta operária contra a ditadura, de denúncia às perseguições e à repressão do regime militar e também de homenagem aos mártires. A filha de Santo Dias, operário assassinado pela ditadura em 1979, Luciana Dias, foi convidada e prestou uma homenagem seu pai e todos os resistentes que tombaram na luta contra o regime de exceção.
O ex-dirigente do MOMSP, Waldemar Rossi, relembrou a repressão da ditadura contra a classe operária. "Uma das primeiras ações da ditadura foi intervir nos sindicatos e reprimir a classe trabalhadora", afirmou. Em um discurso emocionado, Rossi falou sobre a impunidade dos assassinos e torturadores. "Mas acredito que o povo, através de suas organizações, vai conseguir colocar no banco dos reus os responsáveis por tantas injustiças", disse, arrancando lágrimas dos presentes.
Ex-membros da Convergência são anistiados
Em um importante passo para o reconhecimento do papel cumprido pela Convergência Socialista na luta contra a ditadura, três membros da organização estiveram entre os anistiados daquela tarde. O primeiro a receber a anistia oficial do Estado foi Antônio Fernandes Neto, conhecido simplesmente como Neto. De longa trajetória militante iniciada no final da década de 1970, Neto foi demitido em função de sua militância enquanto era supervisor de segurança do trabalho. Foi também preso diversas vezes, inclusive quando era estudante na Argentina nos anos 1970 e pela polícia paraguaia quando trabalhou na construção da hidrelétrica de Itaipu, já em 1987.
A Comissão de Anistia fez questão de ressaltar que a perseguição a Neto no decorrer desses longos anos foi fruto da Operação Condor, a repressão articulada entre os países do Cone Sul contra militantes políticos de esquerda. "Quando fui preso em Córdoba, os policiais olharam pra mim e disseram: não vamos fazer nada com esse não, esse nós vamos mandar para o Fleury", testemunhou o anistiado. "Mas não fiz mais nada que a obrigação, quem mandou eu ler Marx com 16 anos de idade?" , declarou num discurso emocionado e bem-humorado.
Luiz Carlos Prates, o Mancha, foi o segundo membro da ex-CS a ser anistiado. A Comissão da Anistia destacou a larga documentação do processo de Mancha que atesta os anos de perseguição e monitoramento realizado pelas forças de repressão, o que lhe valeu diversas demissões. Mancha integrou as fileiras da Liga Operária, organização que precederia a Convergência, ainda em 1976, participando ativamente do movimento estudantil do período. Em maio de 1977 foi preso enquanto fazia uma panfletagem pela libertação de presos políticos, sendo libertado somente após os estudantes cercarem a delegacia. Foi preso novamente na fatídica invasão da PM à PUC, sendo levado à sede da Polícia Militar e, posteriormente ao Deops, mesmo local onde era realizado o julgamento naquele dia.
Fugindo das perseguições, o dirigente foi obrigado a ir para o Rio de Janeiro. Em 1982 retornou a São Paulo para trabalhar na fábrica de bicicletas da Monark. Na fábrica, continuou sua militância, foi preso novamente em 1983 e demitido após uma greve. Provando a articulação entre empresas e órgãos de repressão, a própria ficha de trabalho de Mancha foi parar no Deops.
Em seu pronunciamento, Mancha se lembrou de quando estava preso e o próprio delegado Romeu Tuma o chamou pelo nome para dizer que ele permaneceria detido ali. "Quando Tuma morreu, Lula o elogiou pelo bom tratamento que o delegado havia lhe prestado, mas ele foi o chefe da repressão, foi quem comandou tudo aquilo", disse. Mancha lembrou ainda que a ditadura e a repressão permanecem em muitos lugares. "A ditadura dentro das fábricas ainda não terminou, hoje um operário não pode fazer greve, não pode dizer que é filiado a um partido político, ainda mais um partido revolucionário. A ditadura na periferia também não terminou", denunciou.
Emocionado, Mancha terminou seu discurso dizendo que não se arrepende de nada, apesar de todas as perseguições. "Fui muito perseguido, fui preso, foragido, demitido... mas não me arrependo de nada. E vou continuar na luta até morrer", disse, sendo muito aplaudido.
O terceiro membro da ex-CS a receber a anistia foi Alexandre Fusco. Também militante de larga trajetória, Fusco começou sua vida política em 1978 e, nas fábricas, sofreu intensa perseguição , sendo preso várias vezes. Em 1984 foi obrigado a deixar o emprego na Fundação Educacional Lapa SA para não ser detido novamente. A Comissão de Anistia reconheceu que, longe de ter deixado o emprego por espontânea vontade, Fusco foi obrigado a sair do trabalho para não sofrer mais repressão, fato comprovado pelo intenso monitoramento a que o militante foi submetido pelos órgãos de espionagem.
A anistia e a reparação financeira concedida aos ex-militantes do MOMSP é uma página fundamental do resgate histórico da luta operária contra a ditadura, e a importante participação dos militantes da ex-Convergência Socialista, um avanço no reconhecimento do papel que a organização cumpriu durante os anos de chumbo no Brasil.
Retirado do Site do PSTU
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