Natália Guerra | ||
Momentos do lançamento em Fortaleza |
As Metamorfoses do PT
“Falar da história do PT é falar de alegrias e muitas decepções”, diz Cyro Garcia. Deparar-se hoje com o Partido dos Trabalhadores (PT) e, sobretudo com os ataques que ele tem representado ao nosso país, é sem dúvida deparar-se com a traição de uma grande história de luta que se iniciava em 1980, ano de sua fundação. Partido composto majoritariamente por sindicalistas e, naquela década, representante de uma ruptura com a lógica da diferença e com a forma de fazer campanha, a partir da década de 1990 o PT deixa de ser um partido radical e passa a ser um grande gestor do capital financeiro e mantenedor da lógica neoliberal.
Para Cyro Garcia, “Na verdade, o PT nunca foi um partido revolucionário. Ele falava em independência de massas, tinha um caráter classista, mas daí a ter uma alternativa de ruptura com o projeto burguês, nunca!”. Ainda assim, na década de 80, o PT cumpriu um importante papel na mobilização da sociedade o que o tornou referência na esquerda internacional, sobretudo na América Latina. Foi o partido que inaugurou, em seu modo de fazer política, o debate sobre a importância de realização de campanhas de independência de base e sobre a necessidade de organização de uma estrutura sindical livre do Estado. Fundada em 1983, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) foi um exemplo disso e, passadas quase três décadas, hoje é sinônimo de atrelamento e subserviência.
A chegada do PT a diversas prefeituras em 1988, a por pouco não eleição de Lula em 1989 e a ocupação de cargos por seus dirigentes durante a década de 1990 – não apenas cargos em instituições políticas estatais, mas também em órgãos de gestão direta do capital financeiro – foram acelerando a burocratização do partido e a mudança de sua base e composição social. Refém da lógica do mercado eleitoral, muda-se a política de alianças, e entram em jogo as campanhas milionárias, com apoio de empreiteiras e bancos privados.
No governo, o PT passava de partido que defendia a ética na política aquele dos grandes escândalos a exemplo do que foi o esquema de compra de votos de parlamentares, o mensalão, entre 2005 e 2006, período do governo Lula ou, como mais recentemente, os sucessivos escândalos envolvendo ministros durante a presidência de Dilma. Em relação aos movimentos sociais, como é o caso da União Nacional dos Estudantes (UNE), o PT deixa de ser apoio e passa à cooptação; e em nível sindical, a palavra de ordem da CUT, que até então era, “Sindicato é pra lutar”, passa a ser “Sindicato cidadão”, diluindo assim, com a mudança do conceito, todo o caráter de classe tido naquela reivindicação.
O livro
O livro "PT: de oposição à sustentação da ordem" baseia-se em pesquisa realizada para tese do doutorado em História da Universidade Federal Fluminense (UFF), em abril de 2009. A pesquisa teve como ponto de partida a dissertação de mestrado em História da mesma Universidade apresentada pelo autor em 2000, quando analisava o partido desde sua fundação até 1994. Agora, o recorte abrange um período mais recente, como o que compreende as duas últimas campanhas eleitorais que levaram o PT à presidência da República.
No prefácio do livro, Valério Arcary, professor do Instituto Federal de São Paulo (IFSP), explica que o livro de Cyro relata uma história política que foi, ao mesmo tempo, emocionante e terrível, e fala também que esta era uma publicação que fazia falta tanto porque não se havia ainda narrado uma história do PT que estivesse para além dos elogios a Lula e ao seu partido, como também porque evidencia como este partido, visando aproximar-se dos trabalhadores para ganhar votos, realizou um espantoso giro à direita.
Fortaleza
Ao final do lançamento, enquanto Cyro Garcia autografava os livros e conversava com alguns ativistas, perguntei-lhe sobre qual era a importância de reivindicar a História de um partido como o PT. Sorridente, Cyro respondeu, por meio da citação do teórico italiano Antônio Gramsci, que se podia dizer que “escrever a história de um partido significa escrever a história geral de um país”.
Perguntei-lhe, então, sobre o que representava o lançamento daquele livro na capital cearense, onde tínhamos a experiência presente de uma prefeitura municipal do PT, seus constantes ataques e a consequente ascensão de algumas categorias, como vimos com a greve municipal de professores. Cyro conta que, coincidentemente, os locais onde ocorreram os primeiros lançamentos do livro – Belo Horizonte, Rio de Janeiro e Porto Alegre – também vêm de experiências com o PT e que, neste sentido, acredita que seu livro possa contribuir para a compreensão e dissolução do mito que se tornou esse partido e, mais ainda, de estímulo às lutas dos trabalhadores pela transformação de sua realidade.
Cyro Garcia nasceu em 1954 e em 1978 formou-se em Direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Concluiu o mestrado em 2000 e o doutorado em 2008, ambos em História na Universidade Federal Fluminense (UFF). Foi fundador do PT e da CUT. Exerceu, entre 1992 e 1993, na condição de suplente, o mandato de deputado federal e em 1992 sua corrente, a Convergência Socialista, foi expulsa do PT. Participou em 1994 da fundação do Partido Socialista dos Trabalhadores Unificado (PSTU), integrando-lhe até os dias hoje. Em 2003 rompeu com a CUT e participou da fundação da Conlutas, atualmente CSP-Conlutas – Central Sindical e Popular.
Retirado do Site do PSTU
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