quarta-feira, 14 de abril de 2010

Dividido, PSOL define candidatura

A conferência eleitoral do PSOL aprovou a candidatura de Plínio de Arruda Sampaio à presidência da República. Isso poderia satisfazer seus apoiadores, mas as condições em que se deu essa decisão mostram a grave crise pela qual passa esse partido.

Acusações de roubo do site, fraudes nas plenárias de base e agressões físicas se tornaram públicas na preparação da conferência nacional desse partido. No final, existiram duas conferências em separado, cada uma com um bloco significativo do partido e acusações de parte a parte.

Uma das conferências indicou Plínio de Arruda Sampaio pré-candidato à Presidência, dizendo que Martiniano Cavalcante e seus apoiadores não compareceram. Assim, Plínio foi votado por unanimidade. Falaram, também, que os apoiadores de Martiniano teriam fraudado plenárias de base.

O outro bloco, que se intitula “maioria dos delegados eleitos”, acusa os apoiadores de Plínio de vencerem no “tapetão”: o diretório nacional teria impugnado delegados do Acre e Roraima que apoiavam a candidatura de Martiniano para transformar a minoria (os apoiadores de Plínio) em maioria. A presidenta e maior figura pública do PSOL, Heloísa Helena, é uma das que questionam duramente a indicação de Plínio.

Entre os dois blocos, existiu um acordo tático para concorrer às eleições, sem unidade na candidatura à presidência. O bloco MES-MTL-Heloísa não questionará o resultado na Justiça, mas não fará campanha por Plínio. O enfrentamento foi adiado para depois das eleições, a partir da relação de forças que dependerá de quais parlamentares serão eleitos em outubro.

Uma parte dos militantes do PSOL deve estar mais tranquila porque, afinal, Plínio foi indicado. Mas que partido é este em que o candidato vai passar boa parte da campanha explicando por que a outra metade do partido (inclusive sua presidente) está contra ele? Que partido é esse em que uma simples escolha de candidato ameaça uma ruptura ao meio?

Alguns acham que a crise se explica pela disputa entre Martiniano e Plínio. Mas essa é somente a forma em que aparece a crise. Não se pode entender um enfrentamento tão violento pela escolha de um candidato que, todos sabem, não terá uma grande votação. Não haverá alguma explicação mais profunda na concepção com que o PSOL foi criado e construído?

Nós não opinamos que a crise se explique pela luta de um lado bom e outro ruim. Isso não significa que não haja erros grosseiros e inadmissíveis. Mas é a concepção eleitoral de partido, sobre a qual a maioria dos dois lados tem acordo, que está equivocada e originou essa crise.

Esses acontecimentos não podem ser motivos de alegria para ninguém. Esse tipo de crise tem consequências nefastas para toda a esquerda. Não estamos debatendo programas diferentes, mas quem roubou o site, quem fraudou e onde. Isso reforça o ceticismo, o sentimento antipartido. Fortalece, entre parcelas de trabalhadores e do povo, a nociva ideia de que a política é o terreno dos golpes, da baixaria, e que todos os partidos são iguais, independentemente de ser de esquerda ou direita.

Por isso, é necessário esclarecer a origem dessa crise para que não sobrem simplesmente a desilusão e a falta de perspectivas. Aqui, nós queremos dar uma opinião, que necessariamente será limitada, por ser de quem acompanhou a crise de fora.


As consequências da concepção de partido na crise

Quando criado, foi dito que o funcionamento do PSOL, em que todos fazem o que querem, era a expressão de um partido democrático. Na verdade, é um partido eleitoral que gira ao redor dos parlamentares que, eles sim, podem fazer o que querem, independentemente da vontade da militância do PSOL.

Um dos grandes exemplos disso foi o estopim imediato dessa crise, a desistência de Heloísa Helena de disputar a Presidência do país. Sua candidatura era apoiada pela amplíssima maioria da militância, mas ela privilegiou sua eleição ao Senado por Alagoas, mesmo gerando uma crise no partido. Mas ela só pode fazer isso porque o PSOL é um partido eleitoral, em que os parlamentares e figuras públicas fazem o que querem.

Com a desistência de Heloísa, se abriu a disputa de quem deveria ser o candidato a presidente. A briga degenerou num enfrentamento fratricida porque, para os parlamentares do partido, isso significa a luta pelo controle do aparato nacional do PSOL. Além disso, a indicação de um candidato à presidência pode facilitar ou dificultar a reeleição de um ou outro parlamentar por ser de seu estado.

O que explica essa crise violenta é o peso decisivo dos parlamentares num partido eleitoral.


Um partido em que os militantes não decidem

As acusações de fraude nas plenárias são generalizadas. Não vamos opinar sobre isso, não é de nossa alçada. Mas nenhum dos dois blocos questiona a metodologia como foram feitas essas plenárias. O PSOL funciona exatamente como o PT, com as decisões sendo tomadas pelos filiados. Os militantes do PSOL, que estão nos movimentos sociais, que constroem o partido na base não são os que decidem. São os filiados que decidem, mesmo sem ter nenhum compromisso com a militância.

Essa é uma das características dos partidos eleitorais, defendida como expressão de um partido aberto, amplo. Na verdade, isso privilegia quem tem aparato (os parlamentares, mais uma vez), para levar em carros os filiados para votar em plenárias vazias.

Os momentos mais vivos dessa pré-conferência foram as plenárias de debates dos candidatos que, em geral, reuniram os militantes do PSOL. Mas os militantes aí reunidos não votam, porque quem decide são os filiados, trazidos por quem tem aparato.

Essa metodologia, além de absolutamente antidemocrática, possibilita de forma muito mais ampla as fraudes. Fraudes tanto nas plenárias de base como nas impugnações dessas plenárias, para mudar a relação de forças. Não foi a base que decidiu a conferência, foi uma luta violenta das cúpulas parlamentares do partido.


O “vale-tudo” generalizado

Existe uma moral burguesa, aprofundada pelo neoliberalismo, que pode ser resumida no vale-tudo para conseguir um objetivo. Essa moral está instalada em partidos eleitorais como o PT, em que se faz qualquer manobra para se transformar em deputados ou governantes. Mentiras, calúnias, fraudes, agressões físicas, vale-tudo para se conseguir um cargo e suas vantagens materiais.

Não é verdade que o movimento operário não tenha moral. A acusação que a burguesia nos faz de que, para a esquerda os fins justificam os meios, é só mais uma autojustificativa de sua própria moral do vale-tudo.

No movimento operário, uma moral distinta surge da própria luta. Numa greve, por exemplo, é natural a solidariedade de classe, a fraternidade entre os que se mobilizam. Qualquer um que tenha participado de uma greve já viveu essa experiência. Para o movimento operário, não vale qualquer coisa. As calúnias, as fraudes enfraquecem o movimento e não são justificáveis. Já a fraternidade, a solidariedade, o debate respeitoso de idéias o fortalecem.

É por isso que essa crise do PSOL é desmoralizante e atinge toda a oposição de esquerda. Não se debateu programas e estratégias, mas quem roubou quem. O vale-tudo que existia no PT se generalizou no PSOL.


A conjuntura e a crise

Existe uma conjuntura política que ajuda a explicar a crise do PSOL. O peso do governo Lula entre os trabalhadores e a juventude limita muito o espaço eleitoral para uma oposição de esquerda. Isso explica porque Heloísa Helena não queira a candidatura à presidência. Explica, também, porque ao menos uma parte dos parlamentares atuais desse partido sinta ameaçada sua reeleição. Por isso, se parte com tanta virulência para essa briga pelo aparato do PSOL.

Essa mesma conjuntura, no entanto, se for analisada de outro ângulo, fora do eleitoralismo, pode permitir avanços importantes. Existem mobilizações salariais significativas em curso no país. O Congresso da Classe Trabalhadora, em junho, aponta para uma unificação que pode ser a principal conquista do movimento contra o governo Lula. E mesmo em termos eleitorais é possível fazer uma campanha importante, com um programa classista e socialista, que aponte uma perspectiva diferente para os trabalhadores.


Centralismo democrático x centralismo burocrático parlamentar

O PSTU defende outra concepção de partido, com um funcionamento orgânico baseado no centralismo democrático. Tanto a burguesia quanto os partidos eleitorais acusam essa forma de funcionamento leninista como antidemocrática, por exigir que todos apliquem a mesma política depois de votada.

Na verdade, esse é o funcionamento mais democrático. São os militantes que decidem nos congressos e conferências do partido qual a política a ser aplicada por todos. Depois de um debate amplo e democrático, se vota a política e todos aplicam. Não existe nenhum privilégio para as figuras públicas e dirigentes do partido.

Nas eleições de 2006, o PSTU fez uma conferência eleitoral para debater a tática a ser implementada. Três posições foram defendidas – frente de esquerda, candidatura própria e voto nulo – num livre, amplo e democrático debate. Foi votada, por maioria, a tática da frente de esquerda, que foi aplicada por todos.

Trata-se de um funcionamento muito mais democrático que o dos partidos eleitorais. Nesses partidos, como o PT e o PSOL, a aparência é de liberdade completa, mas na verdade se trata de um centralismo burocrático dos parlamentares. Eles têm acesso à imprensa, e as posições do partido que aparecem são as deles, independentemente da opinião dos militantes. E podem ditar a dinâmica do partido, que gira ao seu redor, como os parlamentares do PSOL deram a dinâmica lamentável da crise atual.


Retirado do Site do PSTU

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